O dólar bateu nos R$ 6,00. A inflação de 2024 esperada é de 4,63%. Foi registrado o maior resgate do Tesouro Direto de toda a série histórica. A saída de dólares, pela via financeira, bateu o recorde até outubro desde 1982. Os juros de longo prazo exigido como prêmio de risco pelos investidores em relação aos títulos públicos brasileiros chegaram aos 7%, acima da inflação. Isso traduz a deterioração veloz, nas últimas semanas, das expectativas dos agentes econômicos, que são os que tomam as decisões de investimento.
Como diria o maestro soberano Tom Jobim: “o Brasil não é para principiantes”. Aqui não há monotonia. Não temos horizontes previsíveis como vivêssemos na Suíça, Dinamarca ou Noruega. Aqui, o copo está sempre meio cheio e meio vazio. O otimismo ou o pessimismo depende do ponto de observação. A economia vem crescendo acima das previsões, o mercado de trabalho está aquecido como níveis baixos de desemprego e a renda média avançou. Está havendo uma pequena recuperação dos investimentos. Mas qual é o fôlego? As curvas da inflação, dos juros e déficits fiscais e da dívida pública apontam para o alto. O desenvolvimento precisa ser sustentado e não se dar em soluços no famoso “voo de galinha”.
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Há já um razoável consenso de que desequilíbrios fiscais persistentes e estruturais têm impactos indesejáveis na inflação, na taxa de juros, no câmbio e no endividamento. Mas há ainda um vasto segmento de pessoas e lideranças que resistem a qualquer coisa que esbarre nos conceitos de responsabilidade fiscal, austeridade, equilíbrio orçamentário. Para esses, a vontade política basta para resolver qualquer problema, o orçamento é um verdadeiro saco sem fundos, o céu é o limite para os gastos.
É possível crescer muito mais e de forma consistente. O câmbio flutuante, o perfil do balanço de pagamentos, as reservas internacionais abundantes, o regime de metas da inflação e a autonomia do Banco Central são âncoras sólidas para a economia brasileira. Mas o perigo é o dilema fiscal. Podemos estar brincando com fogo.
O cumprimento da meta fiscal em 2024 será por um triz, usando, no limite, a margem de tolerância. Para 2025, quando a meta fiscal é novamente déficit primário zero, os números da Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado Federal, indicam uma divergência do orçamento proposto pelo governo em torno de R$ 95 bilhões. O trabalho de Samuel Pessoa, Marcos Mendes, Marcos Lisboa e Alexandre Manoel, “Gastos Públicos nas tentativas de reeleição de 2014 e 2022” demonstra que o Governo Bolsonaro deixou como herança a necessidade de um esforço fiscal de 0,7% do PIB para zerar o déficit, confirmando a trajetória de correção do desequilíbrio esboçada a partir de 2015. Mas quatro decisões de gasto relativas ao salário-mínimo como indexador de despesas orçamentárias, à volta das vinculações de saúde e educação, ao valor do Bolsa Família e aos fundos criados pela reforma tributária, geraram, em 10 anos, segundo a IFI, uma necessidade adicional de recursos na ordem de R$ 2,3 trilhões.
Diante de desequilíbrios tão graves, o pacote de ajuste anunciado pelo ministro Fernando Haddad parece apontar na direção correta ao limitar despesas permanentes, insuficiente na dosagem e contraditório por misturar, em situação deficitária, a renúncia de receita relevante no Imposto de Renda.
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