Nos jogos de ida e volta da Libertadores da América, quem joga por último tem vantagem. Vai aqui mais uma contribuição para o conjunto de metáforas futebolísticas ditas nos dois últimos dias durante os depoimentos dos governadores de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), e do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), à CPI do Cachoeira.
Agnelo e seus assessores assistiram ao depoimento de Marconi, viram que ele se negara a quebrar seus sigilos bancário, telefônico e fiscal e já chegou abrindo mão dos seus. Uma firula, disseram mais tarde seus adversários: o ministro do STJ Asfor Rocha já tinha determinado a quebra do seu sigilo na justiça; os dados já iam mesmo acabar aparecendo. Não, responderam os aliados de Agnelo: o sigilo foi quebrado por conta de outra investigação, não poderia ser compartilhado com a CPI. Mas, como a gente vem dizendo, essa é a CPI do carro desembestado ladeira abaixo. É nítido o esforço de todos para que nada aconteça. Mesmo assim, a CPI vai caminhando aos trancos e barrancos, à revelia do que seus integrantes gostariam. Não queriam a convocação dos governadores Perillo e Agnelo: eles acabaram convocados. Não se queria a quebra dos seus sigilos: eles acabaram quebrados.
Agora, os governadores imaginam que seus gestos demonstrem que não têm envolvimento com o esquema comandado pelo bicheiro Carlinhos Cachoeira. Como tudo o que se refere a essa CPI, recomenda-se prudência quanto a essa hipótese, porque o carro empurrado ladeira abaixo continua descendo, sabe-se lá até quando e sabe-se lá para onde.
Porque o fato é que há uma diferença entre a impressão primeira dos depoimentos dos governadores e as possibilidades de avanço nas investigações. Em princípio, no geral, tanto Marconi quanto Agnelo mostraram-se firmes e passaram a impressão de que eram capazes de responder às suspeitas levantadas contra eles. No particular, porém, ambos deixaram pontas que podem gerar novos constrangimentos contra eles dependendo de como se desenvolva a investigação. Em comum, por exemplo, ambos têm dificuldades para explicar as circunstâncias da compra e venda de suas casas. Marconi enrola-se para explicar como sua casa foi vendida, Agnelo enrola-se para explicar como sua casa foi comprada. Há as ações do esquema para entrar nos governos: até onde conseguiram, o papel de assessores de confiança dos governos, etc. Os governadores não encerram as investigações sobre eles.
Mas, voltando ao futebol inicial, o que incomoda é a forma como tudo vai se desenvolvendo na CPI. As metáforas futebolísticas viraram lugar comum ontem (13) na CPI porque foi mesmo numa espécie de jogo de futebol político que o PT e o PSDB transformaram os depoimentos. Em demonstrações até meio patéticas e constrangedoras, os dois governadores pareciam que tinham decretado feriado em seus palácios de governo para lotar o Congresso com suas respectivas claques. Na terça-feira (12) e ontem (13), foi necessário separar as salas contíguas à da CPI no corredor das comissões para abrigar as torcidas tucana e petista. Faixas foram pregadas nas paredes, palavras de ordem foram cantadas.
Para complicar ainda mais a coisa, os próprios integrantes dos dois partidos na CPI subiram nas arquibancadas para fazer o papel de torcedores. Marconi terminou seu depoimento e lá estavam os parlamentares tucanos a aplaudi-lo efusivamente. Agnelo terminou seu depoimento e lá estavam a postos os entusiásticos aplausos dos parlamentares petistas. Essa será a postura mais recomendável para um inquiridor?
Como observou o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), os depoimentos pareciam uma antecipação do horário eleitoral gratuito. No primeiro dia, os tucanos esforçaram-se para apresentar Marconi como o inventor do Prouni, como aquele que sugeriu ao ex-presidente Lula a criação do Bolsa-Família, etc. Ontem, eram os petistas a fazer força para mostrar Agnelo como o melhor ministro dos Esportes de todos os tempos, etc.
E assim, gastam-se horas de CPI na repetição dessas loas, desses elogios. As claques se dizem convencidas, afirmam que tudo está esclarecido. Nada está esclarecido. Era o que mostravam os olhos desolados do senador Pedro Simon (PMDB-RS), do alto dos seus 82 anos de idade. Ao final da CPI do Orçamento, Simon propunha uma nova CPI para apurar a ação dos corruptores. Nada foi feito. Vinte anos depois, desvenda-se um esquema no qual um contraventor e uma das maiores empreiteiras do país associam-se para tentar corromper governos. O tempo passa, e Simon observa que vai sendo desperdiçada a oportunidade de investigar de fato como se dá a ação dos corruptores. Prefere-se a guerra de torcidas. Só faltaram as claques tucanas e petistas organizarem a “ola” para homenagear seus respectivos governadores.
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