O prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom (PP), demitiu o jornalista que fez uma pergunta que incomodou o presidente Jair Bolsonaro na última quarta-feira durante uma coletiva feita em sua passagem pelo Acre. Na última quarta-feira, João Renato Jácome questionou Bolsonaro qual era sua posição em relação à decisão tomada na véspera pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) de anular a quebra dos sigilos bancário e fiscal do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), seu filho mais velho, no caso da “rachadinha”. O presidente não gostou da pergunta e encerrou a entrevista abruptamente, sem responder. “Acabou a entrevista”, anunciou.
No mesmo dia, o prefeito, que é aliado de Bolsonaro, exonerou João Renato do cargo de chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Meio Ambiente. O jornalista afirma que estava de folga no dia, em função de decreto que estabeleceu rodízio na prefeitura por causa da pandemia e por ter trabalhado, mesmo assim, dez dias consecutivos, e atuava como freelancer (sem vínculo empregatício) do jornal O Estado de S. Paulo e do site local Notícias da Hora. Em entrevista ao Congresso em Foco, o repórter conta que, desde ter feito a pergunta que contrariou o presidente, tem recebido ameaças. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) divulgou nota nesta sexta-feira condenando a decisão do prefeito e pedindo sua reintegração ao cargo.
“Fui pego de surpresa. Eu fiz o trabalho no meu dia de folga. Não fiz uma pergunta ofensiva ao presidente. Acho que ele pode ter entendido errado. Não tive a intenção de constrangê-lo”, disse João Renato. “Minha família está abalada. Recebi mensagens pelas redes sociais de que eu devia morrer, de que devia levar porrada, de que eu era comunista e um desgraçado. Minha vida ficou de cabeça pra baixo”, relatou.O prefeito de Rio Branco disse ao Congresso em Foco que a exoneração de João Renato não tem relação com a pergunta feita por ele ao presidente. “Eu o demiti porque ele estava em horário de serviço, trabalhando para o jornal Estadão. Como comissionado ele não poderia fazer isso”, afirmou Tião Bocalom. “Ele diz que estava de folga, folga de quê? Não tem folga, não”, completou. Segundo ele, sua decisão não pode ser interpretada como um ato de censura ou revanchismo. O prefeito foi apoiado por Bolsonaro na eleição municipal.
O jornalista conta que ficou sabendo pela imprensa de sua exoneração, confirmada na edição do Diário Oficial do município nesta sexta-feira (26). A decisão é retroativa à quarta-feira, dia da entrevista. Sem saber de que estava demitido, João Renato trabalhou normalmente nessa quinta. “Não quero crescer em cima desse episódio. Só quero trabalhar, pagar minhas contas, seguir com a profissão que escolhi e para a qual me formei, sem ser perseguido por ninguém”, afirma.
A Fenaj e o Sindicato dos Jornalistas do Acre classificou a exoneração de João Renato como censura e ato covarde. “Com este violento ataque ao jornalismo, o prefeito Tião Bocalom afronta a liberdade de imprensa e o direito de acesso à informação garantidos pela Constituição. As direções da Fenaj e do Sinjac exigem a anulação do ato e a reintegração imediata do profissional aos quadros da Secretaria Municipal de Meio Ambiente”, diz trecho da nota assinada pelas duas entidades. Veja a íntegra da nota:
“NOTA DE REPUDIO
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Acre (Sinjac), por meio de seu representante, o presidente Victor Augusto Nogueira de Farias, vêm a público repudiar a atitude covarde e a prática de censura do prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom, que deveria defender e garantir direitos conquistados pela sociedade.
A Fenaj e o Sinjac manifestam repúdio contra a demissão do jornalista João Renato Jácome de Andrade, publicada na edição do Diário Oficial do Acre desta sexta-feira (26), por ter exercido o dever de questionar fatos durante coletiva de imprensa do presidente Jair Bolsonaro.
Com este violento ataque ao jornalismo, o prefeito Tião Bocalom afronta a liberdade de imprensa e o direito de acesso à informação garantidos pela Constituição.
As direções da Fenaj e do Sinjac exigem a anulação do ato e a reintegração imediata do profissional aos quadros da Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
Fenaj e Sinjac”
Bolsonaro sugere fechar jornais em novo ataque à liberdade de imprensa