Em entrevista ao Congresso em Foco, a presidente da Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais da Câmara, deputada Célia Xakriabá (PSol-MG), afirmou que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação ao marco temporal, que favoreceu a manutenção de territórios indígenas no país, foi a “vitória do século” para os indígenas, mesmo diante de “ministros votando de maneira racista”. Para a deputada, a decisão é sobretudo uma “vitória econômica e do planeta” como um todo.
O Supremo considerou inconstitucional a tese do marco temporal como critério para delimitação de terras indígenas. O julgamento terminou em nove a dois. Abrindo com placar de cinco votos contrários a dois favoráveis, o julgamento só precisava de mais um voto para formar maioria contrária à tese, que define o destino de 63% das reservas indígenas no Brasil. O voto que faltava para a maioria foi do ministro Luiz Fux.
“Eu nunca vi o movimento indígena brasileiro ter uma vitória tão emocionante, porque é uma vitória não somente do presente, é uma vitória pelo passado e para projetar o futuro”, disse Célia, que acompanha o julgamento desde 2021, ano que ficou acampada em Brasília por 30 dias com a ministra Sônia Guajajara, atual e primeira ministra dos Povos Indígenas. As declarações foram dadas pela deputada ao site na última quinta-feira (21) durante a cerimônia do Prêmio Congresso em Foco. Célia Xakriabá foi uma das premiadas da noite.
Processos de colonização
Apenas dois ministros votaram de forma favorável ao marco temporal: Nunes Marques e André Mendonça. Entre os de posição contrária, porém, Alexandre de Moraes apresentou uma proposta alternativa, em que o marco temporal é negado, mas os proprietários afetados pelas demarcações seriam ressarcidos pela União graças à perda da terra. O tribunal ainda deve discutir é se haverá algum tipo de compensação a pessoas que ocuparam de boa-fé terras reivindicadas por indígenas.
Segundo a parlamentar, a decisão não é favorável apenas de um ponto de vista cultural e ancestral, mas também conquista de repercussão econômica e de impacto global. “Porque nós entendemos que estamos em um momento de transição econômica, transição energética e transição humanitária, mas ainda vimos também ministro votando ainda de maneira racista, não reconhecendo os processos de colonização.”
O processo decide se o critério de demarcação de terras indígenas deve ser a tese do indigenato, ou seja, com base nas necessidades e tradições de cada povo; ou a tese do marco temporal, que estabelece como legítimas apenas as terras ocupadas pelos povos originários em outubro de 1988, quando foi promulgada a Constituição. A segunda tese invalidaria as demarcações em processo de homologação, o que corresponde a 63% das terras indígenas.
Cabrais do Século 21
Célia afirma que a ONU já reconhece que a demarcação dos territórios indígenas é a solução número um pra barrar a crise climática. A deputada chamou atenção para as notícias que divulgaram que esta seria uma das semanas com temperaturas recordes e que somos a última geração com capacidade de reverter o quadro de aquecimento e crise climática.
A deputada também qualificou o julgamento com uma espécie de fronteira final para impedir o avanço indiscriminado do agronegócio e da mineração. “Tenho chamado alguns do Congresso Nacional e do STF de Cabrais do Século 21 porque mudaram a roupagem, mas não a intenção de arrancar e matar nossos direitos.”
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