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A ideia em um segundo
Jair Bolsonaro contava que seu apoio no eleitorado seria sempre a “maior minoria”, o que lhe faria competitivo nas eleições de 2022. Uma eventual reeleição do presidente dependerá da polarização com um adversário com maior rejeição que a dele. O recrudescimento da pandemia, contudo, parece estar criando uma “maioria” que se coloca contra a forma como Bolsonaro conduz o país. Mais grave para o presidente foi a entrada de Lula na competição, tanto com bom índice de apoio quanto com rejeição bastante menor que a esperada. Como eles sairão desse labirinto?
Bolsonaro segue com cerca de um terço de aprovação ao seu governo de acordo com os índices de ótimo e bom em várias pesquisas de opinião. Este número surpreende. Aqui no Farol, por várias vezes, esperávamos sua queda, tanto diante da crise econômica quanto do recrudescimento da pandemia e seus efeitos, principalmente o número de mortes. Contudo, ele segue firme, ainda.
O presidente talvez tenha compreendido de forma pioneira a consolidação de um bloco de opinião pública inédito na história brasileira. De maneira geral, os eleitores brasileiros sempre costumaram ser mais pragmáticos em suas posições, considerando condições de vida e desempenho do incumbente no governo. Bolsonaro, contudo, energizou e se aproveitou de um grupo que compra o discurso anti-elite, está insatisfeito com a sociedade em que vive em termos econômicos e de valores, teme as mudanças no rumo da modernidade globalizada, multiétnica e multiidentidade, e, sobretudo, mantém-se fiel a esse ideário. Por um lado, este grupo se alimenta da despolitização atávica de nossa sociedade. Por outro, contudo, inova ao se posicionar de forma confortável na extrema direita.
A necessidade da rejeição ao adversário do segundo turno decorre do enquadramento político de Bolsonaro. Ele não faz a tradicional evolução ideológica da extrema para o centro, como Lula, por exemplo, fez em 2002, mas sim aferra-se à sua posição de extrema direita. Para ser competitivo num segundo turno, o centro precisa estar vazio, pois ele não tem como movimentar-se nessa direção.
PublicidadeDilema bolsonarista
A estratégia de Bolsonaro assentou-se num forte discurso ideológico. É em cima de valores ideológicos que ele se comunica rotineiramente com seus apoiadores. Raramente ele abriu canal de comunicação com o eleitorado a partir de realizações de governo. O ganho popular em cima do auxílio emergencial foi uma dessas situações excepcionais.
Mas a construção da estratégia assentada sobretudo em ideologia traz problemas para o presidente.
Em primeiro lugar, ele não pode abandonar o discurso radical sob pena de perder o apoio dos famosos 30%. A pandemia tem criado, de forma lenta, posicionamento mais geral da sociedade em favor de iniciativas responsáveis, seguimento da ciência e apoio à vacina. Quando Bolsonaro ensaiou apoiar a vacina a grita de seus seguidores foi grande e o movimento do presidente refluiu.
Seu dilema se coloca da seguinte forma: mudar de discurso sobre a pandemia o enfraquece diante de seu grupo fiel ao mesmo tempo em que o coloca na última posição da fila dos apoiadores da ciência, da responsabilidade e da vacina. Contudo, se a maioria se formar do outro lado, ele pode ser derrotado.
Assim, o primeiro grande problema de Bolsonaro é que uma dimensão central da discussão pública no Brasil o está colocando do lado minoritário. Discutir a pandemia coloca Bolsonaro ao lado dos 30%, e todo o restante da sociedade de outro.
A surpresa de Lula
O segundo problema para Bolsonaro veio com a baixa rejeição de Lula pelo eleitorado. Provavelmente o presidente contava que o petista poderia voltar ao certame, mas certamente o potencial de votos do ex-presidente deve ter assustado.Pesquisa divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo em 6 de março mostrou que o potencial de votos de Lula é de 50% ─ quem votaria com certeza no candidato ou poderia votar. A rejeição do petista é de 44%, a menor entre os dez nomes pesquisados. O potencial de votos de Bolsonaro é de 38%, e sua rejeição, de 56%. Ambos os candidatos empatam em desconhecimento pelo eleitor, 6%.
