O uso das emissoras de rádio e televisão como trampolim político é prática frequente no país. Embora os tribunais eleitorais sejam rígidos em sua fiscalização durante os períodos de campanha, a propaganda de candidatos com espaço na programação dos canais dura o ano todo. E um tipo de programa – e seus respectivos apresentadores – tem se destacado neste universo, sobretudo diante de um processo eleitoral marcado pelo debate da segurança pública: os programas policialescos.
Levantamento realizado pelo Intervozes em dez estados do país (PA, CE, PB, PE, BA, MG, RJ, ES, SP e PR) e no Distrito Federal revelou: 23 apresentadores e repórteres de programas policialescos disputam o voto do eleitor nesta eleição (veja a lista completa mais abaixo). Eles são candidatos a deputados estaduais e federais e também ao Senado. Apenas na Bahia e em Brasília não foram encontradas candidaturas com esse perfil.
Mesclando populismo político, conteúdos sensacionalistas – que em grande parte violam direitos humanos – e práticas assistencialistas, tais apresentadores se beneficiam do espaço privilegiado da radiodifusão para fins estritamente privados: sua ascensão política. E, num contexto de campanha em que soluções ineficazes para a segurança pública dominam o debate eleitoral, o impacto de candidaturas alicerçadas na produção midiática do medo é significativo.
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Dentre os estados pesquisados, os que apresentam maior número de candidatos são Minas Gerais (5), Ceará (5), Pará (4) e Paraná (4). No Pará, por exemplo, os quatro candidatos trabalham na mesma empresa, o Grupo RBA de Comunicação, que possui emissoras afiliadas à Rede Bandeirantes de rádio e televisão. René Marcelo, que disputa uma vaga na Assembleia Legislativa do estado pelo MDB, é apresentador do Barra Pesada, carro-chefe da RBA TV Belém, apresentado de segunda a sábado na faixa horária de meio dia. Antes, comandou por sete anos o Balanço Geral, na TV Record. Seu colega de trabalho, JR Avelar, produz matérias de cunho policial para vários veículos do grupo, em especial o Cidade Contra o Crime. Auto intitulado “Mensageiro da Morte”, Avelar quer ser deputado estadual, tendo se lançado este ano pelo PHS.
Também pelo PHS, Joaquim Campos, já vereador em Belém, tenta agora se eleger deputado federal. Foi apresentador do programa Metendo Bronca, veiculado logo após o Barra Pesada na grade de programação da emissora. Hoje, apresenta o Rota Cidadã, um reality policial que acompanha as operações em todo o estado. O mesmo Rota Cidadã tem como comentarista o médico Wanderlan Quaresma, outro que quer ser deputado estadual, pelo MDB. É grande apoiador do candidato ao governo do Pará pelo mesmo partido, Hélder Barbalho, filho de Jader e Elcione Barbalho, donos do Grupo RBA.
Retroalimentação
PublicidadeVários dos candidatos policialescos também buscam a reeleição. Embora a legislação eleitoral impeça a aparição dos candidatos em tais programas durante o período de campanha, não há uma legislação específica que coíba a presença de políticos com mandatos em vigência na apresentação de programas de rádio e TV. E aí a retroalimentação entre as carreiras política e midiática é brutal, com sérios danos para processos eleitorais efetivamente democráticos.
É o caso do deputado federal Laudivio Carvalho, do Podemos de Minas Gerais. Titular da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados e apresentador do programa Tolerância Zero, veiculado aos sábados na Rádio Itatiaia (principal emissora do estado), Laudivio é um histórico apresentador de policialescos em Minas Gerais. Já passou pelo Aqui Agora e o Alterosa Urgente, na TV Alterosa, retransmissora do SBT, e pelo Minas Urgente, da Band Minas. No rádio, comandou por 14 anos o Patrulha Itatiaia. O programa é citado numa pesquisa coordenada pela ANDI e pelo Intervozes sobre este gênero televisivo, tendo veiculado 66 matérias violadoras de direitos humanos ao longo de um mês de monitoramento no ano de 2015.
No Paraná, o deputado estadual pelo Partido Progressista Gilberto Ribeiro também tenta a reeleição. Ele apresenta o Balanço Geral Curitiba, veiculado para RIC TV, afiliada à Rede Record, vice-líder de audiência na hora do almoço. Na imprensa do estado, Gilberto Ribeiro aparece em denúncias de envolvimento com apropriação indevida de salários de ex-funcionários e até do atropelamento, sem socorro, de um adolescente.
