Logo que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela anunciou a vitória de Nicolás Maduro, na madrugada desta segunda-feira (29), diversos atores internacionais questionaram o resultado do pleito. Não apenas países governados por grupos rivais ao atual presidente, como Estados Unidos e Argentina, mas também representantes de governos de centro-esquerda, como Chile, Uruguai, Alemanha e Espanha, manifestaram dúvidas a respeito da autenticidade do resultado eleitoral.
O cientista político Bruno Marcondes, especializado em instabilidade política na América Latina, explicou que os questionamentos, tanto por líderes externos quanto pela oposição interna a Maduro, não acontecem por acaso. O primeiro fator responsável pelas dúvidas foi a discrepância entre o resultado eleitoral e as últimas pesquisas de intenção de voto.
“Diversas pesquisas de intenção de voto de institutos renomados, incluindo o brasileiro Atlas, davam expressiva vitória para a oposição até o final da semana passada, com mais de 60% de votos para Edmundo González”, apontou o cientista. O fenômeno também foi observado nas pesquisas regionais, inclusive com expectativa de vitória da oposição em estados tradicionalmente chavistas.
O protocolo adotado pelo CNE também levantou dúvidas. “Eles demoraram mais de sete horas para divulgar as primeiras contagens, que de início já davam vitória para o Maduro. Isso fica ainda mais estranho se compararmos com como funciona aqui: a Venezuela adota um sistema eletrônico parecido com o nosso, mas em 2022 nós já conseguimos concluir a contagem e anunciar os resultados finais cerca de três horas depois do fechamento das urnas”, relembrou.
A disputa foi marcada por milhares de denúncias de fiscais dos partidos de oposição sendo impedidos de acessar os boletins de urna, impedindo a possibilidade de uma contagem paralela de votos. “Todo esse contexto venezuelano de muita pouca transparência no processo levanta imensas suspeitas sobre a possibilidade de fraude”, completou o cientista.
Ruptura improvável
Diante das denúncias de fraude, o próprio governo brasileiro adotou uma postura de cautela em relação ao resultado das eleições na Venezuela: em nota, o Ministério das Relações Exteriores afirmou que ainda aguarda os “dados desagregados por mesa de votação”, considerados indispensáveis “para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito”.
Mesmo que o Brasil acabe chegando à mesma conclusão de outros países governados por siglas de centro-esquerda, Marcondes acha pouco provável uma ruptura diplomática. “É difícil que isso aconteça porque não é o padrão do Itamaraty ou mesmo do governo Lula. Pode haver críticas e até mesmo o rompimento da relação pessoal entre os presidentes Lula e Maduro, mas não uma interrupção das relações entre os Estados”.
Por outro lado, a tensão eleitoral pode aumentar o fluxo migratório na fronteira entre Brasil e Venezuela. “O Brasil não costuma ser o destino final de emigrantes venezuelanos, mas é o principal caminho para se chegar a outros países de língua espanhola, o que pode sim resultar em uma nova onda migratória”, antecipou.
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