Apesar de muitos discursos e pronunciamentos frívolos, tanto no Senado como na Câmara dos Deputados, e de tantos parlamentares sendo investigados por corrupção, em ambas as Casas, e apesar de os frívolos e os corruptos estarem no momento governando o Brasil, vou escrever sobre a demanda entre a Philip Morris e a República Oriental do Uruguai.
A Philip Morris Marca Sarl (Suíça), Philip Morris Products S/A (Suíça) e Abal Hermanos S/A (Uruguai) demandaram “judicialmente” contra o Uruguai. O “judicialmente” vai entre aspas porque a demanda foi feita em um “tribunal” privado.
A indústria tabagista demandou judicialmente o nosso vizinho em busca de reparações financeiras, sob a alegação de ter sofrido prejuízos com a aprovação de leis e outras normas uruguaias sobre a publicidade e o consumo de cigarros. Leis que foram elogiadas pela Organização Mundial da Saúde e por várias lideranças e instituições internacionais.
A ação “judicial” começou em fevereiro de 2010 e a sentença foi emitida no inicio deste mês de julho. Para entrar com a ação, a Philip Morris usou como parâmetro um acordo de investimentos assinado entre o Uruguai e a Suíça. Alegava a violação de tal acordo.
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Em 2004, o Uruguai aprovou a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco. No ano seguinte, Tabaré Vázquez, médico, oncologista e naquele momento ocupando a Presidência da República Oriental do Uruguai, então em seu primeiro governo, inicia uma política de defesa da saúde pública e de combate ao tabagismo.
Tomou decisões legais e políticas tais como a obrigatoriedade de difundir fotos de advertência sobre os riscos do cigarro. As imagens deveriam ocupar 80% dos maços de cigarro. Também amentou os impostos, proibiu a propaganda de cigarros nos meios de comunicação e também o patrocínio de eventos.
PublicidadeProibiu ainda fumar em locais públicos, bares, restaurantes, ou seja, só pode fumar em locais abertos ou na própria residência.
O Uruguai foi o primeiro país da América Latina a proibir fumar em locais fechados. Essa politica levou a Organização Mundial da Saúde, em 2006, a premiar Tabaré Vázquez por sua defesa a saúde pública e contra o tabagismo.
A Philip Morris alegava que as leis e normas do governo uruguaio afetava os interesses econômicos e comerciais da empresa, causando-lhe prejuízos.
Ela demandou o Uruguai principalmente por duas razões: a obrigatoriedade de tirar do mercado sete de seus 12 produtos e a obrigação de que 80% da superfície do maço de cigarro fosse ocupada por mensagens de advertência ao risco à saúde. Pedia uma reparação no valor de 25 milhões de dólares.
A Philip Morris é uma das principais produtoras de tabaco no mundo, e iniciou a demanda judicial junto ao Centro Internacional de Regras de Diferenças Relativas a Investimento Ciadi, do Banco Mundial. Este “tribunal” tem sede em Washington e tem como objetivo dar segurança jurídica aos investidores internacionais. Observo: aos investidores, e não aos Estados.
Durante uma das fases de instrução, em novembro de 2010, ocorreu a IV Conferência das Partes sobre o Acordo-Quatro da OMS. Tabaré Vázquez, nesta ocasião, declarou que a Philip Morris está “interesada en darle un escarmiento a Uruguay e intimidar a otros países que sigan su rumbo. Philip Morris no ahorrará recursos para lograr su objetivo. Tiene mucho dinero y el dinero tiene mucho poder, el de la frivolidad y la corrupción”.
No dia 8 de julho passado o Ciadi decidiu em favor do Uruguai, e obrigou a Philip Morris a pagar todos os gastos dos demandados do tribunal. Mesmo em um “tribunal” privado, foi uma importante vitória da saúde pública e sobreposição da vida sobre o capital.
Mesmo com todo o dinheiro “y el dinero tiene mucho poder, el de la frivolidad y la corrupción”, como disse Vázquez, desta vez venceu a razão humanitária.
Importante dizer aos que ocupam o poder no Brasil que a razão também vencerá a frivolidade e a corrupção.
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