De 1500 a 1822 foram 322 anos de extorsão, roubos, escravidão, chicotadas, apropriações, estupros, humilhações, violências e extermínios. Cerca de 5 milhões de índios foram dizimados (Darcy Ribeiro). Mais de um milhão de negros escravizados foram exterminados. Para o Novo Mundo nenhum europeu branco veio para constituir família e aqui se perpetuar. O Brasil era a colônia ideal para extorquir, corromper, matar, estuprar, roubar e, sobretudo, para se enriquecer, com cana de açúcar, por meio da exploração dos escravos (negros e índios) ou do branco pobre. Ausência absoluta do império da lei. Mundo selvagem, olhado à distância de Lisboa.
De 1822 a 1889 foram 67 anos de Império, que muito pouco alterou os costumes colonialistas: a escravidão continuou porque os donos do poder capitalista (fazendeiros de açúcar e café) não deixaram aboli-la antes de 1888. Paralelamente à escravidão e ao parasitismo corriam soltos a corrupção, sobretudo dos políticos, as guerras internas e externas, todas exageradamente sanguinárias, a frouxidão do controle dos órgãos repressivos, o desrespeito ao devido processo, o tratamento desigual das pessoas, os privilégios e maracutaias patrimonialistas etc.
Na primeira república (1889-1929), os donos do poder continuam roubando, matando, extorquindo, corrompendo políticos, burlando resultado de eleições e se enriquecendo com o trabalho neoescravista. Em 1930, começa a industrialização forte, que vai até 1980. Alto crescimento econômico com altíssima concentração de renda, à custa dos assalariados miseráveis, que só respiraram um pouco com o populismo getulista. No meio, revoluções militares, Estado Novo, torturas, desaparecimentos, violação massiva de direitos humanos e extermínio dos inimigos (especialmente os da esquerda). Durante a ditadura de 64-85 veio o maior arrocho salarial da história, que promoveu uma enorme concentração de renda (do Gini 0,54 em 60 passamos para o Gini 0,64 em 89). Muito enriquecimento em cima dos assalariados pobres. Capitalismo mais selvagem é difícil de encontrar.
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De 1985 a 2013, redemocratização, nova Constituição, seis eleições presidenciais seguidas e consolidação do capitalismo selvagem, apenas suavizado com Bolsa Família, nova classe C, recuperação do poder de compra do salário mínimo etc. As violações massivas de direitos humanos não sofrem interrupção: pessoas trituradas, torturas, extermínios, campos de concentração (presídios) e por aí vai.
Depois de 513 anos (não se constrói uma nação violenta, corrupta e com capitalismo extremamente selvagem da noite para o dia), chegamos em 2014: fortificação do capitalismo selvagem financeiro, 70% da renda nacional divididos entre pouquíssimas famílias, índice Gini de 0,51 (um dos mais altos do mundo, o que revela enorme desigualdade), aprofundamento do apartheid, violência epidêmica persistente (27,1 assassinatos para cada 100 mil pessoas), 53 mil mortes intencionais, 45 mil mortes no trânsito, corrupção ampla, geral e irrestrita etc.
É claro que o Brasil teria o maior número das 50 cidades mais violentas do planeta. Nada menos do que 16: Maceió, Fortaleza, João Pessoa, Natal, Salvador, Vitória, São Luís, Belém, Campina Grande, Goiânia, Cuiabá, Manaus, Recife, Macapá, Belo Horizonte e Aracaju (O Globo, 23/3/14, página 7).
Não estamos fazendo absolutamente nada do que fizeram os países de capitalismo evoluído, distributivo e altamente civilizado (Dinamarca, Suíça, Canadá, Bélgica, Coreia do Sul, Japão, Austrália etc.) para reduzir a violência, domando o monstro do capitalismo selvagem. Com condições inalteradas, tudo vai piorar bastante. Quem faz tudo errado em termos de prevenção da criminalidade não pode esperar resultados diferentes nunca (Einstein).
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