Durante a reunião no PL em que foi xingado e vaiado pelos radicais, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ouviu do ex-presidente Jair Bolsonaro que ele apoiava a reforma tributária porque “não tinha experiência política”.
Ao dizer isso, Bolsonaro se mirava na experiência do seu maior inimigo na política, o PT do hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva. E é mesmo curioso como Bolsonaro muitas vezes parece se mirar no PT na hora de traçar suas estratégias. Mas aí, mira-se como de fato qualquer um se mira no espelho. De forma totalmente invertida: o que está à esquerda, fica à direita, e vice-versa.
Mas Bolsonaro parece se mirar no PT em um daqueles antigos espelhos de circo, que apresentavam os reflexos de forma ampliada, agudizada e distorcida. O que Bolsonaro enxerga nas antigas estratégias do seu principal adversário político ele replica de forma bem menos sutil, radicalizada, sem nenhuma nuance.
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De fato, desde a redemocratização do país, não foram poucas as vezes em que o PT se absteve de apoiar momentos históricos como forma de marcar posição. Na verdade, assim agiu na própria fundação da redemocratização brasileira, quando se recusou a votar em Tancredo Neves na eleição indireta no Colégio Eleitoral. Mais do que isso, expulsou os três deputados da sua bancada que votaram em Tancredo: Aírton Soares, José Eudes e Bete Mendes.
Depois, votou contra o projeto final da Constituição brasileira na Assembleia Nacional Constituinte. Não permitiu que o deputado Ulysses Guimarães, o Senhor Diretas, subisse no palanque de Lula no segundo turno da eleição presidencial em 1989. Recusou-se a participar do governo Itamar Franco depois do impeachment de Fernando Collor, perseguindo Luiza Erundina porque aceitou ser ministra de Itamar. E ficou contra o Plano Real, que deu fim à hiperinflação e conferiu ao país estabilidade econômica.
A verdade é que, embora pague até hoje um preço pela omissão nesses momentos (o próprio presidente Lula já reconheceu isso mais de uma vez, classificando como erros alguns desses posicionamentos), essa marcação de posição teve também para o PT sua importância estratégica. O partido diferenciou-se dos demais, não teve que se responsabilizar por eventuais problemas havidos nos governos após a redemocratização, e isso ajudou que se estabelecesse como contraponto quando o eleitor passou a buscar alternativas.
Bolsonaro mira tais estratégias passadas do PT em seu espelho. Como é, porém, um espelho que distorce e amplia, em tudo ele agudiza o que vê. O que aumenta para ele o risco de, em vez de lucrar com o saldo positivo da estratégia, ficar muito mais com os seus prejuízos.
Do alto da sua “inexperiência” política, Tarcísio disse isso na reunião do PL. “A reforma tributária será aprovada e quem será a responsável por ela não seremos nós”, alertou. É exatamente o erro que Lula enxerga pelo PT não ter apoiado o Plano Real. O Brasil conquistou a estabilidade econômica, saiu da louca hiperinflação e do endividamento, e o responsável por isso não foi o PT.
Há quem enxergue que a mudança tributária brasileira poderá no futuro produzir mudanças tão sólidas e permanentes na economia brasileira quanto as do Plano Real. Se e quando esse futuro chegar, Bolsonaro não poderá dizer que fez parte dele, como o PT nada pode dizer sobre o Plano Real. Já Tarcísio não terá esse problema. Se São Paulo, o estado que ele governa, terá peso maior na decisão sobre a distribuição dos tributos, foi ele quem negociou isso com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o relator Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). O espelho por onde Tarcísio enxergou a reforma não era um espelho de circo…
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