De tudo o que foi revelado sobre a caixinha do PSC, nas reportagens publicadas pelo Congresso em Foco pelo bravo repórter Eduardo Militão, o mais impressionante é a entrevista do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), publicada na semana passada, em que ele declara achar “normal” a prática do partido de exigir que todos os seus funcionários – em todos os níveis, em todos os cargos espalhados pelo país – paguem 5% de contribuição.
Leia a entrevista de Marco Maia a Eduardo Militão no Congresso em Foco
Na última sexta-feira (9), a entrevista de Marco Maia ganhou um generoso espaço no Jornal da Cultura, o interessante noticioso da TV Cultura de São Paulo. Apresentado por Maria Cristina Poli, o jornal tem sempre dois debatedores, que comentam com Maria Cristina as notícias apresentadas por ela. Na sexta-feira, estava presente o cientista político Carlos Novaes. E ele foi preciso na avaliação da entrevista de Marco Maia e na falta de maiores consequências no Congresso até agora para a importante denúncia feita por Eduardo Militão.
Verificou-se que não se trata de uma contribuição, de uma colaboração voluntária. Nem de algo cobrado apenas dos filiados, como é feito por outros partidos. Trata-se de algo compulsório. O jornalista Humberto Azevedo, ao se recusar a pagar os 5% de seu salário, acabou demitido do gabinete de Zequinha Marinho. E não é mesmo só em Brasília que acontece. Três deputados estaduais de São Paulo acabaram expulsos do PSC porque se recusavam a cobrar de seus funcionários a caixinha. Eles mostraram ao Congresso em Foco que tinham, quando se candidatavam, que assinar um termo de compromisso, no qual diziam estar cientes que tinham de arrancar um percentual do vencimento de seus funcionários para o partido.
Políticos que misturam o público e o privado, que não têm noção da diferença entre as duas coisas, sempre existiram. Mas quando essa confusão acontece com o próprio presidente da Câmara, ela ganha graves contornos institucionais.
É isso o que pontua Carlos Novaes no Jornal da Cultura. “O mais escandaloso é a naturalidade dele”, comenta o cientista político sobre a fala de Marco Maia. “Ele realmente acredita nisso [que é algo banal um partido político obrigar seus funcionários a pagar 5% de caixinha]”, continua. E fulmina, então: “Ele acha que o partido é dono de uma fatia do Estado”.
Eis o ponto. E dele até já falamos aqui outras vezes. Desde a sua formação, desde as capitanias hereditárias, estabeleceu-se que a administração do Brasil se daria literalmente por um loteamento do país. Quinhentos anos depois, o pensamento da elite política brasileira não mudou. É por conta desse processo que os partidos, por exemplo, exigem em troca, quando apoiam um governo, “um ministério de porteira fechada”. A expressão não poderia ser mais precisa: o partido está em busca de uma fazenda, de uma propriedade, e não exatamente de uma pasta na qual possa exercitar na prática seus conceitos de políticas públicas.
São donos dos espaços que ocupam e do dinheiro público destinado à sua manutenção. Assim, não é feio usar carro oficial para fazer compras, não é feio pagar tapioca com cartão corporativo, não é feito trocar milhas de passagens usadas em serviço. E não é feio pegar parte do salário dos funcionários que contrata para financiar seu partido. Ou pior: para botar no bolso.
Há um trecho da entrevista de Marco Maia que não foi reproduzido no noticiário do Jornal da Cultura. “Por que tu insistes tanto nessa matéria?”, pergunta Marco Maia a Eduardo Militão, como se o repórter do Congresso em Foco estivesse sendo impertinente. “Sabe por que nenhum partido fez isso até agora? Nenhuma representação?”, pergunta o presidente da Câmara. “Porque todos têm a fonte de contribuição”, conclui. Ou seja, segundo o presidente da Câmara, todos de alguma forma se apropriam do dinheiro público. Como, de fato, até agora ninguém fez nada, o que disse Marco Maia deve mesmo ser verdade.
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