Lula, além de contar com o recall de seu governo em vários setores da sociedade, aproveita-se sobretudo de sua posição de desafiante. Lula tem feito movimentos a favor do combate racional e solidário da pandemia e pelo emprego, renda e crescimento econômico. É da natureza que uma campanha amarre o incumbente ao seu desempenho efetivo, enquanto aos desafiantes abre-se o espaço da promessa, da crítica, do sonho – em forma sintética, da vantagem de não ter de enfrentar dificuldades e erros advindos da ação real.
Assim, Lula, além de sair na frente nas pesquisas eleitorais, conta com a vantagem estratégica ─ tanto mais em tempos de crise ─ de estar ao lado do combate à pandemia e postar-se no espaço privilegiado das promessas e do sonho.
O relógio está correndo
Bolsonaro depara-se com os dois grandes problemas da pandemia e da crise econômica e ainda seu desaguar precoce no calendário eleitoral.O presidente só avança para além dos seus 30% se a pandemia e a economia melhorarem. Espera-se que a evolução da vacinação, mesmo na lenta velocidade imprimida até o momento, vá melhorar a situação – embora muito já se fale de uma piora catastrófica nas próximas semanas. A economia, por sua vez, também apresenta uma dinâmica própria de incentivos e ações que demora a trazer resultados.
A dinâmica da pandemia e da economia pode ainda dar alguma esperança a Bolsonaro, pois tudo deve estar melhor em 2022. Contudo, como a campanha eleitoral já ganhou a cabeça de políticos e se esparrama pela mídia, apoios de partidos e lideranças entraram em ebulição precoce. Nas possíveis negociações, Bolsonaro tem a vantagem de deter a caneta e distribuir benesses imediatamente, mas o horizonte futuro é mais favorável a Lula. Isso sem contar a aposta estratégica de alguns – hoje fraca, mas que pode voltar a se fortalecer – numa terceira via competitiva entre Bolsonaro e Lula.
Bolsonaro está hoje onde sua estratégia o levou: radicalizou o discurso antielite, contra mudanças sociais rumo à modernidade e, por consequência, contra a ciência. A pandemia deixou claro como suas opções são perniciosas e o resultado ruim aflorou. A volta de Lula foi como a segunda frente de impacto em Bolsonaro, consolidada pelo nível de rejeição ao petista menor do que ao presidente.
A tempestade está formada para Bolsonaro, que olha 2022. Contudo, um recrudescimento fora de controle da pandemia pode destruí-lo ainda em 2021, pois impeachment e CPIs entram e saem do cenário político…
Termômetro
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Geladeira
O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, chega ao fim da semana com a cabeça a prêmio. Sua demissão foi pedida, explícita ou implicitamente, pelos presidentes da Câmara e do Senado, por governadores, pela oposição e até por governistas, que exigem mudanças na política externa do país. A percepção dos críticos do chanceler é que muitas das dificuldades que o Brasil encontra hoje para importar vacinas e insumos de imunizantes decorrem de sua postura pouco amistosa com nações como a China. Em audiência no Senado, na quarta-feira, ouviu vários apelos para deixar a pasta. “Pega o beco”, sugeriu o senador Jean Paul Prates (PT-RN).
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Chapa quente
Cresce no Congresso as articulações em torno de um novo Refis para dívidas tributárias e não tributárias. O movimento é encabeçado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que tenta aprovar um projeto de sua autoria que prevê parcelamento de débitos em até 175 vezes e condições favoráveis para o pagamento de multas e juros. O Ministério da Economia ainda resiste à ideia. Paulo Guedes aceita o refinanciamento apenas para as dívidas tributárias de 2020 e restrito aos setores impactados pela pandemia. As negociações com o ministro são conduzidas pelo líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), relator da proposta.
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