O presidente Jair Bolsonaro desafiou, nesta noite (15), os presidentes da Câmara e do Senado a saírem às ruas com ele para ver como seriam recebidos. Em entrevista ao vivo à CNN Brasil, Bolsonaro rebateu as críticas de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) aos atos realizados durante o dia em defesa do governo e contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.
“Eu gostaria que eles saíssem às ruas como eu. A resposta é essa. Nós, políticos, temos responsabilidade e devemos ser quase que escravos da vontade popular. Saiam as ruas, esses dois parlamentares, vamos ver como vocês são recebidos”, provocou Bolsonaro. “Acordos não podem ser feitos entre nós em gabinetes refrigerados”, emendou.
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Bolsonaro disse que está disposto a receber Maia e Davi no Palácio da Alvorada ou encontrá-los no Congresso já nesta segunda-feira (16). “Respeito os dois [Maia e Alcolumbre], não tenho nenhum problema com eles, tá certo? Estão fazendo as suas críticas, estou tranquilo no tocante a isso. Espero que não queiram partir pro… algo belicoso depois dessas minhas palavras aqui”, declarou. “Vamos deixar de lado qualquer picuinha que porventura exista. O Brasil está acima de nós três”, afirmou.
O chefe do Executivo disse que deseja que os presidentes da Câmara e do Senado possam ser bem tratados, reconhecidos e idolatrados pelo público, e não apenas ele. “Eu quero a aproximação do Rodrigo Maia, quero aproximação do Davi Alcolumbre. Respeito os dois parlamentares. Se nós chegarmos a um bom entendimento e partirmos para uma pauta de interesse da população, todos nós seremos muito bem tratados, reconhecidos e até idolatrados nas ruas. É isso o que eu quero. Eu não quero eu aparecer e eles não, muito pelo contrário”, acrescentou.
Uma das tônicas dos atos deste domingo foram as críticas ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em Brasília, manifestantes carregaram bandeiras e entoaram cantos de “Fora Maia”. Ao cumprimentar apoiadores aglomerados em frente ao Palácio do Planalto, Bolsonaro posou para fotos em que aparecia em primeiro plano a faixa “Fora, Maia”.
PublicidadeHisteria
O presidente foi criticado por líderes do Congresso por ter mantido contato no início da tarde com manifestantes, mesmo estando ainda em observação pela proximidade que teve com pessoas infectadas pelo coronavírus no avião que o trouxe dos Estados Unidos. Bolsonaro disse que é contra a adoção de medidas que possam restringir a circulação de pessoas e a realização de eventos. “Devemos respeitar, tomar as medidas sanitárias cabíveis, mas não podemos tratar como uma neurose, como se fosse um fim do mundo”, ressaltou.
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“Proibir isso e aquilo não vai no meu entender conter a expansão dessa forma muito rígida. Devemos tomar providência porque pode sim se tornar em uma questão bastante grave a questão do vírus no Brasil, mas sem histeria. A economia tem que funcionar, porque não podemos ter uma onda de desemprego no Brasil. O desemprego leva a pessoas que já não se alimentam muito bem a se alimentar pior ainda e vão ficar mais sensíveis, uma vez sendo infectadas, e levar até a óbito”, afirmou o presidente.
Para Bolsonaro, é preciso ver se as medidas que têm sido tomadas por governadores para conter e combater a covid-19 não vão prejudicar a economia e gerar mais desempregos e mortes. “Temos que ver até que ponto essas medidas vão afetar a nossa economia que em grande parte vem aqui, do povão. Quando você proíbe jogo de futebol, entre outras coisas, você está partindo pro histerismo no meu entender”, afirmou.
A entrevista foi feita em frente à entrada do Palácio da Alvorada. A CNN Brasil começou sua programação às 20 horas deste domingo.
Reação no Congresso
Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre e lideranças do Congresso reagiram mal à participação de Bolsonaro no ato em favor de seu governo e contra o Parlamento e o Supremo.
