A CPI da Covid ouviu nesta terça-feira (1º) a oncologista Nise Yamaguchi. Ela depôs na condição de convidada, não de testemunha, como os demais que prestaram depoimento aos senadores desde a instalação da comissão. A médica é defensora do chamado “tratamento precoce”, com remédios comprovadamente ineficazes contra a covid, e chegou a ser cotada para comandar o Ministério da Saúde.
Veja os principais momentos do depoimento de Nise Yamaguchi à CPI da Covid.
Tratamento precoce e isolamento vertical
Logo em seu discurso inicial, Yamaguchi defendeu o uso da cloroquina, da ivermectina e de outros medicamentos que não possuem comprovação científica, se respaldando na resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que defende a autonomia médica para a prescrição do tratamento. Ao longo do depoimento, ela também disse que considera que o atraso no início do tratamento contra a Covid “é o que tem determinado tantas mortes” no país.
O relator Renan Calheiros foi o primeiro a questionar a médica. Para isso, foram transmitidos à CPI dois vídeos diferentes, de outubro e julho de 2020, nos quais a médica defendeu o isolamento vertical como forma de adquirir a “imunidade de rebanho”.
Calheiros perguntou se Yamaguchi ainda defende e acredita nesse tipo de imunidade contra a covid-19. Nise argumentou que a imunidade de rebanho seria “um fato” que acontece a partir do “contato com o vírus”, e que, na época em que defendeu esse tipo de imunidade, a discussão era “pertinente” porque o país ainda não conhecia novas cepas da doença, mas que, hoje, novos algoritmos devem ser considerados.
PublicidadeQuestionada se defendeu esse posicionamento ao presidente Bolsonaro, ela respondeu que não participou dessa discussão, e que sequer teve encontros privados com ele. Alegou que suas conversas foram somente com técnicos do Ministério da Saúde, nas quais foram discutidas as dosagens de cloroquina. Disse ainda que não foi convidada para integrar o Ministério da Saúde e que houve apenas convites para participar de “reuniões eventuais”.
Ela também afirmou desconhecer “gabinetes paralelos” ou qualquer pessoa que tenha participado de um suposto grupo como este, e reafirmou que sempre foi convidada pelo governo exclusivamente como especialista, para contribuir e opinar se guiando por “normas técnicas”.
Sobre as acusações de teria sugerido a alteração da bula da cloroquina, a médica disse que não se tratava de uma mudança de bula, e sim da possibilidade de disponibilização do medicamento. “Acho que houve um equívoco [de informação]. Não houve nenhuma declaração de mudança de bula”, disse.
Em seguida, foi distribuído aos senadores um documento que, segundo ela, mostra o que foi discutido na reunião com Barra Torres e Mandetta. Mesmo assim, o presidente da CPI sugeriu realizar uma acareação entre ela e o chefe da Anvisa.
Importância da vacinação
O relator Renan Calheiros ainda exibiu um vídeo no qual Nise diz “que não se devia vacinar aleatoriamente a população”, e questionou se ela acredita que a vacinação é tão importante quanto o tratamento precoce.
“São semelhantes. Vacina é prevenção, e tratamento é tratamento. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”, respondeu a médica. De acordo com ela, o tratamento precoce ocorre nos primeiros dias de infecção, enquanto a vacina trata-se de uma “prevenção”. “Existe a medicina da prevenção e a do tratamento”, acrescentou.
O presidente da CPI, Omar Aziz, reagiu à declaração da médica:
Ela se negou também a opinar sobre falas do presidente Jair Bolsonaro contra a vacinação da população, mostradas em vídeos pelo relator da CPI, e disse que nunca conversou com Bolsonaro sobre vacinas. “Não estou aqui para defender um governo, estou aqui para defender o povo brasileiros”, declarou.
Na CPI, Nise também tentou se desassociar do chefe do Executivo. Ao ser questionada, por exemplo, sobre quantos encontros teve com Bolsonaro, a médica se contradisse várias vezes.
“A senhora não sabe de infectologia”, diz Otto Alencar
O senador Otto Alencar (PSD-BA), questionou Nise Yamaguchi sobre os conhecimentos da médica em relação à covid-19, mas a depoente não soube responder. Médico, o senador disse que não era o intuito dele “constranger” Nise. “A senhora não soube nem explicar o que é um vírus. A senhora sabe de oncologia, não sabe nada de infectologia, não leu, não estudou, é tudo superficial”, disse.
“A senhora brincou com a saúde do povo brasileiro, falando em imunidade de rebanho, hidroxicloroquina, tratamento precoce”, continuou Otto se referindo as estratégias para combater o novo coronavírus defendidos pela médica.
Qualificação
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) apresentou artigos científicos que reprovam o uso de cloroquina e hidroxicloroquina e questiona os motivos pelos quais a médica continua defendendo os medicamentos e se as suas bases teóricas possuem comprovação científica.
“Não estamos aqui tratando da autonomia do médico. Estamos aqui discutindo a política pública que foi traçada com base em evidências científicas de baixa qualidade ou insuficientes”, diz.
No entanto, Nise Yamaguchi não apresentou estudos que confirmem a tese defendida por ela.
O senador também pediu que Nise Yamaguchi justificasse a recusa dos outros países aos medicamentos, já que se mostram ineficientes à Covid-19. A médica afirmou que “vários países” discutem o uso do tratamento precoce e que estudos “demonstram a eficácia” ao vírus.
Alessandro diz ser “inacreditável” que a médica, com tamanha qualificação, rejeite as orientações mundiais de saúde e continue insistindo em tratamentos ineficientes.
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Parece que os senadores queriam que ela dissesse o que eles queriam ouvir.