Logo antes da viagem do presidente Lula a Dubai, onde ainda acontece a COP28, o Senado aprovou projeto de lei que flexibiliza o comércio de agrotóxicos no Brasil. O coordenador da bancada ambientalista na Câmara, deputado Nilto Tatto (PT-SP), que compareceu à conferência, conta que a proposta causou preocupação às entidades internacionais, que temem a possibilidade de o projeto tornar o Brasil um exportador de substâncias nocivas.
“O projeto foi abordado na reunião do presidente Lula com instituições da sociedade civil. Foi apresentado explicitamente um pedido para que ele vete. Ele não deu uma resposta imediata, mas explicou que há uma dificuldade para garantir o veto, tendo em vista a própria composição do Congresso Nacional”, narrou o deputado ao Congresso em Foco, pouco após seu retorno ao Brasil. O texto foi relatado pelo senador Fabiano Contarato (ES), líder do PT no Senado.
O projeto de flexibilização dos agrotóxicos, que foi apelidado por movimentos de proteção ao meio ambiente como “PL do veneno”, partiu da Câmara dos Deputados, à revelia de movimentos que protestavam em frente ao Congresso Nacional. O texto original retirava a participação de órgãos vinculados aos ministérios da Saúde e Meio Ambiente no processo de análise de novos pesticidas, concentrando a autoridade apenas no Ministério da Agricultura.
Além da mudança de competências nessa análise, o projeto dava um prazo para aprovação ou rejeição das novas substâncias. Ultrapassado esse prazo, elas eram tacitamente aprovadas, circulando livremente no mercado brasileiro até a análise acontecer. Ele também estabelecia restrições severas para processos de reavaliação de agrotóxicos, além de fazer distinção entre riscos aceitáveis e inaceitáveis à saúde, bem como a substituição do termo “agrotóxico” por “defensivo agrícola”.
A votação do texto foi segurada por meses no Senado, e ficou aos cuidados de Fabiano Contarato, ele próprio um quadro ativo da Frente Parlamentar Ambientalista. “O relator se deparou com uma situação em que era impossível impedir que o projeto fosse aprovado. Então ele trabalhou para amenizar os efeitos”, ponderou Tatto. Ainda assim, o resultado final, para o deputado, foi “completamente contrário daquilo que se espera em termos de sobrevivência da própria agricultura e ecologia brasileira”.
Contarato conseguiu trazer de volta a participação dos ministérios da Saúde e Meio Ambiente para dentro da análise de novas substâncias, mas a coordenação segue sob controle da Agricultura. Para o líder ambientalista, apesar de melhor do que a proposta original, o modelo aprovado transforma as duas pastas em “mera consultoria”, alertando que os critérios adotados no Ministério da Agricultura são estabelecidos mirando a produtividade, e não necessariamente a segurança dos produtos.
Seu relatório também eliminou o termo “risco inaceitável” do texto, eliminando a brecha para a existência de riscos aceitáveis. O termo “defensivos agrícolas” também foi abolido, mantendo a terminologia “agrotóxicos”. A aprovação tácita para substâncias que superarem o prazo de observação também foi removida, e substituída por uma possibilidade, à critério dos órgãos de fiscalização, de conceder permissões provisórias com tempo limitado.
A versão final, porém, não conseguiu retirar os trechos que autorizam o Brasil a produzir agrotóxicos proibidos em seu próprio território, desde que destinados somente à exportação. Esse detalhe, de acordo com Tatto, é o que mais chama atenção da comunidade internacional. “Boa parte dos agrotóxicos produzidos no mundo é proibida em seus próprios países, que logo vão proibir a própria produção. Com isso, o projeto abre a janela para o Brasil assumir esse papel na cadeia mundial de exportação”, explicou.
Desde a votação no Senado, a bancada ambientalista se mobiliza para articular o veto ao projeto. A esperança de Nilto Tatto está nos próprios ministérios do Meio Ambiente e Saúde, que podem encaminhar pareceres ao presidente Lula com material que ajude a justificar um veto. O deputado, porém, reconhece que não será fácil sustentar tal decisão diante do Congresso Nacional, tendo em vista a força política da bancada ruralista, principal interessado na derrubada, que possui maioria absoluta nas duas Casas legislativas.
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