Quem não conhece o gênio da lâmpada? Esse ser mítico da cultura árabe foi popularizado na história (ou estória) de “Aladim e a Lâmpada Maravilhosa”. Entre as várias versões conhecidas, a mais popular é aquela em que o habitante da lâmpada concede a realização de três pedidos (ou desejos) a quem encontra o curioso objeto e liberta o morador da lâmpada de sua “prisão”.
Os pedidos ao gênio variam conforme a personalidade e os interesses daquele (ou daquela) que encontra a famosa lâmpada e o seu ilustre morador. Os desejos envolvem dinheiro, poder, viagens, bens materiais, saúde e tantas outras possibilidades inseridas no imaginário humano. Não faltam aqueles que pretendem multiplicar os pedidos indefinidamente. O terceiro pleito seria poder fazer pedidos sem fim. Nesse caso, surge um inusitado problema lógico a considerar (afinal, os pedidos estavam limitados a três).
Imagine um pacifista, nos tempos atuais, encontrando a famosa lâmpada e seu gênio. Foi o que aconteceu com Oiramedla, um dedicado aprendiz dos princípios da não-violência e defensor da solução pacífica dos conflitos como uma das mais importantes manifestações da noção fundamental de dignidade da pessoa humana.
Oiramedla só utilizou dois pedidos. O primeiro foi dispensar o segundo. O terceiro, transformado em segundo e último, deveria ser aplicado até o fim dos dias numa região específica do globo terrestre: o Oriente Médio.
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Apesar de não contar com definições precisas de fronteiras, o Oriente Médio abrange, na maioria das referências, cerca de dezoito países. São eles: a) Afeganistão; b) Arábia Saudita; c) Bahrein; d) Catar; e) Chipre; f) Egito; g) Emirados Árabes Unidos; h) Iêmen; i) Israel; j) Irã; k) Iraque; l) Jordânia; m) Kuwait; n) Líbano; o) Omã; p) Palestina; q) Síria e r) Turquia. A maioria desses países integra o chamado “mundo árabe”. Várias religiões importantes têm suas origens no Oriente Médio, incluindo o judaísmo, cristianismo e islamismo.
O pedido de Oiramedla, em relação ao Oriente Médio, foi formulado nos seguintes termos: nenhuma arma ou artefato bélico, de qualquer origem ou natureza, independentemente do poder de destruição, poderia funcionar na referida região. O desejo abarcava revólveres, pistolas, rifles, espingardas, fuzis, metralhadoras, granadas, foguetes, mísseis, bombas e qualquer outra invenção humana voltada para causar dor, sofrimento, destruição e morte.
Alguém poderia cogitar das profundas consequências da implementação de tal pedido, talvez o próprio gênio da lâmpada. Ora, o número de mortes, sofrimentos e destruições cairia absurdamente, tendendo a zero. Afinal, somente com o uso da força física, paus, pedras e lâminas seria possível infligir algum ferimento ou lesão a outro ser humano.
E como seriam afetados os seculares conflitos regionais? Oiramedla tinha uma resposta para esse questionamento. As chances para o caminho da solução pacífica dos conflitos aumentariam exponencialmente. Um esforço conjunto de todas as pessoas de boa vontade para encontrar, via diálogo, soluções razoáveis para todas as partes seria bem mais factível. A perspectiva das vítimas dos intermináveis atos de violência poderia suplantar a lógica perversa dos sucessivos ataques e agressões.
Haveria espaço para ressuscitar a ética, aparentemente morta nas areias dos desertos que marcam o Oriente Médio. Não seria o caso de reviver qualquer ética, mas aquela que valoriza a ação na ótica do bem-estar do outro como continuação de si mesmo. O outro ser humano não pode ser reduzido a triste figura do inimigo na forma de um combatente/soldado armado, um carcereiro, um torturador ou um estuprador.
Ninguém se iluda. Estão em curso no Oriente Médio vários projetos de eliminação. Alguns deles perseguem a supressão física de povos inteiros, indo além de um grupo terrorista ou de um Estado. Certos processos em andamento, resultantes desses últimos, definirão a morte moral daqueles que não conseguirão encarar seus semelhantes e, pior, sequer se olhar no espelho (por não restar um mínimo de humanidade).
E a indústria bélica? Essa triste atividade humana, que se alimenta de sangue, lágrimas, sofrimento e morte, sofreria o golpe mais intenso de sua história macabra. As ações despencariam nas bolsas de valores. O valor de mercado das companhias entrariam em queda livre. Pergunta-se: alguém, de boa-fé, ficaria seriamente preocupado com os revezes sofridos pelo negócio de produção e comercialização de armas?
E se a moda pega? Outros pedidos “desastrosos” poderiam ser formulados ao gênio da lâmpada. Desejos como: a) transformar as fábricas de armamentos em fábricas de brinquedos; b) estender para o mundo inteiro o não-funcionamento de armas e artefatos bélicos de forma geral; c) a impossibilidade de produção de agrotóxicos (defensivos agrícolas?); d) a estatização de todas as indústrias farmacêuticas, submetidas a rigoroso controle social; e) a inviabilidade da produção de “alimentos” ultraprocessados; f) a impossibilidade do fogo avançar em florestas; g) a inviabilidade de realização de operações financeiras com valores decorrentes de atividades ilícitas e h) as operações financeiras, no verdadeiro “cassino global” em curso, somente seriam concluídas depois de depositado 5% de seu valor em um fundo controlado pela ONU para utilização na erradicação da fome, miséria e ajuda a populações necessitadas.
Este texto não termina com o autor acordando de um sonho. É um sonho acordado mesmo. Recuso-me, categoricamente, a aceitar que a organização socioeconômica da humanidade, nos moldes atuais, é algo insuperável e representativo do melhor que o gênero humano pode produzir.
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