Renata Camargo e Edson Sardinha
Dos 633 deputados que exerceram mandato na atual legislatura, apenas um participou de todas as sessões reservadas a votação nos últimos quatro anos. Carlos Manato (PDT-ES) não teve nenhuma falta nos 422 dias em que o plenário da Câmara se reuniu em sessões deliberativas. Os deputados que mais se aproximaram do campeão em assiduidade foram José Genoino (PT-SP) e Jofran Frejat (PR-DF). Os dois acumularam apenas quatro faltas nesse mesmo período.
Esses três parlamentares encabeçam o grupo de 32 deputados que registraram mais de 400 presenças no período entre 6 de fevereiro de 2007 e 21 de dezembro de 2010, segundo levantamento feito pelo Congresso em Foco com base em registros oficiais da Câmara. Esses congressistas tiveram assiduidade igual ou superior a 95%.
Veja a lista dos campeões em assiduidade
A bancada dos mais assíduos na Câmara reúne representantes de 14 partidos políticos, de 16 estados e do Distrito Federal. O PT e o PP, com cinco nomes cada, são as legendas com mais parlamentares entre os mais presentes. PMDB e PSDB, com quatro, vêm em seguida. Na lista dos campeões de assiduidade, São Paulo e Goiás são os estados com mais parlamentares: quatro cada. Na sequência, aparecem Distrito Federal, Ceará e Paraná, com três.
Presença obrigatória
Único deputado a comparecer a todas as sessões, Manato atribui sua assiduidade a uma determinação pessoal. “É um compromisso que tenho comigo mesmo, em primeiro lugar, com meus eleitores. Eu me considero um ‘caxias’”, declara o deputado. Ele conta que recusou convite para acompanhar a comitiva do presidente Lula no ano passado ao Espírito Santo porque a visita coincidia com votações no Congresso.
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Para José Genoino e Jofran Frejat, estar presente em plenário é o mínimo que um deputado deve fazer. “Sempre considerei isso um dever elementar. O mínimo que se pode fazer é não estar ausente nas votações”, avalia Genoino, que se despede do Congresso no final deste mês. “Se você assume compromisso com a população de responder positivamente pelo mandato que está sendo concedido, você tem de estar presente”, afirma Jofran.
Com apenas cinco faltas em toda a legislatura, Pedro Fernandes (PTB-MA) diz que cultiva desde o tempo de estudante o hábito de não deixar de comparecer aos compromissos assumidos. “Terça, quarta e quinta são exclusivos para Brasília. Volto quinta à noite ou sexta para o Maranhão. Como estudante de engenharia e funcionário do Banco do Desenvolvimento do Maranhão, também não tive faltas”, afirma. “O que não é hábito muito comum entre a gente. O certo é estarmos sempre presentes. A sociedade recebe isso muito bem”, observa o deputado, que se licenciou do mandato na virada do ano para assumir a Secretaria das Cidades no governo do Maranhão.
Um dos sete deputados mais assíduos, Jutahy Junior (PSDB-BA) considera a presença em plenário uma demonstração de respeito ao eleitor. “Eu sou um representante. Se não voto a matéria, estou deixando de representar o meu eleitor. Tenho por norma fazer com que a prioridade da minha atividade parlamentar seja a presença no plenário. Por isso, não marco nada, a não ser em casos excepcionalíssimos, para terça, quarta e quinta-feira”, afirma, referindo-se aos dias que o Congresso reserva para votações.
Sagrado e indispensável
A caminho de seu décimo mandato na Câmara, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) também considera “indispensável” a presença em plenário. “Aprofundar a presença em plenário é muito instrutivo, você aprende com os outros deputados. Essa presença é muito útil.” Miro esteve presente em 410 dos 422 dias com sessões deliberativas na atual legislatura.
Um dos 20 deputados que mais compareceram às sessões deliberativas em toda a legislatura, Chico Alencar classifica a sessão plenária como “síntese da atividade parlamentar” e “um momento sagrado”. “Em tese, a sessão plenária é o espaço do dissenso e da resolução pelo voto aberto da maioria”, afirma o deputado, que teve 406 presenças na legislatura.
“É preciso acabar com esse método ‘conciliador’ de só se votar matérias ‘consensuais’, com acordo de lideranças. Estamos ali pra divergir, para representar as contradições de uma sociedade de classes, para disputar ideias e projetos, e não para fazer acertos e amenizar as divergências”, acrescenta.