“O Presidente da República ignora e desautoriza o seu ministro da Saúde e os técnicos do ministério, fazendo pouco caso da pandemia e encorajando as pessoas a sair às ruas. Isso é um atentado à saúde pública que contraria as orientações do seu próprio governo”, disse Maia pelo Twitter.
O presidente da Câmara contrapôs a postura do chefe do Executivo brasileiro à dos governos de países como Estados Unidos e Nova Zelândia, que baixaram os juros, e Alemanha e Espanha, que fecharam fronteiras. “Há um esforço global para conter o vírus e a crise”, colocou.
Maia frisou que a economia mundial desacelera rapidamente e disse que a economia brasileira sofrerá as consequências diretas. “O Presidente da República deveria estar no Palácio coordenando um gabinete de crise para dar respostas e soluções para o país. Mas, pelo visto, ele está mais preocupado em assistir às manifestações que atentam contra as instituições e a saúde da população”, completou.
Maia finalizou o posicionamento dizendo que a situação é preocupante e exige de todos serenidade, racionalidade, união de esforços e respeito.
Confronto à democracia
Em tom menos contundente mas também crítico, Davi Alcolumbre criticou a postura do presidente. O senador disse ser inconsequente estimular a aglomeração de pessoas nas ruas em um momento em que a pandemia do coronavírus fecha as fronteiras dos países e assusta o mundo.
O presidente do Congresso Nacional também criticou uma das pautas principais dos atos deste domingo, a de ataque às instituições, em especial o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo ele, convidar para ato contra os Poderes é confrontar a democracia.
“É tempo de trabalharmos iniciativas políticas que, de fato, promovam o reaquecimento da economia, criem ambiente competitivo para o setor privado e, sobretudo, gerem bem-estar, emprego e renda para os brasileiros”, concluiu.
Atos contrariam orientações
Na semana passada, com a escalada da crise derivada da disseminação da Covid-19 no Brasil, o Ministério da Saúde orientou a população a evitar aglomerações e contato social como idas ao cinema, shoppings e viagens. De acordo com a pasta, as capitais do Rio de Janeiro e de São Paulo já registram caso de transmissão comunitária, quando não é identificada a origem da contaminação.
Em Brasília, o governador Ibaneis Rocha (MDB) prorrogou por 15 dias as medidas preventivas que havia baixado contra o coronavírus. O decreto estende pelo período a suspensão de aulas nas redes pública e privada e proíbe eventos que reúnam mais de 100 pessoas e que dependam de autorização do poder público.
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Pautas
As manifestações foram chamadas inicialmente de “dia do foda-se”. Apoiadores do presidente passaram a convocar um ato do dia 15 de março em defesa do presidente após as declarações do ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) de que o Congresso estaria chantageado o Planalto.
Em uma conversa com os ministros Paulo Guedes (Economia) e Luiz Eduardo Ramos (Governo), a respeito do orçamento impositivo, Heleno disse: “Nós não podemos aceitar esses caras chantagearem a gente o tempo todo. Foda-se”. O áudio vazou em live gravada e divulgada pela equipe do próprio presidente durante cerimônia de hasteamento da bandeira, em frente ao Palácio da Alvorada.
Desde então, o tom de convocação da manifestação passou a ser de fortes críticas ao parlamento, com ataques pessoais a Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) e ofensivas institucionais contra a Câmara e o Senado. Em linhas gerais, as convocações do ato defendem que o parlamento tem agido contra as tentativas do Planalto de implementar projetos benéficos ao país.
Outra tônica dos atos é o ataque ao Supremo Tribunal Federal (STF), o que ganhou força depois que o ministro Celso de Mello criticou o presidente da República por ter enviado vídeos em grupos de WhatsApp convocando a população para ir às ruas contra o Congresso e o STF. O decano da corte alegou que o presidente poderia estar cometendo crime de responsabilidade ao “transgredir a supremacia político-jurídica da Constituição e das leis da República”.