A portaria emitida pelo Ministério da Justiça estabelecendo normas para reforçar o uso de câmeras corporais nas forças policiais enfrenta resistência por parte da Frente Parlamentar da Segurança Pública, conhecida como bancada da bala. Menos de uma semana após a edição da norma, quatro projetos de decretos legislativos (PDLs) tramitam na Câmara dos Deputados tentando sustar seus efeitos.
A diretriz do governo, editada na terça-feira (28), prevê uma série de situações em que a ativação das câmeras corporais é exigida de policiais, incluindo escolta de presos, patrulhamento ostensivo e intervenções em presídios. Os efeitos da norma são obrigatórios para membros das forças de segurança da União, como a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a Força Nacional de Segurança, mas não nos estados. Para as forças estaduais, as diretrizes são voluntárias, mas seu cumprimento permite que o estado receba recursos a mais do Fundo Nacional de Segurança Pública.
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Apesar da adoção das câmeras ser defendida por especialistas em segurança pública como instrumento de garantia do cumprimento dos protocolos por parte de agentes e de coleta de provas caso esses sejam agredidos, a medida sempre enfrentou resistência não apenas de parlamentares da bancada da bala, mas também de aliados do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que desde o início do mandato busca tornar o acionamento opcional por parte dos policiais.
As normas do governo federal sobre as câmeras corporais foram publicadas menos de uma semana depois de a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo emitir um edital de compra de mais de 12 mil câmeras, com a condição de que essas possam ser desativadas pelos próprios agentes. A disputa entre o Ministério da Justiça e o governo paulista sobre a obrigatoriedade das câmeras se expressa nos PDLs apresentados pela bancada da bala, formada em sua maioria por aliados de Tarcísio de Freitas.
Dois dos projetos de decreto legislativo partiram do deputado Alberto Fraga (PL-DF), presidente tanto da bancada da bala quanto da Comissão de Segurança Pública: um tenta sustar diretamente a portaria do Ministério da Justiça, e outro busca revogar a nota técnica que a originou. Nos dois documentos, ele afirma não questionar o mérito das diretrizes federais, mas alega que elas violam o pacto federativo.
“Não se entende que a Lei nº 13.675, de 11 de junho de 2018, que disciplina o sistema de segurança pública, autorize o tratamento da forma apresentada, ou seja, por meio de portaria. Com efeito, os estados detêm total autonomia para adoção ou não de programa de câmeras corporais, com ou sem recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública”, argumentou o parlamentar, referindo-se à portaria como “mera carta de intenções”.
O deputado Sanderson (PL-RS), autor de outro projeto de decreto legislativo contra a portaria, alega que, ao utilizar repasses do Fundo Nacional de Segurança Pública como incentivo financeiro para que estados adotem as câmeras corporais, o governo “notoriamente afronta tanto a separação dos poderes ao intervir em outro ente federativo” quanto invade uma competência regulatória do Legislativo.
A adoção de câmeras corporais é defendida por entidades da sociedade civil que acompanham a atividade de forças policiais. Em nota, a diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, chama atenção para os resultados observados no próprio estado de São Paulo, quando os aparelhos foram adotados em uniformes e viaturas em 2021, na gestão de João Doria.
“Nos dois primeiros anos de implementação do programa verificou-se redução da subnotificação dos casos de violência doméstica, queda nas denúncias contra policiais registradas na Ouvidoria de Polícia, redução expressiva das mortes decorrentes de intervenção policial e os menores números de policiais assassinados da história”, registrou a diretora.
O Instituto Sou da Paz também se pronunciou em defesa da portaria do Ministério da Justiça, considerando-a “um avanço importante a criação de uma orientação federal que que possa subsidiar os diferentes estados brasileiros na implementação do programa de câmeras para que se tenha requisitos mínimos a serem seguidos”. Por outro lado, a instituição defende a criação de mecanismos que condicionem os repasses do Fundo Nacional de Segurança Pública ao cumprimento estadual das diretrizes, aumentando assim a força da diretriz.
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