Albert Einstein dizia que duas coisas são infinitas: “o universo e a estupidez humana”. Mas, em relação ao universo, ele dizia que ainda não tinha “certeza absoluta”. Bolsonaro e seus apoiadores exemplificam à perfeição essa estupidez infinita a que se referia o pai da relatividade. Com uma agravante: além da estupidez, Bolsonaro e seu gado exercitam diariamente o esporte da insensibilidade e do descaso com a vida humana, atitudes cultivadas como virtudes dos fortes, esses que não se apiedam da dor dos semelhantes porque macho que é macho não se curva, homem que é homem não chora, e ter pena dos outros é pros maricas.
>Datafolha: 42% dos brasileiros reprovam a atuação de Bolsonaro contra pandemia
Temos um presidente e um séquito de seguidores que pregam um perigosíssimo negacionismo – eufemismo que entrou em moda, mas que não passa da nossa velha e conhecida mentira. Aliás, não uma, mas uma carrada de mentiras com ajuda das quais milhares de pessoas têm morrido pela ação de uma doença de dimensões planetárias. E sem que o chefe do governo diga às suas famílias, na falta de uma ação efetiva para enfrentar o mal, pelo menos uma, uma palavra de conforto. Palavra de conforto? Tá me estranhando? Isso é coisa pra maricas!
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Educação? Mas que educação?
O capitão-presidente e os que o acompanham se orgulham de se alhearem ao sofrimento e à dor dos que perderam parentes e amigos.
Não sei que tipo de educação Bolsonaro recebeu. Nem a que ofereceu aos filhos. Mas aposto que devem ter sido “educados” segundo o princípio que norteou a escrita de um dos livros mais perniciosos já vendidos no Brasil, e que esteve muito em moda até meados do século passado, “Nascido para vencer”, do psicólogo Kevin Leman. Uma aula completa de egoísmo e falta de empatia. Numa resenha encontrada na internet, lê-se que o tal livro ensina aos pais a transmitir aos filhos a importância de saber “o que quer da vida e para onde vai (…), a trabalhar melhor sozinho do que em grupo, a ser empreendedor, que o mundo é sempre a preto e branco, não há cinzentos. E saber que está sempre certo mesmo que digam que isso se chama teimosia”. Qualquer semelhança (não) é mera coincidência. Com certeza, no livro não deve haver uma única linha sobre solidariedade, compaixão, empatia, doação, compartilhamento, compreensão, essas características dos mariquinhas, como o capitão ensina dia sim e outro também. O que o livro ensina é apenas a colocação em prática da máxima norte-americana do self made man, o homem que se faz por si mesmo. E o resto? Ah, o resto que se dane! Como diria aquele personagem do Chico Anysio: – Eu quero é que se exploda, eu quero é me dar bem!
O desgaste político que se dane, ora!
Nos últimos dias, Bolsonaro, mesmo diante do monstruoso número de 180 mil mortos e do crescimento exponencial da pandemia teve a cretinice de afirmar que ela está “no finalzinho”. Seu governo, ao contrário do mundo civilizado onde as vacinas não só estão sendo produzidas como já começaram a ser aplicadas à população, só foi apresentar no último sábado, em linhas muito gerais e no meio de uma carrada de polêmicas e controvérsias, um “plano de vacinação”, com mais furos do que uma tábua de pirulitos, como se dizia antigamente. O ministério, comandado por um general que não distingue um band-aid de um rolo de esparadrapo, até agora não moveu uma palha para dotar o país dos insumos básicos necessários, como seringas, agulhas, freezers e veículos destinados à distribuição das vacinas. Providência que devia ter sido tomada ontem, ou anteontem. Ou iniciada lá em março, quando essa praga apareceu por aqui. E sabe por que? Porque para essa gente a vida humana não vale coisa alguma, não é mesmo? E todo mundo vai morrer, não é mesmo? E quem não enfrenta a doença de peito aberto é um maricas, não é mesmo? E a pandemia está no finzinho, não é mesmo?
