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A ideia em um segundo
A votação da MP da Eletrobras no Congresso e os movimentos “Fora, Bolsonaro” ajudam a iluminar a distribuição de forças no Congresso e a natureza da coalizão dominante na Câmara, de cunho patrimonialista. Também lançam mais elementos para se buscar compreender o ainda pouco decifrável cenário de eleições em 2022, sobretudo para onde vão os partidos de centro.
A política em Brasília funciona com um olho no horizonte e as mãos no presente. Todos se posicionam em relação às possíveis mudanças na distribuição de poder e atuam no dia a dia para atingir seus objetivos permanentes.
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A votação da Medida Provisória 1031/2021, da privatização da Eletrobras, e as manifestações “Fora, Bolsonaro” nos últimos dias lançaram luzes em três pontos importantes dessa dinâmica: a natureza da coalizão que domina a Câmara dos Deputados, a divisão de forças no Senado Federal e a conjuntura eleitoral.
A coalizão patrimonialista da Câmara dos Deputados
A votação da MP 1031/2021 na Câmara dos Deputados desnudou interesses atávicos presentes no corpo de representantes brasileiro.
Quando se fala em privatização, o discurso pró-mercado padrão diz que a mudança de propriedade das empresas estatais, indo para as mãos privadas, implica em ganhos de eficiência, o que aumenta a produtividade e a competitividade sistêmicas da economia.
A “privatização” da Eletrobras tentada pela Câmara dos Deputados tratou de perverter o discurso padrão. Sim, a propriedade passaria ao setor privado. Contudo, o rol de propostas postiças apresentadas à proposição obrigava a construção de gasodutos e contratação de termelétricas que não trariam ganhos de eficiência. Ao contrário, colocado em jargão econômico, trata-se de políticas “rent seeking”, isto é, distorções do mercado que produzem renda a agentes privados sem contrapartida produtiva. Em linguagem coloquial, são os antigos cartórios distribuídos aos amigos.
Vê-se então que quando se fala em privatização no governo atual, a ação da coalizão dominante na Câmara dos Deputados desnuda a permanente lógica de produzir ganhos privados a partir do controle de mecanismos estatais, sejam empresas ou leis. Assim, transferir a propriedade da empresa para mãos privadas em nada altera o peso que a ação do Estado patrimonialista lança sobre a economia privada e a sociedade.
Quando se fala na existência de uma maioria favorável a reformas pró-mercado no Congresso, a prática real, a natureza da coalizão dominante na Câmara dos Deputados, demonstra o quanto a ideia é descolada da realidade. Privatização, se analisada diante das ações dos deputados, significa apenas ganhos privados, tendo relação incidental com a propriedade de empresas prestadoras de serviços públicos.
A natureza de suas ideias “reformadoras” segue nua e crua: é patrimonialista o eixo da coalizão dominante na casa.
Um Senado Federal mais dividido
O Senado Federal tem se mostrado mais oposicionista: a CPI da Covid ter se instalado na Câmara Alta o revela claramente.
Na votação da MP da Eletrobras, da mesma forma, pode-se ver o maior equilíbrio de forças entre governo e não-governo na casa. Dizemos não governo pois as forças não governistas no Senado formam-se pela oposição tradicional de esquerda e também senadores independentes de fato. Na Câmara, aqueles que se chamam independentes pendem rotineiramente para a posição do governo.
As tabelas adiante apresentam a posição dos partidos representados na Câmara dos Deputados e no Senado Federal na votação da MP da Eletrobras (no caso da Câmara, a primeira votação, na condição de casa iniciadora).
O resultado da votação da matéria principal na Câmara dos Deputados foi de 313 sins, 166 nãos e 5 abstenções num total de 484 votos, placar capaz de aprovar inclusive emendas à Constituição. Já no Senado Federal os nãos atingiram 42 e os sins 37, resultado muito mais apertado e longe de aprovar uma Emenda Constitucional, que exige votos de 49 senadores.
A lista dos partidos coesos não traz tantas novidades. Vemos o núcleo de apoio ao governo constituído por PSL, PL, PP e Patriota. Chama a atenção, contudo, a presença do DEM, que tem ensaiado algumas ações de padrão terceira via para 2022, mas que parecem não resistir aos fatos.
Já entre os coesos da oposição vê-se o núcleo de esquerda do Congresso: PT, PSB, PDT e Rede. Bastante previsível e coerente com o passado das siglas.
