João Batista Araujo e Oliveira *
Na contramão do programa de ajuste fiscal, Estados e municípios empenham-se em aprovar legislação para se adequar ao Plano Nacional de Educação (PNE), o que irá comprometer ainda mais os escassos recursos e aumentar as ineficiências existentes, sem perspectiva de melhoria da qualidade do ensino. Nada como uma boa crise para provocar mudanças profundas e necessárias. Por que não aproveitar o momento e enfrentar os desacertos do modelo federalista na educação? Sem esquecer, é claro, de aprimorar os mecanismos de financiamento da área.
Quais ações poderiam se dar nos três níveis da Federação? Levantamos alguns pontos e suas soluções, para incentivar o debate e provocar os tomadores de decisão.
Do ponto de vista de recursos, o grande problema é a legislação existente, que leva Estados e municípios a aumentar gastos, especialmente com pessoal, sem possibilidade de elevar receita e diante da perspectiva de redução demográfica. Isso inclui especialmente a questão dos reajustes salariais determinados a partir de Brasília e o modelo inviável de expansão das creches.
A outra grande ameaça é a falta de liquidez para pagar os atuais e futuros aposentados da educação, especialmente nos municípios que optaram por regime próprio e que se encontram à beira da insolvência.
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O terceiro aspecto é a criação de encargos decorrentes de programas federais que Estados e municípios foram “forçados” a aceitar, e que geram mais custos do que benefícios. Felizmente, o ajuste deverá eliminar esses programas, quase todos 100% ineficientes.
PublicidadeO quarto ponto se refere às ineficiências decorrentes da duplicidade de redes de ensino – a municipalização incompleta associada à redução demográfica vai tornando a operação conjunta do Ensino Fundamental cada vez mais cara, especialmente para os Estados.
Do ponto de vista da produtividade da economia, o grande gargalo é o Ensino Médio. O Brasil resiste à necessidade de diversificar esse nível e condena quase metade dos jovens ao subemprego ao insistir no modelo único de Ensino Médio subordinado ao Enem.
Diante desta realidade, como poderiam agir os estadistas no nível federal, estadual e municipal? Rascunhamos algumas ideias, na esperança de incentivar os homens públicos que podem interferir e fazê-las avançar.
No âmbito nacional, caberiam medidas como (1) rever as metas do PNE, mantendo apenas aquelas duas ou três que efetivamente aumentem a eficiência ou a qualidade e substituindo as demais por medidas mais eficazes; (2) estabelecer critérios definitivos e adequados para o reajuste do magistério, (3) criar incentivos para as redes estaduais promoverem o que falta da municipalização, (4) estimular, ao invés de impor, os Estados a propor e implementar modelos alternativos para o Ensino Médio e fazer o mesmo para os municípios na área da primeira infância em substituição ao inviável modelo de creches (5) no bojo dessas mudanças, associar o Fundef ao número de habitantes de 4 a 17 anos, e não ao número de alunos matriculados no ensino básico regular, de forma a estimular a municipalização e desestimular a repetência.
O acerto do passivo previdenciário poderia ser a moeda de troca para viabilizar essas reformas. Isso aliviaria o caixa de muitos municípios no curto prazo e só teria repercussão para a União a longo prazo. Se o governo federal começar a desatar o nó da educação enfrentando as questões acima citadas, por aí criam-se espaço e recursos para uma nova agenda para a educação brasileira.
No caso dos Estados, duas grandes reformas poderiam ser iniciadas, com ou sem apoio federal. A primeira é a reforma do Ensino Médio, a outra seriam acertos visando o que falta municipalizar no Ensino Fundamental.
No âmbito dos municípios, a hora é de aproveitar a crise para resistir a mais gastos impostos pelo governo federal e reduzir custos, reorganizando a rede escolar, otimizando a oferta de vagas, eliminando a miríade de programas e projetos que tiram o foco e concentrando a ação pedagógica no que é essencial para promover a aprendizagem dos alunos.
O exemplo de Brejo Santo (Ceará) vencedor do Prêmio Prefeito Nota 10, instituído pelo Instituto Alfa e Beto, e dos três outros municípios que também se destacaram, mostra que, apesar da crise e das dificuldades, é possível promover a qualidade e a equidade na educação. Basta, como visto, ser um gestor comprometido e engajado na causa. São exemplos a serem seguidos.
Será a crise suficientemente forte para despertar novas ideias, novas lideranças e estadistas à altura das reformas que requer o nosso combalido pacto federativo? Fica o desafio.
* João Batista Araujo e Oliveira é presidente do instituto Alfa e Beto.
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