A pandemia tumultuou as redações dos jornais em virtude da morte prematura de personalidades, cujos obituários não estavam devidamente atualizados. Os focas recebem missões para pesquisarem, rapidamente, as biografias dos falecidos; de onde eram? Como viviam? O que faziam?
As informações sobre o falecimento de algum personagem, além de divulgadas imediatamente, recebem comentários que enchem as páginas das redes sociais para, em seguida, serem anunciadas nos jornais televisivos. Neste momento, o ilustre desconhecido passa a ser famosíssimo; se músico, as rádios reproduzem seus trabalhos; se artista, imagens da infância surgem do nada, e assim segue a vida e a morte.
Aqui em Brasília, conheço um caso singular de um pioneiro idoso, mas vivíssimo, que sofreu um acidente caseiro que o levou, por meses, a temporadas em hospitais. Refiro-me ao arquiteto Carlos Magalhães da Silveira, que marca a sua história como rigoroso defensor do plano arquitetônico de Brasília.
Leia também
Magalhães ficou firme. Sofrera um pequeno e comum acidente caseiro, levando-o ao chão, onde nunca estivera, mesmo quando domava cavalos chucros em sua fazenda na Bahia. Aos poderes constituídos não dobra nem os joelhos. Para ele, todo mundo é igual.
Jornalistas buscavam pioneiros, amigos e familiares para manterem o obituário preciso e fidedigno. A cada intervenção médica eram publicadas notas sobre o estado de saúde do candidato a defunto.
Paciente e impaciente, o arquiteto passou por cinco procedimentos médicos para corrigir fratura na asa esquerda. Pegou infecção hospitalar, trocou de hospital, curou-se da fratura e da infecção. Próximo à alta, quase recuperado, pegou covid; voltou para UTI, e ainda submetido a todos dolorosos procedimentos. Mesmo com o obituário no forno, pronto para ser divulgado, o bravo pioneiro sobreviveu e teve alta.
PublicidadeNesta semana, me ligou. Voz encoberta pela máscara e pelas sequelas ainda sob tratamento. Foi dizendo: “E aí, o que há de novo?” Fiquei feliz em ouvi-lo. Sobre o tratamento, do seu jeito objetivo, disse que teve alta, estava em casa atendido em home care, e só! Como nada perguntei, Magalhães falou-me do futuro, da volta à fazenda, do mergulho no seu pedaço de oceano, dos pratos de frutos do mar, das cervejas e vinhos, dos cocos frescos, e da alegria em viver.
O obituário foi para o arquivo vivo. Magalhães ainda tem muito o que fazer e contar.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Deixe um comentário