A Instituição Fiscal Independente (IFI) anunciou, em uma análise preliminar, que o pacote de cortes de gastos divulgado pelo governo na última semana não é suficiente para eliminar os déficits primários projetados para os próximos anos. A avaliação foi publicada na última sexta-feira (29). O órgão faz parte da estrutura do Senado e tem como objetivo analisar a política fiscal do governo.
Apesar disso, a IFI considera que as medidas representam um avanço positivo, pois abrangem despesas que atualmente não se adequam aos limites do arcabouço fiscal brasileiro (Lei Complementar 200, de 2023). “O pacote de ajuste anunciado pelo ministro Fernando Haddad parece apontar na direção correta ao limitar despesas permanentes, insuficiente na dosagem e contraditório por misturar, em situação deficitária, a renúncia de receita relevante no Imposto de Renda”, afirma o diretor-executivo da IFI, Marcus Pestana, em artigo publicado no Congresso em Foco.
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A IFI projeta um déficit primário de R$ 102,9 bilhões para 2025, equivalente a 0,8% do PIB, e um déficit de R$ 107,8 bilhões para 2026, também 0,8% do PIB. Mesmo após as propostas de mudança, o cenário fiscal não indicaria superávits primários nos próximos anos, segundo a instituição.
A análise ressalta que o governo ainda enfrenta um “desequilíbrio estrutural” nas contas públicas e na dívida pública, uma situação que se agravou após as revisões das previsões fiscais para os próximos dois anos.
“Convivemos com um desequilíbrio fiscal persistente e estrutural na economia brasileira, que gera consequências indesejáveis em relação à inflação, taxas de juros, câmbio e a percepção de sustentabilidade das contas públicas a longo prazo. Essa deterioração vem sendo observada desde o primeiro semestre, quando as metas fiscais de 2025 e 2026 foram alteradas”, enfatiza a IFI.
O pacote de cortes de gastos está previsto para ser votado pelas duas Casas do Congresso Nacional até o final do ano, conforme informado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. As medidas estão organizadas em uma proposta de emenda à Constituição (PEC) e em um projeto de lei complementar (PLP).
Salário mínimo
A proposta de mudança na correção do salário mínimo é considerada a medida mais impactante entre as que serão ajustadas. A IFI entende que essa iniciativa não deve provocar mudanças significativas no médio prazo, dado o cenário de crescimento econômico mais tímido.
O governo sugeriu limitar o aumento real do salário mínimo nos próximos anos. Hoje, o reajuste é composto pela inflação do ano anterior e pelo crescimento real do PIB dos dois anos anteriores. Com a nova proposta, o aumento real atrelado ao PIB seria restringido a 2,5% ao ano, independentemente de um crescimento econômico maior. Esse limite é o mesmo que foi estabelecido como teto para o crescimento dos gastos do governo, de acordo com a regra fiscal aprovada em 2023.
A restrição ao aumento do salário mínimo também afetará o valor das aposentadorias, que são calculadas com base nele, como observa a IFI.
“Considerando o cenário demográfico e que, nos últimos anos, o crescimento médio dos benefícios previdenciários foi de 2%, a despesa com aposentadorias deverá continuar aumentando além de 2,5%, que é o limite definido na LC nº 200. Portanto, o impacto fiscal nos anos seguintes se dará pela incidência do reajuste, não pelo teto do aumento”, indica o relatório.
Abono salarial
Outras propostas também terão efeitos limitados, como no caso do abono salarial. O governo pretende restringir o número de elegíveis, limitando o benefício a trabalhadores com renda de até R$ 2.640 por mês, em comparação aos atuais R$ 2.824. Esse valor será ajustado anualmente pela inflação até alcançar 1,5 salário mínimo, ponto em que o benefício se estabilizará, o que deve ocorrer em 2035.
“É uma medida estrutural sobre uma despesa primária significativa, que busca alterar o limite de pagamento do abono de dois salários mínimos para 1,5 salário mínimo, mas com uma transição bastante longa de dez anos, o que reduz seu efeito imediato”, afirmam os economistas da IFI.
Bolsa Família, BPC e militares
Quanto ao controle do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), a IFI destaca a dificuldade em quantificar os efeitos reais dessas alterações, especialmente em função da possível judicialização do acesso ao BPC.
Além disso, a IFI acredita que as mudanças nas aposentadorias dos militares, que incluem a definição de uma idade mínima e novas regras para pensões, terão um impacto fiscal “modesto”, com uma economia estimada de apenas R$ 1 bilhão por ano.
Uma análise mais abrangente das medidas será apresentada no Relatório de Acompanhamento Fiscal de dezembro, quando as previsões econômicas e fiscais para curto e médio prazo serão atualizadas, possibilitando uma avaliação mais detalhada dos efeitos dessas ações no gerenciamento da trajetória fiscal da União. (Com informações da Agência Senado)
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