O livro “Os Engenheiros do Caos”, do cientista social e conselheiro político do ex-primeiro-ministro da Itália Matteo Renzi, Giuliano Da Empoli, se transformou num best-seller global. Todos deveriam ler. Da Empoli narra como a manipulação dos algoritmos das plataformas digitais se tornou uma poderosa arma política no mundo contemporâneo.
Líderes populistas iliberais desenvolveram um sofisticado método para transformar defeitos em qualidades, fake news em liberdade de opinião e “verdades alternativas”. E com isso, mobilizar as respectivas “bolhas” sem compromisso com a verdade, a ciência e a realidade. O livro reconstrói a história desde a ascensão súbita e surpreendente do comediante Beppe Grillo e seu Movimento 5 Estrelas na Itália, em 2014, com o apoio de empresa especializada em redes digitais, até o escândalo da Cambridge Analytica e a manipulação dos algoritmos nas experiências vitoriosas de Boris Johnson no Brexit do Reino Unido e de Donald Trump em 2016, se disseminando pelo mundo, a parti daí. Atores como Steve Bannon, ex-estrategista-chefe da Casa Branca e conselheiro sênior do presidente Trump, já estavam presentes na Itália em 2014.
Os graves eventos de 8 de janeiro no Brasil, que afrontaram as instituições republicanas e democráticas, a recente onda de massacres em escolas, a automutilação induzida de jovens, a disseminação do neonazismo e abusos de poder e o papel destacado em todos esses eventos das plataformas digitais, colocaram na ordem do dia a sua regulação pública.
Diante disto, o Congresso Nacional resolveu tomar as rédeas do assunto através da discussão do PL 2630/2020, de autoria do senador Alessandro Vieira (PSDB/SE), relatado na Câmara dos Deputados pelo deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), que tem promovido amplo debate com todas as bancadas e, bem assessorado, evitado “reinventar a roda”, inspirando-se no que há de melhor e mais avançado no mundo com base nas experiências da Europa, Austrália e EUA. Nunca gostei do expediente da urgência, onde o projeto de lei vai direto ao Plenário. O melhor caminho, dada a urgência do tema e para evitar manobras protelatórias, seria formar uma Comissão Especial. O impasse levou ao adiamento da votação esta semana.
O apelido ganho já induz ao equívoco pois não se trata de um “PL das Fake News”, mas sim, de regulação das plataformas digitais. O substitutivo proposto se baseia no tripé liberdade, responsabilidade e transparência. Cuida da responsabilização das plataformas por danos, das notificações pela moderação de conteúdo, da identificação da publicidade, estabelece regras de transparência, caracteriza o que são temas previamente proibidos por agredirem a ordem constitucional, prevê remuneração de conteúdo jornalístico, defende o direito autoral, estabelece o consentimento do usuário para sua inclusão em grupos e listas de transmissão, entre outros importantes avanços.
Remanescem aspectos polêmicos como qual órgão público irá regular (Ministério Público, Poder Executivo, ANATEL) e a figura da “imunidade parlamentar”, possibilitando os detentores de mandato produzirem “fake news”.
Mas as divergências sobreviventes não devem impedir a aprovação da lei, devem ser resolvidas. A democracia está em jogo e a regulação das plataformas digitais se tornou uma necessidade urgente e inevitável.
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