As mensagens colhidas pela Polícia Federal no inquérito que investiga a possibilidade de falsificação dos dados no cartão vacinal do ex-presidente Jair Bolsonaro revelam a participação ativa de seu antigo ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid. Antes de propor a mudança clandestina a Bolsonaro, Cid teria falsificado os dados de sua esposa, fazendo constar nos sistemas do Ministério da Saúde que ela recebeu duas doses da vacina Pfizer contra a covid-19.
Cid teria atuado com apoio de outro militar alocado no Planalto, o sargento Luis Marcos dos Reis, cujo sobrinho era médico da Secretaria de Saúde do estado de Goiás e conseguiu uma cópia do cartão de vacinação de uma enfermeira, mas cujos dados foram substituídos pelos de Gabriela Cid, esposa de Mauro. O oficial ainda pediu que buscassem por um segundo cartão, que seria manipulado para incluir seus próprios dados.
Auxiliados por outro militar, Mauro e Luis Marcos enfrentaram dificuldades para conseguir cadastrar o cartão de Gabriela no sistema ConectSUS, que identificava irregularidades nos dados. A solução encontrada foi buscar ajuda na Secretaria de Saúde de Duque de Caxias (RJ), onde o major reformado Ailton Gonçalves já tinha uma operação estabelecida de falsificações de documentos. O esquema ainda contava com apoio do vereador Marcello Siciliano (PL).
As mensagens revelam que todos sabiam da ilicitude do que estavam fazendo. Ailton Gonçalves chegou a enviar uma mensagem de áudio a Mauro Cid ressaltando os riscos em meio ao processo de cadastramento de dados falsos. “Realmente o negócio é pica e ninguém pode ficar exposto, não é, particularmente, particularmente, quem você sabe, né? Não pode ficar. Mais tá caminhando bem”, garantiu.
Mauro Cid acabou conseguindo garantir a falsificação de seu cartão e do de sua esposa, mas deixando um rastro de falsificação: os lotes de vacinas estavam cadastrados no Rio de Janeiro, e a aplicação em Goiás. Os envolvidos também não ocultaram os dados de acesso às plataformas do Ministério da Saúde, que preservou os cadastros de seus endereços IP, que informam a localização do usuário no momento do acesso. O endereço identificado foi o do secretário de governo de Duque de Caxias, João Carlos de Sousa Brecha.
A Polícia Federal avalia que a falsificação serviu para que Mauro e Gabriela Cid pudessem entrar em território estadunidense, onde a vacinação contra a covid-19 é obrigatória para estrangeiros.
No caso de Bolsonaro, os dados vacinais apresentam as mesmas falhas dos cartões de Mauro e Gabriela Cid: as duas doses foram aplicadas em Duque de Caxias, no endereço IP de João Carlos Brecha, com apenas um minuto de diferença entre o momento de aplicação da primeira e da segunda dose do imunizante cuja a bula exige um intervalo mínimo de uma semana.
Os registros da Corregedoria-Geral da União (CGU) também colaboram para a tese de que Bolsonaro não recebeu as doses. “O ex-Presidente Jair Messias Bolsonaro não esteve no município de Duque de Caxias/RJ no dia 13/08/2022, data em que teria tomado a 1ª dose da vacina da fabricante PFIZER, permanecendo na cidade do Rio de Janeiro até seu retorno para Brasília/DF às 21h25min”, ressalta a PF.
Além de Bolsonaro, Mauro Cid também garantiu a falsificação de dados de outros assessores e de um aliado no Congresso Nacional: o deputado Gutemberg Reis (MDB-RJ) também apresenta irregularidades semelhantes em seu registro de vacinação. Os casos acumulados de irregularidades levaram Alexandre de Moraes a autorizar operações de busca e apreensão, bem como prisões preventivas contra diversos suspeitos do esquema.
Confira a íntegra da decisão:
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