A votação do Projeto de Lei 2401/19, de autoria do governo Bolsonaro, que autoriza a educação domiciliar no Brasil (homeschooling) acendeu o sinal de alerta entre educadores de todo o país. A presidente do Conselho de Educação Nacional (CNE), Maria Helena Guimarães de Castro, é uma das vozes importantes contra o projeto. A pauta teve aprovada sua urgência em sessão da Câmara nesta quarta-feira (28). “Quem terá acesso ao homeschooling são as famílias com as melhores condições sociais e financeiras. Os mais vulneráveis não têm a menor condição. E outra, nada substitui a escola”.
Em entrevista ao Congresso em Foco, ela defendeu que essa não é uma prioridade que deveria estar sendo discutida no país neste momento. “Nós temos problemas estruturais graves, sobretudo agora no pós-pandemia, com o aumento das desigualdades educacionais”, defendeu, ao citar como exemplo ações que poderiam ser feitas pelo governo, como a concessão de bolsas de estudos para crianças que perderam o vínculo com as escolas durante a pandemia e que não puderam retornar às instituições de ensino.
“A escola é um espaço de convivência social, interação muito importante para os alunos. O uso das tecnologias deve ser complementar às atividades presenciais. Eu considero o homeschooling, neste momento, uma política desnecessária para a política educacional brasileira”, completou Maria Helena. O CNE, órgão que ela preside, é o responsável pela formulação e avaliação da política educacional no país. Ele é vinculado ao Ministério da Educação (MEC). A crítica ao homeschooling, no entanto, é uma posição pessoal da educadora, e não do órgão. Por lá, há conselheiros que defendem essa modalidade de ensino.
Para Maria Helena, o homeschooling priva crianças e adolescentes de outras opiniões, sejam políticas, sociais e até mesmo suas visões de mundo. Ou seja, impede a educação com a pluralidade de ideias. “Em geral, são famílias [que adotam o homeschooling em outros países] que seguem muitas convicções religiosas, que não querem que os filhos tenham contato com outras crianças que têm outras orientações políticas-partidárias, ou até algumas famílias negacionistas, que negam que a terra é redonda, defendem que a terra é plana. São pensamentos que não estarão na escola”.
Homeschooling “implode” o papel da escola no Brasil
O Congresso em Foco também conversou com a educadora Maria Inês Fini, que, ao lado de Maria Helena, é uma das maiores referências em políticas públicas para educação no país. Maria Inês foi presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), na gestão do presidente Michel Temer (MDB), e defende que este projeto do Executivo “implode”o papel da escola no Brasil.
“Essa é a cereja do bolo da maldade que ele [Bolsonaro] está colocando desde que entrou. Sinceramente, ele estrói a escola e aumenta o abismo sócio-econômico que nós temos. É a desculpa que ele tem para parar de investir na educação, já que a família poderá educar, ele dará dinheiro para a família. Isso desestrutura o papel do Estado na educação básica. É um verdadeiro absurdo”, destacou Maria Inês.
“A educação formal é regida por leis e por métodos. Vamos supor que essa criança estude em casa com pais super capacitados. Mas ele ainda vai ter que educar os filhos dentro de critérios da educação formal. É um absurdo. Aprovar uma lei dessas é acabar com a escola brasileira. É o que estão fazendo lá no MEC”, completou.
Segundo ela, o homeschooling é contra toda a legislação educacional existente no Brasil. “É contra a Constituição, contra a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e um assassinato da educação das crianças e jovens. Eles precisam da escola para se desenvolver”, disse. “[Os estudantes] Eles precisam de regulamento, de convívio com colegas. Então, por mais letrada que seja uma família, ela não supre o papel de uma escola. Um dos direitos mais fundamentais das crianças e jovens”.
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