Necessidade de mudanças
Modificações mais profundas no funcionamento do plenário são defendidas por Genoino. No final de seu sexto mandato, ele entende que é necessário reformar o regimento interno porque o plenário está cada vez menos atraente para os deputados. Para o petista, as sessões destinadas a votações deveriam se estender por três semanas de cada mês, de segunda a sexta-feira. Na quarta semana, os parlamentares se dedicariam a ouvir as demandas de seus eleitores nos estados. Hoje, as sessões deliberativas são realizadas de terça a quinta-feira.
Segundo ele, o regimento interno da Casa trava os debates em plenário ao permitir sucessivas manobras protelatórias e a discussão dos mais diversos assuntos ao mesmo tempo, tornando o trabalho muitas vezes pouco produtivo. “Você fica nas preliminares e não vai aos ‘finalmentes’, ao mérito, à discussão e à votação. O plenário não pode ser uma assembleia em que a pessoa vai lá, levanta o braço e aperta o botão. Já vivi momentos de grandes debates no plenário. Era mais vigoroso”, considera.
Para Jutahy Junior, mudar o rito do plenário não vai aumentar a assiduidade dos parlamentares. Na visão dele, a falta de compromisso de muitos deputados com a atividade parlamentar é conseqüência de uma lógica perversa. “A atividade parlamentar está totalmente dissociada da atividade eleitoral. Pouca gente vota em alguém atualmente pela atividade parlamentar. A estrutura de campanha hoje tem muito mais peso do que a atividade parlamentar”, avalia Jutahy, reeleito para o sétimo mandato na Câmara.
Chico Alencar também não vê necessidade de reformar o regimento interno para tornar o plenário mais produtivo. Para ele, é necessário reformar o comportamento dos parlamentares. “Basta cumprir os ritos e derrubar os mitos. Chega de ‘cardeais’ opinantes e ‘baixo clero’ calado. Isso depende de cada um de nós, sem exceção”, diz.
Para o deputado, o plenário precisa cumprir os horários regimentais e os parlamentares só devem obstruir as votações em casos extremos. “Não privilegiar ‘cabeças coroadas’ com tempo ilimitado, como tantas vezes acontece, impedir que alguns ganhem no grito, por ‘antiguidade’, o direito à palavra. Os líderes devem ser líderes de verdade, autenticamente democráticos”, afirma o deputado, que liderou a bancada do Psol em 2008.
“Ditadura dos líderes”
O papel dos líderes partidários no plenário também é questionado por Jofran Frejat. Candidato a vice-governador do DF na chapa de Weslian Roriz (PSC) no ano passado, Jofran avalia que há uma espécie de “ditadura dos líderes”, que inibe a participação de outros parlamentares.
“Quando a liderança decide, você restringe o debate a alguns. Entre projetos de lei e medidas provisórias, eles pedem adiamento, para votar artigo por artigo, e a gente fica até tarde sem decidir. Isso influencia a imagem negativa da Casa. A população quer resultado, e acaba achando que nosso trabalho não é produtivo”, critica o petebista. Para ele, estar sempre em plenário não é mais que obrigação de um parlamentar.
Assim como Jofran, Miro Teixeira também critica o poder assumido pelas lideranças partidárias nos últimos anos. O pedetista afirma que o colégio de líderes, integrado pelos representantes dos partidos, tem tentado muitas vezes substituir o plenário, buscando acordos de mérito em matérias polêmicas. Mas, para ele, o plenário tem dado resposta, votando muitas vezes em sentido contrário ao pretendido pelos líderes.
“No projeto dos bingos, por exemplo, os líderes combinaram a aprovação da proposta, e o projeto foi rejeitado de maneira exuberante no plenário. Quando a matéria traz repercussão pública, não adianta a decisão dos líderes não corresponder ao que o plenário deseja”, avalia o deputado, o segundo parlamentar com maior número de mandatos na Casa. Mais do que ele, apenas o Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), reeleito para o décimo-primeiro mandato consecutivo.
Ex-líder do PSDB na Câmara, Jutahy Junior não acredita que a força das lideranças esteja comprometendo o trabalho dos deputados. Na opinião dele, o Parlamento precisa debater com mais profundidade e conhecimento de causa os grandes assuntos que afetam o país. “A chance de você debater um tema no plenário é muito rara, porque você tem muito pouco tempo para expor. Tem dois oradores para discutir a matéria, cada um não tem mais que três minutos. É telegráfico”, diz.
Para elaborar a lista dos 32 mais assíduos, o Congresso em Foco levou em consideração os parlamentares que participaram do maior número possível de sessões deliberativas em toda a legislatura.
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