A juíza Ludmila Lins Grilo, que usou as redes sociais para defender aglomerações durante o Ano Novo, voltou a instigar seus seguidores a driblarem as normas de prevenção contra a covid-19. Em sua conta no Twitter, a magistrada ensinou um “truque”para andar de máscara em locais públicos sem sofrer punições.
“Passo a passo para andar sem máscara no shopping de forma legítima, sem ser admoestado e ainda posar de bondoso”, anunciou a juíza em um post. Andando em um shopping, Ludmila buscou demonstrar seu ponto com um pote com duas bolas de sorvete. “1- compre um sorvete; 2- pendure a máscara no pescoço ou na orelha, para afetar elevação moral; 3- caminhe naturalmente.”
A juíza carioca, mas que mora em Minas Gerais, é alvo de uma reclamação disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que analisa ações de membros do poder Judiciário. A reclamação disciplinar foi enviada por um advogado nesta segunda-feira (4) à corte.
A magistrada é titular da Vara Criminal e da Infância e da Juventude em Unaí, interior de Minas Gerais. No dia do réveillon, Ludmila foi à sua conta no Twitter, com 140 mil seguidores, e desejou um feliz ano novo acompanhado da hashtag “Aglomerabrasil”.
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No dia seguinte, ela postou um vídeo com o movimento de pessoas na cidade Armação dos Búzios (RJ), onde disse estar. Ludmila afirmou que o vídeo, indicando pedestres descumprindo ordens do uso de máscara e sem distanciamento social para combater a pandemia de covid-19, mostraria “uma cidade que não se entregou docilmente ao medo, histeria ou depressão.”
Um dos primeiros a se posicionar foi o procurador-regional da República Vladimir Aras, primo do procurador-geral da República, Augusto Aras. Em seu twitter, Vladimir lembrou que autoridades devem ter cuidado extra com o que dizem. “Outras pessoas sofrerão as consequências das ações alvo da instigação ou do incitação”, escreveu.
PublicidadeFalas irresponsáveis ou imaturas que instigam comportamentos antissociais ou que incitam condutas prejudiciais à coletividade não podem ser toleradas. A liberdade de expressão encontra seu limite quando a fala pretende causar ou tende a causar ações nocivas a outrem.
— Vladimir Aras 🏡 🇺🇳 (@VladimirAras) January 3, 2021
Às críticas que se seguiram nos dias seguintes, Ludmila reagiu com forte ironia. Em uma das postagens, no domingo (3), a magistrada publicou um meme com a possibilidade de suas opiniões serem reportadas ao CNJ.
A denúncia ao Conselho foi feita. Em uma peça apresentada nesta segunda-feira (4), um advogado do Mato Grosso do Sul considerou que a ação da juíza merece ser analisada pela corte disciplinar. “As pessoas que nela confiam por ser uma autoridade integrante do poder Judiciário certamente serão influenciadas por sua irresponsável e inconseqüente manifestação”, escreveu José Belga Assis Trad, autor do pedido, “que, de tão absurda, pode estar a configurar crime de apologia à infração de medida sanitária preventiva.”
O problema mais grave, segundo o advogado, é a confusão de papéis que esta fala poderia causar. “Ao se manifestar contra as recomendações das autoridades sanitárias, embora não tenha formação e não seja médica sanitarista, o público que tem acesso ao conteúdo das postagens da doutora Ludmila Lins Grilo passa a confundir a opinião, infundada, da magistrada com a da magistratura”, apontou o advogado.
Outra representação
Não é a primeira vez que Ludmila fica nos radares do CNJ. Em maio do ano passado, ela precisou explicar à corte uma imagem onde aparecia dando apoio a atos antidemocráticos, de apoio ao presidente Jair Bolsonaro.
Por conta destas atitudes, José Trad aponta que há chances de que a juíza esteja se valendo do alcance das redes sociais e de uma retórica inflamatória para alçar planos políticos. Ao Congresso em Foco, Trad disse que a ação, em relação aos quase 200 mil mortos pela pandemia, é um “comportamento insolente”.
“É a hora do Congresso aproveitar a oportunidade e discutir se é o caso de impor uma quarentena a magistrados e membros do Ministério Público que queiram se candidatar [a cargos eletivos]”, ponderou. José Trad disse não acreditar que o CNJ, instância máxima sobre a questão, aja de maneira “corporativista”, visando proteger a juíza de eventuais sanções, que poderiam ir de uma simples advertência à aposentadoria compulsória, com vencimentos.
A juíza Ludmila Grilo não foi localizada para comentar a questão – mas o espaço permanece aberto para que ela se manifeste.
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