Primeira deputada indígena do Brasil, Joênia Wapichana (Rede-RR) demonstrou preocupação com o andamento do projeto de lei que prevê a regulamentação da exploração de terras indígenas. “Estão querendo transformar as terras indígenas em uma Serra Pelada”, diz, em referência à região paraense que atraiu milhares de pessoas para o garimpo na década de 80.
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Em entrevista ao Congresso em Foco nesta sexta, Joênia afirma que ainda não fez uma leitura aprofundada do texto enviado pelo Executivo nessa quinta-feira (6). Mas, em princípio, o considera inconstitucional, além de “totalmente inadequado”. “Está cheio de erros técnicos e legislativos e nem deveria ser recebido”, diz.
Questionada se a regulamentação poderia melhorar a situação dos indígenas, uma vez que parte das atividades tratadas no projeto de lei já ocorrem, mas de forma ilegal, Joênia é assertiva: “O remédio é cuidar da ferida, e não aumentá-la mais”.
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A deputada defende que há questões na legislação que trata da mineração que precisam ser corrigidas para começar a se pensar em liberar a exploração em terras indígenas. “Nós tivemos Mariana, nós tivemos Brumadinho, nós tivemos grandes catástrofes”, relembra.
Ela afirma também que o governo precisa focar em problemas atuais dos povos indígenas antes de avançar com essa proposta. “O governo prioriza a exploração, ao invés de melhorar a educação, a saúde e a segurança”, explica.
PublicidadeTrês grandes problemas
Para Joênia, o projeto enviado pelo presidente Bolsonaro tem três grandes problemas: a forma escolhida para a regulamentação, por meio de projeto de lei ordinária e não complementar; a alteração de cláusulas pétreas e o fato de não respeitar convenções internacionais.
Ela explica que a exploração de recursos hídricos e minerais, previstos na Constituição Federal, deve ser regulamentado com uma lei complementar, e não uma lei ordinária, como é o caso do projeto enviado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). A principal diferença entre as duas é que a primeira necessita de maioria absoluta dos votos, enquanto a segunda só precisa da maioria simples.
Joênia afirma que o texto mexe com cláusulas pétreas, trechos da Constituição que não podem ser alterados nem por proposta de emenda constitucional (PEC). E cita a restrição do usufruto exclusivo das terras pelos indígenas, como exemplo. “A minha primeira leitura é que seria inconstitucional”, completa.
A deputada diz também que o fato de os indígenas não terem poder de veto na decisão da exploração das terras é uma afronta à convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2004.
‘Legalização do garimpo’
Joênia indica que o texto tenta legalizar o garimpo em terras indígenas, o que seria ilegal. “A garimpagem é proibida, ela é inconstitucional e ela é vetada na nossa Constituição Federal”, comenta.
De acordo com ela, essa é uma das principais preocupações dos povos indígenas com o texto enviado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). “A quem interessa regulamentar uma ilegalidade?”, questiona.
A deputada afirma que não há “cuidado” do Executivo com os indígenas e esse projeto é mais um indicativo disso. “A intenção não é ajudar os povos indígenas, mas torná-los mais vulneráveis”, comenta.
A decisão de Maia
Joênia conta que está em Roraima e que já recebeu mensagens de lideranças indígenas preocupadas com o andamento do projeto. Nesta quinta, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), determinou a instalação de uma comissão especial para analisar o texto.
O despacho foi na contramão do que afirmou em novembro do ano passado, em entrevista à GloboNews. “Recebo e arquivo, recebo e arquivo. A gente não pode usar o argumento de que está tendo mineração ilegal para liberar. Vamos acabar com mineração ilegal, com garimpo”, diz.
A deputada afirma que ainda não conversou com Maia sobre a decisão de instalar a comissão, mas diz que se “surpreendeu” com o andamento da proposta. “Me surpreendeu muito ele ter criado uma comissão especial e não ter feita nenhuma análise desse texto”, comenta.
Ela explica que há interesse das lideranças indígenas em conversar com o presidente da Câmara sobre o assunto, mas que o clima é de apreensão neste momento.”Os povos indígenas já me questionaram se o presidente Maia tem palavra para manter o que falou publicamente”, afirma.
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