O Ministério Público Federal (MPF) divulgou nota pública reiterando sua oposição à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, conhecida como PEC das Praias. Essa proposta tem como objetivo transferir os terrenos de marinha – áreas da União situadas no litoral – para estados, municípios e particulares. No documento, a Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR) alerta que a aprovação dessa emenda pode acarretar sérios impactos socioambientais.
Veja a íntegra da nota técnica do MPF
A proposta estava na pauta de discussão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado nessa quarta-feira (4). Sua votação foi adiada após pedido de vista (mais tempo para análise) apresentado por vários senadores contrários à proposta. Não está definido quando será votado o parecer do relator Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
De acordo com o MPF, a emenda pode facilitar a privatização das praias, permitindo que empresas de diversos setores, como resorts e hotéis, adquiram controle sobre essas áreas. Isso resultaria em cercamento dos terrenos, que não estariam mais sob a supervisão da União, excluindo a população que não pode arcar com os custos de acesso às zonas mais valorizadas e comprometendo, assim, o uso coletivo desses espaços.
O MPF também enfatiza que a proposta infringe direitos e garantias individuais de muitos brasileiros ao restringir o uso compartilhado das praias, em violação à cláusula pétrea da Constituição que protege esses direitos. O documento ressalta que todos têm garantido pela Constituição o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
“A Constituição estabelece que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, destaca trecho do documento.
Prejuízos
O MPF destaca que a legislação determina que os terrenos de marinha devem seguir os parâmetros de proteção ambiental, permitindo que a União retome a titularidade plena caso o uso proposto possa causar danos ao meio ambiente. O órgão aponta que muitos desses riscos não são adequadamente avaliados nos licenciamentos realizados por estados e municípios, que frequentemente estão sob pressão significativa para aprovar empreendimentos que visam ao desenvolvimento econômico, mas que não asseguram a necessária sustentabilidade socioambiental.
A nota ainda ressalta que a urbanização descontrolada pode impactar negativamente a qualidade ambiental e a saúde da população. O MPF argumenta que a proposta ignora as diversas comunidades que habitam as áreas costeiras e o papel que desempenham na preservação estratégica e funcional da paisagem. Além disso, ao eliminar a faixa de segurança, a medida desconsidera a ocorrência iminente de eventos climáticos extremos e o aumento dos riscos de erosão e inundação nas regiões litorâneas, consequência da expansão da ocupação costeira.
Por fim, o MPF argumenta que a PEC restringe a capacidade da União de reservar áreas para novos projetos vinculados à nova matriz energética, como as energias eólicas, entre outras. O órgão enfatiza que a implementação de projetos ambientalmente sustentáveis na zona costeira estaria em risco, já que o acesso a produtos, mercadorias e insumos precisaria ocorrer por meio de propriedades privadas, o que poderia levar o país a desapropriar essas áreas estratégicas essenciais para a nova matriz energética.
Esta é a segunda vez que o MPF se manifesta contrariamente à PEC das Praias. O primeiro comunicado foi divulgado em setembro.
A PEC das Praias em cinco pontos: uma discussão complexa e urgente