O último Relatório de Competitividade Global do Fórum Econômico Mundial apontou como o fator mais problemáticos para fazer negócios no mundo a “burocracia governamental ineficiente”. De uma lista de 16 fatores, a burocracia ficou em primeiro lugar, à frente até da corrupção, impostos e instabilidade política.
Esse indicativo demonstra o peso de um Estado ineficiente e como ele repele investimentos no país. Essa seja talvez a agenda número um dos governos para vencerem o desafio do desenvolvimento e atraírem investimentos. E o Brasil não é exceção à regra.
Além de terem de criar um ambiente burocrático que seja eficiente para promover os negócios, os governos terão ainda de lidar com outro desafio relevante: a confiança do cidadão nas instituições públicas.
Evidentemente que a burocracia estatal entra nessa conta também. Contudo, o problema vai além. Segundo apurou o Banco Interamericano de Desenvolvimento, a confiança do cidadão nas instituições públicas está ligada em grande parte a uma prestação de serviços eficientes, somando 71% de um total de 100%.
Leia também
E é interessante notar que esse fator está bem à frente do segundo maior: integridade e prestação de contas, com 27%. Em outras palavras poderíamos traduzir dizendo que os cidadão estão mais preocupados em de fato terem (e verem) serviços públicos eficientes e de qualidade do que receberem prestação das contas do governo.
Esse fator nos leva a outra consideração: o perfil do novo cidadão. A crescente velocidade das relações viabilizada pela digitalização, a aproximação de pessoas, instituições e grupos facilitada pelas redes sociais, o maior nível educacional e de acesso a informações tem lapidado um novo cidadão, com maior protagonismo político, valores de igualdade, liberdade e participação e que gera maior pressão sobre os governos, demandando serviços públicos eficientes.
Do outro lado do “balcão” está o servidor público prestador desses serviços, que sofre com uma imagem estereotipada de desmotivado e resistente a mudanças, ao mesmo tempo em que tem que lidar com uma institucionalidade processual, complexa, onerosa e de alto risco. Sim, alto risco porque o excesso de controle e responsabilização de gestores tem levado à máquina pública ao que convencionou-se chamar de “apagão das canetas”, um desmotivo à inovação, uma paralisia burocrática ante o receio de inovar (e inovar é risco) na gestão e responder com seu CPF.
Fazendo par com o protagonismo do cidadão está a abertura dos governos. Esse fenômeno, uma onda mundial, significa projetos e ações que tragam da transparência, combate à corrupção, maior participação social na definição de políticas públicas e ao uso de novas tecnologias para tornar os governos mais efetivos e responsáveis. Esse é um fenômeno que (i) desafia novas formas de relação que atendam às expectativas dos cidadãos, (ii) demandam melhorar as políticas públicas em um mundo digital e (iii) traz um conceito de “governo centrado no cidadão”.
Essa nova perspectiva de ver o cidadão, não como súdito submisso provedor de recursos, mas como cliente de um governo que serve, que presta serviços, é uma resposta (ou consequência) das novas demandas do novo cidadão.
Não bastassem os desafios de atrair negócios, aumentar a confiança nas instituições e atender bem ao cliente, digo, ao cidadão, ainda há enormes desafios causados pelo avanço da ciência e da disrupção das tecnologias que fazem com os governos estejam à frente e tenham uma rápida capacidade de resposta. Vejam os exemplos dos carros autônomos e da carne high-tech. Será que isso impacta os governos e as políticas públicas.
Os carros autônomos já são uma tecnologia possível e que está sendo testada em diversas cidades nos EUA e até no Brasil. Empresas de tecnologia e montadoras de veículos estão investindo bilhões em pesquisa e desenvolvimento de olho no mercado potencial, que vai gerar empregos, renda e impostos. A efetiva implementação geraria muitos ganhos em mobilidade, qualidade de vida e espaços públicos. Mas tem gerado problemas em questões relacionadas a segurança e empregabilidade.
A “carne high-tech” é outra realidade, avanço da ciência. E um problema para políticas públicas. O biólogo Mark Post, da Universidade de Maastricht, na Holanda, criou em 2013 o primeiro hambúrguer feito em laboratório a partir de células-tronco de bovinos. Para produzir a carne o material genético é colocado em uma cultura com nutrientes e elementos químicos que promovem sua multiplicação. O que significa isso para um país que tem 250 milhões de cabeças de bovinos e é o maior produtor-exportador de carne do mundo? Como nos preparamos para isso?
Vencer a burocracia ineficiente, prestar serviços públicos eficientes, atender ao “novo cidadão”, centrar o governo no cidadão, lidar com o avanço da ciência e com a disrupção das tecnologias. Esses já são alguns dos principais desafios de hoje e que devem ocupar a agenda por um bom tempo, tanto governo quanto dos gestores, cidadãos e profissionais de Relações Governamentais
Os desafios de ontem já não são como os de ontem. Como lidamos com eles?
Do mesmo autor:
> Especialistas analisam a obra Relações Governamentais e Inovação, em breve nas livrarias
Deixe um comentário