No Rio de Janeiro, Wagner Montes é campeão de reeleições. Ele está em seu terceiro mandato como deputado estadual, apresentando programas deste tipo desde a década de 1970. Em 2006, foi eleito pelo PDT com 111 mil votos, o terceiro mais votado daquele pleito. Em 2010, foi reeleito com mais de 500 mil votos, tornando-se o estadual mais votado da história do estado. Em 2011, foi para o PSD e, em 2014, se elegeu uma vez mais. Em 2016, foi para o PRB, seu partido atual – muitos acreditam que por pressão da própria Record, de onde nunca saiu como apresentador do Balanço Geral mesmo exercendo os mandatos parlamentares. Montes se candidata agora à Câmara dos Deputados. A página no Facebook “Tropa do Wagner Montes” tem 345 mil seguidores. Seu filho estreou há pouco como repórter no SBT Rio, programa jornalístico com traços de policialesco.
No Espírito Santo, o apresentador do Balanço Geral e deputado estadual mais votado em 2014 também alça voos mais altos, buscando uma vaga na Câmara pelo PRB. Transmitido pela afiliada da Record no estado, o Balanço Geral é líder de audiência, alcançando em média metade dos televisores ligados na Grande Vitória na hora do almoço. Mesmo trabalhando como parlamentar e buscando um cargo em Brasília, Amaro Neto renovou contrato com a Record até 2022. Ele trabalha com o gênero televisivo desde 2009.
Recentemente, a Polícia Militar do Espírito Santo se manifestou em nota pedindo ao comunicador que respeitasse o trabalho da corporação, depois que ele usou o termo “policial sapecado” para se referir a um PM morto com um tiro na cabeça em março passado. Em 2016, Amaro concorreu à prefeitura de Vitória pelo Solidariedade, mas não foi eleito.
Apoio precioso
Mesmo quando apresentadores, repórteres e comentaristas não se lançam diretamente em processos eleitorais, o palco dos programas policialescos é um espaço precioso para candidatos cujas plataformas giram em torno da segurança pública.
Na Bahia, o apresentador do Brasil Urgente, da Band, Uziel Bueno, não disputa nenhum cargo este ano. Ele tomou posse em abril como vereador suplente em Salvador, pelo Podemos. É garoto-propaganda de seu correligionário, o deputado federal João Carlos Bacelar, que tenta a reeleição. No sul fluminense, o Programa Dario de Paula, transmitido por três rádios diferentes, tem feito campanha explícita por dois candidatos: Márcia Cury, candidata a estadual pelo Solidariedade, e Doutor Luizinho, candidato a federal pelo PP. A página do programa no Facebook está cheia de posts sobre os dois.
Em São Paulo, o conhecido apresentador do Brasil Urgente, veiculado nacionalmente pela Band, José Luiz Datena, pretendia se lançar ao Senado pelo DEM. Desistiu, e agora aparece na propaganda eleitoral partidária, pedindo votos para César Maia, que, este sim, tenta chegar ao Senado pelo estado do Rio. É um apoio precioso que, em um cenário de campanha mais curta e de horário eleitoral televisivo reduzido, faz toda a diferença para as candidaturas. Afinal, larga na frente quem conta com exposição prévia ou permanente na TV.
Veja abaixo o levantamento produzido pelo Intervozes:
A íntegra do levantamento do Intervozes sobre candidatos apresentadores e repórteres de programas policialescos está disponível em www.midiasemviolacoes.com.br.
* O levantamento do Intervozes foi realizado pelos pesquisadores Alex Hercog (BA), Brenda Takeda (PA), Cinthya Paiva (ES), Eduardo Amorim (PE), Gesio Passos (MG), Gyssele Mendes (RJ), Helena Martins (CE), Iago Verneck Fernandes (SP), Lizely Borges (PR), Mabel Dias (PB) e Ramênia Vieira (DF). Coordenação de pesquisa: Bia Barbosa e Olivia Bandeira.
Espero que a bancada da bala se amplie cada vez mais como forma de proteção do direito humano mais básico: à vida.
Com a política que temos hoje e nossos mais de 60.000 homicídios anuais, é uma piada pronta a esquerda se arvorar em defensora dos direitos humanos, quando as pessoas estão sendo caçadas nas ruas feito lebres pelos delinquentes.