Nesta virada de ano, em que todos desejamos um 2021 melhor que 2020, qual rumo dar a essa caravela chamada Brasil, perdida em mar revolto? Se não para 2021, ao menos para 2023, quando começam novos mandatos presidencial e legislativo?
É ousadia propor, em poucas linhas, um direcionamento para um país como o Brasil, com mais de duzentos milhões de complexidades. Ainda assim, arrisco-me.
É reconhecido que o Brasil está sem rumo há anos, situação agravada pelo atual governante e pela covid. No momento, disputas e ardis, negociações e negociatas seguem céleres para se definir os candidatos em 2022. Mas, quem quer que seja eleito, permanecerá a dúvida: que rumo será dado ao país? Falta-nos – e também aos nomes mais citados como presidenciáveis – objetivos claros, capazes de dar direção a essa nau sem rumo.
Definir uma direção desejável, que congregue apoios, é tarefa urgente. Precisamos de uma utopia realista, tão realista que mobilize forças suficientes para se tornar realidade, vencendo as barreiras existentes. Muitos já disseram, com fundamento, que a utopia é o motor da história.
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A utopia que hoje nos move perdeu o sentido e é, crescentemente, distópica. Trata-se da ideia, indefinida e incerta, de “desenvolvimento”. Desenvolvimento para quê? Para onde? Como? Quais resultados esperar desse processo dentro de dois, cinco ou vinte anos? O agravamento do colapso ecológico? Ninguém sabe, ninguém diz! Assim, continuamos sem rumo.
Outra será a realidade, e melhores nossas perspectivas, se pudermos concordar com alguns objetivos claros, que sejam percebidos pela maioria como implicando, de fato, melhoras substanciais em suas vidas, que possam ser alcançados em três ou quatro anos, e cujos avanços, ou falta de, possam ser medidos com clareza, de forma a se acelerar os passos ou corrigir a rota. Passaremos a ter uma direção, um Norte. Alcançadas essas metas, outras, mais ambiciosas, embora requerendo prazos maiores, deverão ser definidas, sucessivamente.
PublicidadeMetas a serem alcançadas em três ou quatro anos são importantes por coincidirem com o mandato político, e também porque a população brasileira pena com a situação atual e, ainda, porque ninguém se elegerá propondo alcançar seus objetivos dentro de vinte anos! JK teria sido eleito se seu lema fosse “devagar se vai longe”, e não “cinquenta anos em cinco”, sintetizando as suas claras e quantificadas metas? O primeiro bordão seria mais coerente com a difícil e complexa realidade de um transatlântico sem leme como é o Brasil, mas certamente não levaria, às urnas, a esperança necessária para delas receber um mandato! Para tal são desejáveis objetivos concretos a serem alcançados em poucos anos, sob pena de, mais uma vez, a maioria do eleitorado comprar ilusões e colher decepções.
Que objetivos podem ajudar a dar rumo a este país?
Melhorar a educação, a saúde, a segurança pública e a aplicação da Justiça é, claro, desejável. Mas, exatamente quais melhorias substanciais se pode desejar e concretizar, nesses campos, em três ou quatro anos, rumo a melhorias ainda maiores nos anos seguintes? Quais as sugestões dos especialistas?
Digamos que nos colocamos de acordo – por ora, sem lhes dar substância – com os objetivos 1, 2, 3 e 4. Admitamos, ainda, que a maioria da população aprove o propósito de alcançar essas metas em três ou quatro anos. Sempre haverá divergentes, mas uma maioria é possível.
Nesse cenário, quem quer que seja eleito com a bandeira de materializar essas quatro utopias terá, necessariamente, um compromisso com elas. A possibilidade de mais um estelionato eleitoral ficará reduzida, assim como o tradicional “toma lá dá cá” da política. A maioria dos órgãos públicos dos três Poderes, nas três esferas federativas, assim como empresas e outras organizações, farão esforços para alcançá-las, e o Brasil se tornará outro. A imprensa, a academia, as igrejas, os cidadãos e cidadãs, sindicatos e outras entidades poderão contribuir, com ideias, vigilância e de outras formas.
Identificar, dar substância, a esses objetivos deveria merecer elevada prioridade. Reitero a importância de os especialistas identificarem objetivos de curto prazo para a educação, a saúde e outras agruras da população. Arrisco-me a sugerir três objetivos possíveis, noutros campos; todos três com grande capacidade transformadora da realidade nacional. Seriam três grandes campanhas e muito esforço para:
Primeiro: acabar com o lixo espalhado por ruas, rios, campos e cidades, com ganhos evidentes para a saúde da maioria da população e para o erário. A ilha chinesa de Formosa, conhecida nos anos 1990 como a “ilha do lixo”, hoje é exemplo de limpeza e quase não há latas de lixo nas ruas.
Segundo: dar pontualidade aos sistemas de transporte público, poupando aos usuários, em média, mais de 40 minutos diários, hoje perdidos à espera da incerta hora em que passará o veículo! Isso é respeito ao cidadão e à cidadã, e só o danoso “complexo de vira-latas” pode fazer crer que isso seja impossível no Brasil, uma vez que em muitas cidades, mundo afora, isso já era realidade muito antes do GPS e do celular.
Tanto a questão do lixo quanto a do transporte público carecem de uma gestão que considere muitos outros objetivos: reduzir a quantidade de lixo gerado, aumentar o conforto dos ônibus, etc. Mas, conseguindo alcançar as metas acima, já teremos um grande avanço, que dará forças para rumar em direção a conquistas maiores!
O terceiro objetivo é ainda mais transformador e polêmico, mas é igualmente urgente face ao enorme desemprego e sombrias perspectivas trazidas pela crescente automação. Trata-se de uma reforma tributária que alcance os seguintes propósitos: a) inverter a hoje regressiva estrutura tributária brasileira, de forma que quem ganha mais passe a pagar mais, e quem ganha menos pague menos; b) tornar viável o pagamento de uma renda básica mensal da ordem de R$ 400,00 a todos os brasileiros e brasileiras, sem comprometer o equilíbrio fiscal (há estudos que mostram a viabilidade desta proposta ); c) simplificar enormemente os impostos e dar maior participação na arrecadação total aos municípios.
É previsível a reação contrária a esta proposta por parte dos mais ricos – entre eles os principais “formadores de opinião”, a maioria dos quais hoje aprisionados pela ideia de promover o “desenvolvimento” –, mas o estudo citado mostra que com ela mais de 95% da população ganharia mais, e 100% viveríamos num Brasil muito melhor.
Implantada a renda básica universal a miséria absoluta acabará e todos os brasileiros e brasileiras passarão a ter uma vida mais digna, sem muitas das atuais carências. A desigualdade no Brasil será reduzida ao nível daquela que hoje vigora no Reino Unido, e o país terá a chance de se tornar mais solidário. O prazo de três a quatro anos é necessário para se refinar a proposta e conseguir aprová-la no Congresso onde, espera-se, uma maioria terá sido eleita com tal bandeira.
É fácil alcançar esses objetivos? Certamente não; impossível? Também não. Desejável? Sem dúvida, sim.
Como poderemos nos organizar para torná-los realidade, dando um norte às nossas vidas? Quem sugere o quê? Como usarmos quais recursos para defini-lo com clareza e melhorar nosso destino? Quais líderes poderão hastear estas bandeiras, ou propor outras ainda melhores? Ficarei feliz em debater esses temas; posso ser alcançado no e-mail (edufer09@gmail.com) ou no whatsapp (61-99255-4098).
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