Na última semana, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei da deputada Dani Cunha (União-RJ) que criminaliza a discriminação contra pessoas politicamente expostas. Duramente criticado em plenário, o texto passou por uma série de mudanças decorrentes de seus destaques, restando apenas os trechos referentes à discriminação por parte de organizações financeiras, que ficam proibidas de negar serviços a agentes políticos em função da atividade, mesmo aqueles que respondem em inquéritos policiais. Os prós e contras dividem opiniões entre juristas.
Antonio Carlos de Freitas Junior, professor de Direito Constitucional do Instituto de Direito Público (IDP), defende o projeto, acreditando que ele soluciona um problema cotidiano enfrentado por agentes públicos e seus familiares. “Essas pessoas sofrem incômodos para abrir e movimentar contas bancárias, por exemplo, e também no mercado de trabalho, uma vez que políticas de compliance cada vez mais vedam a contratação destas pessoas para evitar favorecimentos”, explicou.
Para ele, essas restrições acabam se tornando um obstáculo para a entrada de cidadãos na política. “Todos os políticos vêm sendo prejudicados – inclusive os bons e honestos, que veem invertida sua presunção de inocência, ou seja, tendo que provar que são honestos a todo momento, unicamente por ocupar cargo público”, apontou.
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O advogado Antonio Rodrigo Machado, vice-presidente do Instituto de Direito Administrativo do Distrito Federal e também professor do IDP, já enxerga com preocupação o teor do projeto. “O direito à indenização em caso de uma recusa discriminatória já existe no Código Civil. Todo aquele que causa dano a alguém é obrigado a reparar. Agora, tratar isso como um delito penal já não tem qualquer razoabilidade”, argumentou.
Ele se preocupa com os efeitos implícitos dessa criminalização. “Um tipo penal, quando é criado, traz diversas consequências que nem sempre são necessárias para a resolução dos problemas da sociedade. Como estamos falando de uma atuação bancária, uma atuação financeira, nós temos outras esferas para a resolução desses problemas. Quando a gente estabelece um novo crime para resolver esse suposto problema, podemos estar usando uma bala de canhão para matar um mosquito”.
Além do Código Civil, Machado relembra que o próprio texto constitucional já apresenta mecanismos de proteção contra a possibilidade de discriminação de pessoas politicamente expostas que respondam a inquéritos. “Essas pessoas já gozam na Constituição do princípio da presunção de não culpabilidade. Portanto, elas não podem sofrer qualquer tipo de tratamento negativo diferenciado na esfera financeira, administrativa ou qualquer setor da sua vida. Esses tratamento deverão ser afastados pelo Poder Judiciário. Isso já é proibido”.
Pessoas politicamente expostas são aquelas que ocupam cargos na administração pública, nos escalões superiores do direito nacional e internacional ou cargos legislativos. Rodrigo Machado ainda aponta para o fato de a própria condição de suas atividades permitir a compensação por eventuais abusos de instituições financeiras. “Estamos falando de pessoas que ocupam os mais altos cargos da estrutura estatal. Elas têm maiores condições de lutar contra decisões equivocadas contra si do que os cidadãos em geral. Isso faz com que o tratamento não isonômico não tenha qualquer razoabilidade para ser implementado em uma nova lei”.
Apesar da preocupação, Machado concorda com Freitas Junior ao considerar que existe um lado positivo no projeto. “Quando uma instituição financeira nega a abertura de uma conta ou nega a concessão de crédito, e o projeto exige que isso seja feito por escrito e a pessoa tenha acesso a essas informações, eu vejo que está obrigando a instituição a agir com transparência, até para que aquela pessoa eventualmente, caso se sinta vilipendiada, possa recorrer ao Poder Judiciário para ter acesso aos fundamentos. Nesse ponto, acho que é muito positivo para a sociedade”, ponderou.
Já apreciado na Câmara, o projeto agora aguarda seu envio ao Senado, onde será submetido a uma nova análise. Na casa revisora, ele ainda pode ser submetido a novas alterações, mantendo tanto a possibilidade de se tornar ainda mais restritivo quanto até mesmo a de sofrer rejeição. Confira a seguir a íntegra da versão aprovada em plenário:
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