O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, cobrou da comunidade internacional, neste sábado (21), esforços para celebrar um cessar-fogo no Oriente Médio e abrir corredores humanitários na Faixa de Gaza. O chanceler, que participa da Cúpula da Paz em Cairo, no Egito, afirmou que a “paralisia” do Conselho de Segurança da ONU prejudica a vida de milhões de pessoas. Vieira disse que o Brasil “rejeita e condena inequivocamente os ataques terroristas perpetrados pelo Hamas em Israel no dia 7 de outubro”, mas defendeu que seja encontrada uma solução imediata para preservar vidas e a propagação do conflito.
“A paralisia do Conselho de Segurança está tendo consequências negativas para a segurança e a vida de milhões de pessoas. Isso não é do interesse da comunidade internacional. Devemos também esforçar-nos por evitar qualquer possibilidade de propagação regional do conflito”, discursou. O Brasil apresentou uma resolução pedindo, entre outras coisas, a interrupção dos ataques e ajuda humanitária em Gaza, mas a proposta foi vetada pelos Estados Unidos.
Vieira defendeu que o assunto seja rediscutido: “Em 24 de outubro, presidirei o Debate Aberto Trimestral do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a Situação do Oriente Médio, incluindo a Questão Palestina. Sugiro que continuemos essa conversa lá, no mais alto nível possível, na tentativa de continuar buscando consenso para uma ação imediata”.
Além de condenar o Hamas, o chanceler brasileiro também fez críticas à atuação israelense no conflito. “Israel, como potência ocupante, tem responsabilidades específicas sob os direitos humanos internacionais e o direito humanitário. Estes devem ser cumpridos em qualquer circunstância. Nas últimas décadas, não assistimos a vencedores neste conflito prolongado. E a população civil continua a ser a principal vítima da falta de diálogo e do ressentimento cada vez maior”, declarou.
Segundo ele, é necessário que todas as partes envolvidas protejam plenamente os civis e respeitem o direito internacional e o direito internacional humanitário. “A situação trágica em curso na Faixa de Gaza é da maior preocupação. Enquanto sempre haverá quem esteja disposto a colocar lenha na fogueira, o Brasil pedirá diálogo. A destruição de infraestruturas civis, incluindo instalações de saúde, é inaceitável. Testemunhamos com consternação o bombardeio do hospital Al Ahli-Arab, lamentamos profundamente e lamentamos as centenas de vítimas civis, incluindo pacientes, médicos, enfermeiros e outros trabalhadores humanitários. Todas as partes devem proteger plenamente os civis e respeitar o direito internacional e o direito humanitário internacional”, ressaltou.
Antes de participar da reunião, o chanceler fez um comentário sobre o que esperava do encontro. “A expectativa é que se crie uma consciência de que é chegado o momento de pôr um ponto final a este derramamento de sangue e a essa guerra que, no fundo, afeta todo o mundo”, disse.
Vieira representa o presidente Lula na cúpula egípcia. Participam da Cúpula, além de Brasil e Egito, representantes de países como Jordânia, Catar, Turquia, Europa, União Africana e da ONU. Até o momento, o conflito iniciado há duas semanas resultou na morte de 4,4 mil pessoas na Faixa de Gaza e 1,4 mil em Israel. Entre elas, três brasileiros. O governo israelense estima que 201 pessoas foram levadas como reféns pelo Hamas. Duas cidadãs norte-americanas foram libertadas nessa sexta-feira.
Desde o início do conflito, o governo federal resgatou mais de mil brasileiros que estavam em Israel. Cerca de 30 pessoas aguardam autorização do Egito para cruzar a fronteira com a Faixa de Gaza. Uma aeronave da Presidência da República aguarda a liberação em Roma para se deslocar até o Egito e repatriar o grupo.
Veja a íntegra do discurso de Mauro Vieira na Conferência de Paz do Cairo:
“Chefes de Estado, Majestades, Altezas, Governos, Ministros e Chefes de Delegação,
Senhoras e Senhores,
O mundo acompanha com ansiedade e esperança a Conferência de Paz do Cairo de hoje. Por conseguinte, felicito o Governo egípcio pelos seus esforços na organização rápida desta cimeira. A missão que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva me conferiu, ao me instruir a participar dessa reunião em seu nome, foi inequívoca: somar a voz do Brasil a todos aqueles que pedem calma, contenção e paz na região.