O mais interessante, contudo, é a composição dos partidos que denominamos “rachados”. Constata-se que o racha dos partidos dá-se por uma maior rebeldia do Senado em relação ao governo. PSDB, Cidadania, Podemos, MDB, PSD e Pros encaminharam o voto sim à MP da Eletrobras na Câmara dos Deputados. No entanto, suas posições foram de oposição ou de liberação da bancada no Senado Federal.
Vê-se assim que há um núcleo mais significativo de resistência ao governo na Câmara Alta.
2022 e o Fora Bolsonaro
A votação da MP da Eletrobras e as movimentações dos últimos dias em relação ao movimento “Fora, Bolsonaro” tomadas em conjunto mostram um quadro complexo. O impeachment hoje é assunto quente na esquerda, embora ainda não decidido por questões táticas, mas até agora morno ou frio no centro.
De um lado pode-se ver um núcleo de apoio ao presidente da República consubstanciado em PSL, PP, PL e DEM. Tais partidos mostram-se hoje sócios do governo e, a continuar a relação privilegiada em termos de cargos e verbas, podem continuar com o presidente se ele se mostrar razoavelmente competitivo ano que vem. O DEM, com a saída do grupo de Rodrigo Maia da legenda e a relatoria de Elmar Nascimento na MP da Eletrobras, parece ter optado por seguir ao lado de PP e PL.
Na oposição temos a esquerda de PT, PDT e Rede – além de Psol e PCdoB que não têm representação no Senado Federal. O PSB é a novidade do momento ao se fortalecer na oposição, visto na votação da MP da Eletrobras e nas filiações do governador Flávio Dino e do deputado Marcelo Freixo, importantes lideranças do PCdoB e do Psol respectivamente.
Um tanto de curiosidade deve ser devotado ao PDT. É oposição, assim atua, mas seu candidato a presidente, Ciro Gomes, tomou por estratégia combater o adversário de esquerda, Lula, e procurar o apoio da centro-direita. Até onde uma estratégia peculiar como essa dará resultados ainda não se sabe, mas se considerados os palanques estaduais e as relações históricas entre lideranças e militâncias, ela não se coloca de forma pacífica e harmônica dentro do PDT.
O grupo mais interessante agora, contudo, são os partidos “rachados”: PSDB, Cidadania, Podemos, MDB, PSD e Pros – ao qual se pode agregar também o Solidariedade e o Novo.
Este grupo hoje caracteriza o centro em disputa. Ainda menos definidos, tais partidos oscilam entre a continuidade do governo Bolsonaro e um possível apoio ao impeachment (embora o impedimento esteja hoje ainda bastante longe de conseguir massa crítica) e também tateiam na criação de uma terceira via eleitoral ou o apoio aos candidatos já consolidados Bolsonaro e Lula.
Avançando aqui uma especulação de padrão Magalhães Pinto, “a política é como uma nuvem”, podemos dizer que PSDB e Cidadania tendem mais para um compromisso com uma terceira via diferente de Ciro Gomes, dada a relevância de governadores do PSDB e o esforço permanente de Roberto Freire em criar uma alternativa com o apoio do Cidadania. PSD, Solidariedade e MDB tenderiam mais para o apoio a Lula caso seja viável a vitória, do que se vê dos movimentos de Kassab, da história da Força Sindical e seu representante Paulinho e de figuras como Baleia Rossi e Renan Calheiros. Os demais tenderiam a seguir com Bolsonaro. Há obviamente a chance grande pequenas candidaturas no primeiro turno, como deve fazer o Novo. Contudo, o alinhamento ideológico e o passado de alianças apontam para estas grandes linhas de tendência.
Termômetro
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Geladeira
A demissão do agora ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles tira do governo o último remanescente do chamado núcleo ideológico, o grupo de ultradireita identificado com as ideias do escritor Olavo de Carvalho. Agora, as posições mais radicais de direita dentro do governo provavelmente passarão a ser verbalizadas pelo próprio presidente Jair Bolsonaro.
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Chapa quente
As denúncias que apontam irregularidades no processo de aquisição da vacina indiana Covaxin envolvem pela primeira vez diretamente o governo Jair Bolsonaro em uma suspeita de corrupção. Dão à CPI da Covid um norte para minar um dos ativos que Bolsonaro busca repetir cotidianamente à sua base: o de que não há corrupção em seu governo e isso o diferencia dos governos petistas anteriores.
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