Durante o governo Michel Temer, quando comandava o Exército o general Eduardo Villas Boas, pesquisas encomendadas pela força apontavam para índices altos de confiabilidade da sociedade com relação à instituição. Foi a partir dessas informações que Villas Boas começou a ensaiar uma política de maior aproximação dos temas políticos. Antes mesmo de o presidente Jair Bolsonaro começar a despontar como favorito na corrida eleitoral, os então candidatos à Presidência começaram um expediente até então inédito desde o fim da ditadura militar e após a redemocratização: incluíram nas suas agendas reuniões com o comandante do Exército.
Nessas reuniões, Villas Boas entregava a eles um caderno com as reivindicações do Exército para o novo governo. Era o início de um processo de protagonismo político que levaria ao engajamento militar à candidatura de Jair Bolsonaro, com a criação do que ficou conhecido como “grupo de Brasília”, uma turma de oficiais da reserva, aposentados com alta patente, que se reunia em uma sala no subsolo do Hotel Imperial em Brasília.
O grupo congregava cerca de 20 oficiais da reserva. Entre eles, alguns generais que formariam o núcleo duro militar do hoje presidente, como o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, e o hoje vice-presidente Hamilton Mourão (este agora nem mais tão próximo assim de Bolsonaro). E se reunia mesmo antes de se definir pela candidatura de Bolsonaro, mas imaginando como poderiam interferir de forma mais direta no debate político. Inicialmente, desconfiavam mesmo da opção Bolsonaro, visto como um militar imprevisível e indisciplinado. Como, porém, ele ia ganhando potencial na corrida eleitoral, chegaram à conclusão que a melhor opção era aderir a ele.
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“Passados três anos de atropelos, indecisões, tomadas de atitudes e falas contrárias aos discursos, a onda chegou à praia sem força e com ela os restos de dejetos atirados ao mar durante o período”, avalia ao Congresso em Foco um desses generais. A adesão a Bolsonaro, considera ele, acabou tendo um efeito oposto ao pretendido quando as pesquisas apontavam para a impressão de confiabilidade das Forças Armadas pela sociedade. Fatos como, por exemplo, a desastrosa passagem do general Eduardo Pazuello pelo Ministério da Saúde, comprometeram a imagem dos militares.
Como Sísifo
Por isso, hoje boa parte deles avalia o retorno a uma posição mais discreta e mais distanciada da política. Como acontecia até então. “Nas nossas pesquisas sempre aparecíamos no topo da confiabilidade e jogávamos parados, fazendo o estritamente determinado nos ditames legais. Agora, com um suposto representante tão incapaz, vamos ter que empurrar a pedra de novo morro acima como Sísifo. Espero que a mantenhamos no topo, mas levará tempo para a escalada”, diz o general, mencionando o personagem da mitologia grega Sísifo, tema de um ensaio do escritor e filósofo francês Albert Camus – segundo Camus, a humanidade repetiria o mito de Sísifo, eternamente condenada a empurrar uma pedra até o topo da montanha, da qual ela rolava, obrigando-o a eternamente empurrá-la de volta.
Segundo o general, diante da impressão dada hoje pelas pesquisas de que não haverá espaço em outubro para outra opção que não seja a manutenção de Bolsonaro ou o retorno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, boa parte desses militares já se inclina por aceitar a volta de Lula, como o “menos pior”.
“Muitos com quem eu falo ainda acham que entre os dois ficam com o menos pior”, afirma. Outros, como a própria fonte do Congresso em Foco, resistem. “Se esquecem do aforismo de Hanna Arendt: ‘Um mal menor ainda continua sendo um mal’”, completa, referindo-se à filósofa alemã, autora de “A Banalidade do Mal”.
No final, avalia ele, o grupo de apoiadores de Bolsonaro, seja qual o caminho que irá seguir, desidrata.
A alternativa, portanto, é voltar para a posição mais institucional, de garantidores da ordem e da segurança, subordinados a quem quer que venha a ser o presidente. Esse o caminho, imaginam, para a retomada da posição que tinham.
Segundo esse general, a motivação principal para a adesão a Bolsonaro não era a busca de maior protagonismo político, mas uma reação “aos descalabros da esquerda, sempre iluminados pela imprensa diariamente”. Ele completa: “Somos um classe muito ligada a valores e o discurso do candidato nos empolgou”.
“Alguns dos que avaliaram ser possível um governo decente que apontasse soluções ao país, e se convenceram de que com Bolsonaro isso é impossível, estão se afastando para compreender a conjuntura e se posicionar como cidadãos para as escolhas vindouras”, conclui.
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