E é Perrone quem nos ajuda a interpretar (vide íntegra aqui) as últimas evoluções, com Marin aceitando ser extraditado para os EUA, onde uma audiência judicial realizada a toque de caixa o livrou das grades, colocando-o em prisão domiciliar: “A rapidez como tudo foi feito desde a extradição, mostra um bom diálogo entre os advogados do cartola e as autoridades americanas, sem que para isso Marin se declarasse culpado de crimes ligados a corrupção. Porém, o fato de o ex-presidente da CBF se declarar inocente, não significa que ele não tenha o que contar para a Justiça. Muitas perguntas ainda vão ser feitas durante o processo”.
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Ou seja, se passou a ser tratado com brandura pelo FBI e pela Justiça estadunidense, é porque Marin fechou um acordo de delação premiada. Parecem dispostos a permitir que ele escape sem uma punição mais rigorosa, em troca da incriminação dos comparsas.
Uma decisão sensata. Octogenário, já transferira o poder na CBF para Marco Polo Del Nero e, na Confederação Sul-Americana e na Fifa, apenas fazia figuração enquanto amealhava mais uma graninha por delas participar como – argh! – representante brasileiro. Agora que sua carreira de dirigente esportivo foi compulsoriamente encerrada, não poderá mais participar da (e promover a) roubalheira, tendo de conformar-se em ver o tempo passar num apartamento luxuoso de Nova York, com a tornozeleira eletrônica servindo para manter viva na sua memória, o tempo todo, sua condição de degradado chique.
Resolveram, portanto, relevar suas culpas para poderem aproveitar o outro talento marcante de Marin, o de apontar o dedo para os outros sempre que isto lhe convém.
Para ser favorecido em suas ambições políticas pela ditadura militar, fez em 1975, na Assembléia Legislativa de São Paulo, um pronunciamento indignado contra a infiltração subversiva na TV Cultura (saiba mais sobre isto aqui) e teve o azar de que uma decorrência do seu puxa-saquismo explícito haja sido o assassinato sob tortura de Vladimir Herzog.
PublicidadeE agora, para evitar uma cana braba, voltará o dedo para Del Nero e sabe-se lá quem e quantos mais, enquanto posa de inocente: teria sido um velhinho crédulo de quem espertalhões se aproveitaram para fazer maracutaias à sua sombra. Acredite quem quiser (o pragmatismo amoral das autoridades estadunidenses me enoja!).
Será lembrado como o presidente da CBF em cujo mandato a Seleção Brasileira sofreu sua derrota mais acachapante e desastrosa em todos os tempos (e também por tentar eximir-se de suas responsabilidades atirando toda a culpa no treinador e no coordenador-técnico por ele escolhidos, o que levou o jornalista esportivo Juca Kfouri a comentar que “Judas Iscariotes não faria melhor”).
E, claro, por haver assumido o papel de delator em dois episódios marcantes.
Se tivesse um mínimo de autocrítica, repetiria a frase célebre do ditador Figueiredo: “Quero que me esqueçam!”.
Vergonha!
O Juca Kfouri cansou de avisar. Eu também.
Mas nossa presidente preferiu compactuar com o atraso e com a imoralidade, acreditando que os favores do José Maria Marin lhe seriam úteis caso a Seleção Brasileira conquistasse o hexa.
Por um punhado de votos que depois dos 7×1 acabaria não recebendo, estreitou a mão do atual prisioneiro da Justiça estadunidense e tocou o indicador que um dia indicou o Departamento de Jornalismo da TV Cultura como alvo para o DOI-Codi (pobre Vlado!).
A foto do topo ficará para a posteridade como um exemplo emblemático daquilo que político nenhum deve fazer, JAMAIS!
Como bem disse Vladimir Herzog, “quando perdemos a capacidade de nos indignarmos ante atrocidades sofridas por outros, perdemos também o direito de nos considerarmos seres humanos civilizados”.
* Jornalista, escritor e ex-preso político. Edita o blogue Náufrago da Utopia.
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