O Brasil tem acompanhado com preocupação a escalada da violência e a deterioração da situação de segurança na região nos últimos meses. Lamentamos testemunhar tais condições no ano do trigésimo aniversário dos Acordos de Oslo. Se tivéssemos visto progresso desde então, estaríamos celebrando a paz e a amizade. No entanto, a situação que temos diante de nós hoje é muito terrível.
O governo brasileiro rejeita e condena inequivocamente os ataques terroristas perpetrados pelo Hamas em Israel no dia 7 de outubro, bem como a tomada de reféns civis. Cidadãos brasileiros estão entre as vítimas, três delas foram assassinadas em Israel.
Como muitos outros países, o Brasil também tem cidadãos esperando para serem evacuados de Gaza, enquanto observamos com alarme a deterioração da situação humanitária na região, especialmente a escassez de suprimentos médicos, alimentos, água, eletricidade e combustível. Israel, como potência ocupante, tem responsabilidades específicas sob os direitos humanos internacionais e o direito humanitário. Estes devem ser cumpridos em qualquer circunstância.
Nas últimas décadas, não assistimos a vencedores neste conflito prolongado. E a população civil continua a ser a principal vítima da falta de diálogo e do ressentimento cada vez maior.
O impasse no processo de paz; a estagnação social e econômica que há muito prevalece em Gaza; a expansão contínua dos assentamentos israelenses nos territórios ocupados, a violência contra civis, a destruição de infraestruturas básicas, as violações do histórico “status quo” dos locais sagrados em Jerusalém, todos esses fatores se combinam para gerar um ambiente social e cultural que põe em risco a “solução de dois Estados” e gera ódio, violência e extremismo.
Excelências
A situação trágica em curso na Faixa de Gaza é da maior preocupação. Enquanto sempre haverá quem esteja disposto a colocar lenha na fogueira, o Brasil pedirá diálogo.
A destruição de infraestruturas civis, incluindo instalações de saúde, é inaceitável. Testemunhamos com consternação o bombardeio do hospital Al Ahli-Arab, lamentamos profundamente e lamentamos as centenas de vítimas civis, incluindo pacientes, médicos, enfermeiros e outros trabalhadores humanitários.
Todas as partes devem proteger plenamente os civis e respeitar o direito internacional e o direito humanitário internacional.
A comunidade internacional deve envidar todos os esforços diplomáticos para assegurar o rápido estabelecimento de corredores e pausas humanitárias e um cessar-fogo imediato.
Como afirmou o presidente Lula, a crise atual exige uma ação humanitária multilateral urgente para acabar com o sofrimento dos civis apanhados em meio às hostilidades.
Como presidente do Conselho de Segurança das Nações Unidas para o mês de outubro, o Brasil convocou sessões emergenciais e fomentou o diálogo.
Apesar desses esforços, o Conselho de Segurança não conseguiu, lamentavelmente, adoptar uma resolução em 18 de Outubro. No entanto, os muitos votos favoráveis que o projeto de resolução recebeu – 12 em 15 – são a prova de um amplo apoio político a uma ação rápida por parte do Conselho. Acreditamos que esta opinião é partilhada pela comunidade internacional em geral.
Permitam-me que seja claro: há um amplo apelo político à abertura de pausas humanitárias urgentemente necessárias, à criação de corredores humanitários e à proteção do pessoal humanitário.
Temos de encontrar formas de desbloquear a ação multilateral. O Brasil não poupará esforços nesse sentido. Em 24 de outubro, presidirei o Debate Aberto Trimestral do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a Situação do Oriente Médio, incluindo a Questão Palestina. Sugiro que continuemos essa conversa lá, no mais alto nível possível, na tentativa de continuar buscando consenso para uma ação imediata. A paralisia do Conselho de Segurança está tendo consequências negativas para a segurança e a vida de milhões de pessoas. Isso não é do interesse da comunidade internacional.
Devemos também esforçar-nos por evitar qualquer possibilidade de propagação regional do conflito.
Mais à frente, temos de encontrar formas de revitalizar o processo de paz, de fazer avançar as negociações políticas no sentido de uma paz abrangente, justa e duradoura no Médio Oriente. A simples gestão do conflito não é uma alternativa aceitável. Só o reatamento de negociações eficazes poderá trazer resultados concretos para a implementação da solução de dois Estados, de acordo com todas as resoluções pertinentes da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança, com Israel e a Palestina a viverem em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas.
O Brasil está pronto e disposto a apoiar todos os esforços nesse sentido.
Obrigado.”
Deixe um comentário