Este artigo está dividido em três seções: (1) A política nazista do aborto; (2) O Projeto de Lei 478/07; (3) Possíveis vias de contra-ataque a esta proposta.
A política nazista sobre o aborto
Na Alemanha, até 1930, o aborto estava sujeito a leis flexíveis, que tinham em conta a saúde da mãe e do feto, mas em 1933, imediatamente depois do triunfo do Partido Nacional Socialista, o aborto foi declarado crime.
Em sua primeira proclama, no 1º de fevereiro de 1933, Hitler deixou claro que seus princípios sobre a vida cotidiana e a família eram os mesmos da Igreja Católica e do cristianismo em geral. Nesse trecho, ele não menciona o aborto, mas mostra a aceitação de todas as exigências da igreja.
Uma análise mais detalhada sobre o aborto (Abtreibung) foi incluída na lei de 26.07.1935 emitida pelo gabinete legislativo de Adolf Hitler. Veja
Segundo a doutrina nazista, a finalidade da mulher alemã era produzir filhos para o grande império germânico e a cristandade, pelo qual o aborto de qualquer criança alemã era considerada crime e traição à pátria.
Leia também
O próprio Hitler ordenou fundar o Centro de Combate contra a Homossexualidade e o Aborto, inaugurado em 10 de outubro de 1936.
Quando uma mulher de “raça” germânica abortava, ele podia ser condenada a trabalhos forçados, e seu médico podia ser até executado. Vide.
Entretanto as leis contra o aborto eram mais “compassivas” que o atual projeto que se discute no Brasil. Elas concediam o aborto nos casos em que o nascimento causasse doenças à mãe e quando o próprio feto tinha deformações, que não se restringiam à falta de cérebro, como no Brasil.
Os nazistas consideravam o embrião da linhagem germânica como vida legítima, mas chamavam vida indigna de ser vivida (lebensunwertes leben) a vida dos judeus, ciganos, comunistas etc.
Há muito tempo que o projeto de dominação mundial pelo nazismo fracassou, mas os princípios sobre os quais baseou-se Hitler para proibir o aborto são os mesmos que os atuais: o desprezo pela mulher e a necessidade de aumentar o número de soldados do próprio exército. Atualmente, cada seita anti-aborcionista pensa em seu próprio “exército”. Por exemplo, os neocons americanos pensam que o aborto dificultará o crescimento de seu país e do cristianismo, pois haverá menos bucha de canhão. Na Europa, os inimigos da tendência “pró-escolha” temem que, com menos habitantes, suas igrejas percam fiéis, como já acontece na Escandinávia, na França e até na muito católica Irlanda.
Os autodenominados “pró-vida” dizem que Hitler defendia o aborto. De fato, Hitler se pronunciou a favor do aborto só em 1942, e apenas quando aplicado às “raças inferiores”. Isso porque essas vidas eram, para os nazistas, inúteis. Mas a proibição do aborto para a vida que eles consideravam realmente humana, estava baseada exatamente nos mesmos princípios que os atuais “pró-vida”. Aliás, o nexo entre a ideologia do 3º Império e a da direita americana ou brasileira é o mesmo: grupos confessionais e misóginos.
Também os nazistas pensaram algo parecido a uma bolsa, mas era menos iníqua, pois não obrigava a mulher a reconciliar-se com o estuprador. Era um incentivo para que as famílias aumentassem seu número de filhos. Essa bolsa era de 1000 RM da época, acompanhada de honras como a Cruz da Maternidade (inspirada na Cruz de Honra dos militares), que se concedia às famílias numerosas cada 12 de agosto, aniversário de mãe de Hitler, Klara Polzl.
As semelhanças são muitas e não são mera coincidência.
Dos propugnadores do Projeto de Lei 478/2007, que contém a “bolsa estupro”, uma minoria, incluída a legisladora que mirabolou essa aberração, afirma que não pretende abolir as permissões dadas pelo Código Penal: estupro e saúde da mãe.
Entretanto, mesmo se isso fosse verdade e o CP não fosse alterado, é claro que as mulheres pobres (que não podem pagar um médico que faça discretamente o aborto) serão alvo de pressão quando queiram pedir o aborto legal em caso de estupro.
Uma mulher que fica grávida por causa de estupro pode decidir livremente ter a criança. De fato, há alguns poucos casos conhecidos em que isso aconteceu. Seria absurdo desenvolver animosidade contra a criança por causa do pai. Mas a enorme maioria não quer alguém que lhe faça lembrar o triste episódio, até porque muitas mulheres têm medo de não serem justas com seus filhos e não conseguirem separar a pessoa da criança do fato traumático em que foi concebida.
Ora, se a mulher aceita a “bolsa estupro” e tem a criança, o pai terá direito a ver essa criança e, portanto, ao convívio com sua vítima.
Haveria de se perguntar a alguma das pessoas que apoiam esse infame projeto se gostaria estar nesta situação.
Possíveis vias de contra-ataque
Esse projeto de lei tinha sido arquivado em 2011, mas as circunstâncias atuais são favoráveis a sua reaparição. Dois fatos sinistros coincidiram: a transformação de instituições rotuladas como de “direitos humanos” em picadeiro para uma gangue delinquencial, e a elevação ao máximo poder confessional de um estreito colaborador da pior ditadura que teve a América Latina.
Isso se junta com a ambiguidade das promessas feitas pelo poder público de proteger as mulheres, promessas das quais não é visível ainda nenhum resultado prático. É necessário que o grupo das feministas se organize rapidamente em nível internacional.
1) É necessário pedir apoio a campanhas pró-escolha de outros países. A principal, neste momento, tem este link.
2) Assinar e pedir a divulgação de tantas petições quanto seja possível, por exemplo.
3) Aproveitar que a ONU, já desde 2002, tem criticado a falta de respeito aos direitos reprodutivos no Brasil, e escrever aos organismos competentes da ONU (WHO, Unicef, HRC etc.), pedindo que se alerte ao Estado brasileiro sobre o risco de incorrer em crime contra a humanidade.
4) Pedir a colaboração de celebridades, especialmente atrizes que são conhecidas pelo público, para que mostrem a gravidade do que acontece.
Veja também:
Câmara pauta projeto antiaborto e da “bolsa estupro”
Deixe um comentário