Você já ouviu falar de Rothenburg ob der Tauber? Trata-se de uma pequena e pitoresca cidade situada na Alemanha. Um de seus atrativos turísticos mais interessantes é o “Museu do Crime”, no qual estão retratadas as punições impostas aos criminosos nos últimos mil anos.
Uma em especial, aplicada nos tempos medievais, chamou-me a atenção: uma gaiola, a ser pendurada na praça central da cidade, na qual os criminosos condenados eram expostos à execração pública.
Dia desses fiquei a recordar tal gaiola, ao ver pela televisão mais uma “apresentação pública de suspeitos” – sim, nestes tempos modernos as penas humilhantes já não são aplicadas contra condenados, bastando que sejam meros suspeitos.
O cenário é conhecido de todos: ao fundo, uma parede com o logotipo da instituição responsável pela captura do suspeito. Nada mais há no cenário além de um palco. E eis que aparece o “apresentado” – invariavelmente, um miserável. Normalmente algemado, com as mãos para trás, no mais das vezes sem camisa, de cabeça baixa, é conduzido até o centro do palco.
Os agentes da lei, então, se afastam. E o “apresentado” fica lá, imóvel, sendo filmado e fotografado pela mesma imprensa que tão bons serviços presta à sociedade ao repudiar a tortura neste país acima de tudo cristão. E, se ele for inocente, como fica sua dignidade e a de sua família? Ora, a dignidade…
Leia também
Passados alguns minutos, quando as luzes dos holofotes e os “flashes” dos fotógrafos começam a diminuir, retornam ao palco os agentes da lei, para conduzir o “apresentado” à sua cela.
Sou inimigo ferrenho da impunidade. Porém, não menos de qualquer desrespeito à dignidade dos presos. Afinal, o que os aviltar nos aviltará.
Revolta-me, em especial, a covardia do Estado: nunca vi, por exemplo, algum poderoso acusado de corrupção sendo “apresentado”. Não, esta é uma pena exclusiva de suspeitos de menor quilate.
O curioso é que não se toma praticamente atitude alguma contra essas sessões de humilhação pública! Não há notícia de campanhas, manifestações, protestos ou seja lá o que for. Pois é. Fiquei a pensar em Friedenberg, quando exclamava que “as pessoas não só aceitam a violência quando perpetrada pela autoridade legítima, como aceitam como legítima a violência contra certas espécies de pessoas, não importa quem a cometa”.
<< Mais do autor: O pecado mortal – a inviolabilidade do lar e a pobreza como pior dos crimes
Deixe um comentário