* Carla Mendonça, de Lisboa, especial para o Congresso em Foco
Bebês de pais brasileiros que nascerem em Portugal a partir desta semana terão direito a serem registrados como portugueses. A alteração da Lei nº 37/81, chamada Lei da Nacionalidade (íntegra), foi publicada na quarta-feira, 10 de novembro, no Diário da República, e beneficia a indivíduos de todas as nacionalidades. Há 151.304 brasileiros vivendo país. Em 2019, 22.928 brasileiros tiveram seus pedidos de nacionalidade portuguesa concedidos.
A mudança beneficia também a netos de portugueses. Pelo regramento anterior, o processo de pedido de nacionalidade deles dependia da comprovação de vínculos com a sociedade portuguesa, como viagens regulares para visitas familiares, realização de estudos no país, principalmente de nível superior, e propriedade de imóveis, por exemplo. A partir de agora, eles precisam apresentar apenas documento de registro criminal e comprovar alfabetização na Língua Portuguesa.
Advogada e mestre em Direito Internacional pela Universidade de Lisboa, a brasileira Suelen Cunha, que atua no Brasil e em Portugal, afirma que essa alteração da lei atendeu às expectativas sobre os termos de que trata, considerando filhos recém nascidos de casais onde pelo menos um dos pais está em situação legal ou aguardando legalização. Para a advogada e membro da Direção da Casa do Brasil de Lisboa, Patrícia Peret, “a alteração é muito positiva em relação à versão anterior, ainda que não acolha totalmente as reivindicações que temos feito. No Brasil, se a criança nasce no território, é brasileira, independentemente do restante”, afirma Peret.
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A nacionalidade portuguesa traz diversas vantagens imediatas, como o atendimento aos bebês por políticas públicas e benefícios sociais, mas também de longo prazo. Permite livre circulação no país e em toda a União Europeia e possibilidades de estudos em instituições de ensino do continente pagando taxas de cidadãos nacionais. Além disso, em Portugal, fica garantida a autorização para assumir cargos públicos e políticos, nas forças armadas e na diplomacia e direito a voto, entre todos os demais direitos dos cidadãos.
De acordo com dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) de Portugal, pessoas de nacionalidade brasileira compõem a maior comunidade estrangeira residente no país, são 25,6% do total de estrangeiros. Essa é a maior taxa desde 2012, e o crescimento entre 2018 e 2019 foi de 45,5%. Eles migraram por motivos de atividade profissional (34,5%), reagrupamento familiar (26,9%), estudo (11%), porque tinham passaportes europeus (12,9%) ou por outros motivos (14,7%). A fiscalizacao do SEF identificou, em 2019, 1023 brasileiros em situação ilegal.
De acordo com a experiência de Peret, normalmente, a entrada e permanência em Portugal e na União Europeia é a principal motivação dos brasileiros, além dos casos de reconhecimento da ancestralidade. A Casa do Brasil oferece orientação sobre direitos, procedimentos, órgãos competentes e documentos necessários para apresentação de processos de nacionalidade.
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O Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo (RIFA), de 2019, elaborado pelo SEF, considera que “a conjuntura econômica favorável verificada nos últimos anos, particularmente o crescimento do emprego, terão potenciado o crescimento da população estrangeira residente no período compreendido entre 2015 e 2019 (+201.617).”
Para Peret, as razões mais determinantes para o aumento do fluxo migratório de brasileiros são “por um lado, a deterioração da situação socioeconômica e política do Brasil, e, por outro, a melhoria da situação econômica, a maior estabilidade social e alterações legislativas com vistas a facilitar a imigração em Portugal”.
“Como brasileira e como advogada, considero que é uma boa alteração legislativa”, afirma Cunha. “Em termos práticos, as Conservatórioa deixam muito a desejar, especialmente, devido a falta de pessoal. Conservatórias maiores chegam a levar um, dois meses, para apenas responder a um e-mail e cerca de dois anos para concluir um processo”, conta. Ela reconhece, no entanto, que o processo pode ser reduzido a cerca de um ano se conduzido em Conservatórias menos centrais.
A assessoria de imprensa do SEF informa que a competência sobre os recursos para concessão de nacionalidades é do Instituto dos Registros e Notariado, do Ministério da Justiça. Até o fechamento desta matéria, não obtivemos informações da instituição sobre os investimentos que serão feitos em caso de aumento da demanda pelo serviço.
De acordo com Peret, a reivindicação da nacionalidade portuguesa pode gerar perda da nacionalidade brasileira, nos termos do Artigo 12, § 4º, da Constituição Federal Brasileira. Entretanto, para Cunha, há possibilidades de que o bebê também tenha nacionalidade brasileira, desde que os pais procurem orientação em um Consulado-Geral do Brasil em Portugal e procedam ao registro da criança em um cartório brasileiro.
Veja as principais alterações da Lei da Nacionalidade:
Filhas e filhos de estrangeiros nascidos em Portugal:
• Passam a ter atribuída a nacionalidade portuguesa se pelo menos um dos pais residirem legalmente em Portugal ou se os pais não tiverem permanência regular, mas há no máximo um ano, a contar do momento do nascimento.
• Podem adquirir a nacionalidade portuguesa se tiverem frequentado pelo menos um ano da educação pré-escolar ou ensino básico, secundário ou profissional; ou pai e/ou mãe residirem legalmente em Portugal (no momento do pedido).
• Netos de portugueses passam a comprovar a existência de laços de ligação à comunidade nacional sob comprovação do conhecimento suficiente da língua portuguesa (dispensados nacionais de países de língua oficial portuguesa). As comprovações negativas criminais e relativas a atividades terroristas se mantém.
• O nº 6 do Artigo 6º passa a prever que, nos casos de descendentes mais distantes que 2º grau (netos), a descendência terá de se relacionar com cidadão português originário.
• Passa a prever uma nova possibilidade de naturalização das pessoas originárias de antigos territórios ultramarinos que perderam a nacionalidade portuguesa na ocasião da respectiva independência.
• Os crimes relevantes para as questões de nacionalidade passam a obedecer à previsão da lei portuguesa.
Fonte: Casa do Brasil de Lisboa
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