Pela primeira vez, após vir à tona a publicação de imagens de propagandas nazistas e de um crachá da “milícia bolsonarista”, a promotora do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) Marya Olímpia Ribeiro Pacheco se pronunciou sobre os posts feitos em sua conta do Facebook e revelados pelo Congresso em Foco no último dia 22. Na ocasião, a reportagem a procurou, mas ela preferiu não se manifestar.
Em nota enviada ao site, a promotora nega que tenha feito apologia ao nazismo. Segundo ela, as imagens compartilhadas “em um único dia de 2016” faziam uma comparação entre as propagandas dos regimes nazista e stalinista, aos quais se refere como “ditaduras abomináveis”. Para reforçar sua justificativa, Marya Olímpia alega que foi casada com um descendente de judeus.
“As tradições e heranças culturais hebraicas sempre foram profundamente respeitadas pela promotora, como se é de esperar em matrimônios multiculturais”, diz a nota assinada por Marya Olímpia. “Registra a promotora, em especial, que suas filhas possuem sangue judeu e ostentam, com orgulho, nomes hebreus de batismo, que carregarão consigo, por toda a vida, como símbolo de sobrevivência de um povo desumanamente oprimido por diásporas, perseguições e sanguinariamente atacado no Holocausto pelo regime nazista.”
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A nota, entretanto, não trata sobre a postagem na qual a promotora exige no peito um crachá pelo qual se identifica como membro da “milícia digital bolsonarista”. Na imagem aparece o nome da promotora, bem como uma foto sua junto a uma do presidente Jair Bolsonaro.
Marya Olímpia integra o MP Pró-Sociedade, ala do Ministério Público profundamente identificada com o ideário do bolsonarismo. Membros do grupo chegaram a recorrer à Justiça com o objetivo de obrigar o SUS a distribuir cloroquina para combater a covid-19, apesar das evidências de sua ineficácia.
A promotora não esconde o seu alinhamento ideológico com a extrema-direita e suas pautas nas suas redes. Ex-aluna de Olavo de Carvalho, Marya tece elogios ao “ideólogo” bolsonarista, a quem visitou com sua família. Em troca de mensagens com Ruth Kicis, irmã da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), no Twitter, a promotora escreveu: “Ruth, toda a família do Olavo é simpaticíssima! Foram muito acolhedores. E o Olavo… esse vc já sabe, né! Único, fantástico e sempre genial. Devo esse momento a vc e a Bia.”
PublicidadeA Constituição Federal proíbe membros do Ministério Público (MP) de “exercer atividade político-partidária” (artigo 128, parágrafo 5º, inciso II, alínea e). Conforme o texto constitucional em vigor, “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
O jurista, professor de Direito Constitucional e pós-doutor em Direito Lênio Streck diz que membro do MP não tem liberdade funcional de fazer postagem de cunho político.
“ O membro do MP é guardião da cidadania, da liberdade, das garantias e não pode fazer uma postagem que vá contra a legislação e contra a Constituição. A promotora, como membro do Ministério Público, não tem a liberdade de fazer postagem de cunho político neste sentido, de milícia bolsonariana, principalmente num país polarizado. Isso não condiz com a conduta nem de um membro do MP”, esclarece Streck sobre a conduta da promotora da 10ª Vara Criminal do MPDFT.
Depois da publicação da reportagem do Congresso em Foco, o Facebook excluiu os posts com cartazes nazistas, que apareciam na rede Marya desde 2016.
No dia 23 de setembro, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) abriu processo disciplinar para apurar o comportamento da promotora nas redes sociais.
A promotora foi notificada e terá o prazo de dez dias, a contar da data da notificação, para oferecer os esclarecimentos que considerar necessários. “Após analisar a resposta da promotora, a Corregedoria Nacional do MP [vinculada ao CNMP] irá decidir que providências serão tomadas”, diz o órgão.
O CNMP tem a prerrogativa de avaliar a conduta dos integrantes do Ministério Público. As sanções podem ir de censura à demissão do cargo. Também o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios abriu uma apuração contra a promotora.
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