E olha que o Brasil até outro dia era referência mundial em campanhas de vacinação. Pois não é mais. O governador João Doria, que tem quinhentos e um defeitos e merece uma tonelada de críticas, desta vez foi quem saiu à frente e está fazendo o que o governo federal devia ter feito há muito tempo. Ele anunciou o início da vacinação em São Paulo para janeiro próximo. Mas pra quê! O governador de Goiás, Ronaldo Caiado teve um ataque de ciúme e vem acusando Dória de ter criado pânico na sociedade por se antecipar no anúncio da data da vacinação. E disse ter ouvido do ministro da saúde (que já se apressou em negar) que o governo vai confiscar as vacinas produzidas pelo Butantan. Duas mentiras do médico governador goiano: em primeiro lugar, onde está esse pânico a que ele se refere?
Ninguém sabe, ninguém viu. Nem vai ver. Além disso, as pessoas estão é satisfeitas, isto sim, satisfeitas, porque Doria, na falta de um governo federal inteiro, é o único governador – incluídos aí os de partidos da oposição – que está fazendo alguma coisa prática neste momento. O governo Bolsonaro não tem moral alguma para confiscar seja lá o que for. Até porque Doria já havia posto as vacinas à disposição do Ministério da Saúde, que na época esnobou a oferta. Imagina se Bolsonaro ia ficar a reboque de Doria. Mas nem! E, com certeza, Caiado está preocupado é com o desgaste político que Doria lhe causou, porque São Paulo está saindo na frente e ele, Caiado, ficou parado como um pequi roído na beira da estrada, preso à aliança política com Bolsonaro. Neste caso, em bom e castiço português, é bom deixar bem claro: o desgaste político de Caiado que se dane! Assim mesmo, com palavras bem cruas. Porque a vida humana é o que importa, neste momento. E não o desgaste político de Caiado ou de quem quer que seja. E o que menos importa são as picuinhas políticas no trato das vacinas e da própria doença, como Bolsonaro vem tratando a covid-19.
Seus apoiadores, que negam a eficácia das vacinas, não gostam de usar máscaras e se reúnem em aglomerações onde se contaminam, elevam as estatísticas e lotam os cemitérios, seguindo o exemplo do chefe. Acham que esses cuidados são exageros inventados pela oposição. Nesse caso, como ouvi outro dia num áudio desses de WhatsApp, se é exagero, então morram! Simples assim.
O diabo é que a doença não é um problema particular e, sim, social. O melhor exemplo é o da máscara: uso a máscara para me proteger e proteger os outros. E os outros devem usar para se proteger e para me proteger. Por isso, os que são contra e não fazem sua parte, têm mais chances de morrer dessa praga. E morrerão, sim, vítimas do seu próprio descaso. Mas, lamentavelmente, irão para o cemitério ou para o crematório acompanhados dos milhares de contaminados que nada tinham a ver com sua insensibilidade.
Civilização é coisa de maricas
Se isso que se conhece como civilização começa pela convicção da importância de “cuidar do outro”, o que dizer de um presidente que até agora não teve a decência de ir aos meios de comunicação ou mesmo gravar um áudio desses bem rapidinhos, com uma palavra de conforto, uma só, às famílias de 180 mil brasileiros abatidos por essa desgraça que já nos coloca como segundo país em número de mortos no mundo? Pois ele não o fez. E nem fará. E sabe por que? Porque entende isso como um ato de fraqueza. E ser forte, na opinião dele, é ter o direito de possuir uma arma para se defender e deixar a polícia em paz, ora!
Por isso, zerou os impostos para pistolas importadas. Ou seja: para ele, a tal de civilização, isso de se importar com o outro, ainda não chegou. No mesmo dia em que o Brasil batia o patamar dos 180 mil mortos Bolsonaro e a mulher estavam inaugurando uma exposição em homenagem ao mau gosto, com a exibição das roupas que usaram no dia da posse. Pelo amor da santa, né?
A sabedoria popular é de uma simplicidade fulminante. Ela ensina que “se a dor do outro não te afeta, quem precisa de ajuda é você”.
Ajuda? Mas que ajuda que nada! Ajuda é coisa de maricas, não é mesmo? E aqui todo mundo é muito macho e a gente resolve tudo é no gatilho da pistola! Porcaria de máscara, porcaria de afastamento, porcaria de vacina! Tudo porcaria! Macho que é macho acaba com esse vírus é com chumbo quente, talkey?
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