O presidente Lula vem sendo desafiado por uma nova geração de líderes regionais. Visões de mundo estão em choque, sobretudo no campo da esquerda. Num evento paralelo à cúpula da ONU, em Nova York, organizado pelo Brasil, o presidente do Chile, Gabriel Boric, afirmou que a esquerda fracassa ao usar medidas diferentes para criticar governos do mesmo campo. “Já conversamos muito com o presidente Lula sobre isso, como a ‘venezuelização’ da nossa política interna causou prejuízo muito grande para as esquerdas”, disse o chileno no encontro, que contou com outros líderes, como Emmanuel Macron (França), Pedro Sánchez (Espanha), Justin Trudeau (Canadá) e Xanana Gusmão (Timor Leste).
Não é a primeira divergência pública entre Lula e Boric sobre a posição brasileira de leniência em relação ao regime venezuelano e as violações a direitos humanos. Em maio do ano passado, quando Lula recebeu Nicolás Maduro como chefe de Estado no Planalto, o chileno confrontou declarações dele sobre a democracia venezuelana. Também tiveram opiniões distintas sobre a autodeclarada vitória de Maduro nas eleições presidenciais, condenada por Boric desde o primeiro momento, enquanto Lula anda dizia confiar na lisura do pleito. Na terça-feira, Lula não citou a Venezuela em seu discurso, ao abrir a Assembleia Geral da ONU.
Lula e Boric também tiveram posições distintas em relação à guerra na Ucrânia. No ano passado, o chileno classificou de “triste” o texto final da Cúpula da Celac-UE (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos com a União Europeia), por se restringir a uma única menção ao conflito, afirmando ter “preocupação profunda” com seus efeitos. Lula reagiu afirmando que Boric era jovem, não tinha experiência nesse tipo de reunião e, por isso, era mais “ansioso”.
Pesquisa realizada pelo Pew Research Center com 5.180 pessoas, entrevistadas entre janeiro e abril, mostra arranhões na imagem de Lula na América Latina. E os chilenos são os que menos confiam em Lula para “fazer a coisa certa” em relação aos assuntos mundiais: 62%. São seguidos pelos mexicanos (60%), peruanos (55%) e colombianos (53%). Na Argentina houve divisão — 49% não confiam; 40% confiam). Na média, a entrevista mostra que a influência global do Brasil continua a mesma — 49%. Entre os americanos, 64% pensam assim. No México, 57%, e na Colômbia, 50%. Já no Chile o índice cai para 33%.
Boric não é candidato a líder da esquerda latinoamericana. As divergências expostas por ele, porém, evidenciam o desgaste de princípios que vêm norteando a política externa brasileira, especialmente antiamericanos, sob inspiração do embaixador Celso Amorim. O comportamento do governo brasileiro na crise da eleição venezuelana é o melhor retrato dessa corrosão.
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