A
transparência baixada por resolução pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
ainda caminha a passos lentos no Judiciário. Passados dois meses desde o prazo
para a publicação na internet do quadro de magistrados e agentes públicos,
apenas dez dos 27 tribunais de Justiça (TJs) divulgam a relação completa
dos servidores, segundo levantamento feito pelo Congresso em
Foco. Eram só nove até esta manhã. Mas
o TJ do Maranhão passou a divulgar a lista por volta das 11h, em
virtude da publicação desta reportagem.
Desses,
somente quatro fazem a devida distinção entre os funcionários não
concursados que ocupam cargos de confiança e aqueles que foram admitidos por
concurso público: além do Maranhão, Bahia, Paraná e Rio Grande do Sul. Também
divulgam a relação dos servidores, ainda que sem distinguir concursados e não
efetivos, os tribunais de Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Pernambuco,
do Amazonas e do Distrito Federal. Nos demais estados, não há registro do
chamado quadro de agentes públicos.
Nepotismo
A divulgação dos nomes dos contratados sem concurso para cargos de confiança
é medida de combate ao nepotismo no Judiciário. O próprio CNJ investiga 39 casos
de contratação de parentes no Judiciário, segundo reportagem do jornal O
Estado de S.Paulo publicada em setembro de 2009. O Conselho abriu 203
processos para investigar casos de nepotismo desde que a prática foi
expressamente proibida, em outubro de 2005. Dados divulgados em 2006 pela Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB) apontava que cerca de 2,7 mil servidores haviam
sido demitidos pelas cortes, na época, por trabalharem com magistrados dos quais
eram parentes.
Os tribunais do Piauí e do Rio Grande do Norte não
criaram sequer o link “Transparência”, que deveria ser destacado na página
inicial de seus respectivos sites, conforme determinação do CNJ. O do TJ do
Ceará foi criado apenas no último dia 31. Essas informações deveriam estar no ar
desde 5 de fevereiro.
Entre os que ainda não se enquadraram
integralmente na norma estão os tribunais de Justiça do Rio de Janeiro e de São
Paulo. O primeiro divulga dados da execução orçamentária e fiscal, mas não o
quadro de servidores. Ignora, ainda, a relação dos terceirizados e de
funcionários de outros órgãos cedidos à corte, cuja publicação também é
determinada pelo Conselho. Embora nomeie os terceirizados e os cedidos, o TJ
paulista também não divulga a lista dos servidores efetivos nem dos
comissionados não concursados.
A transparência administrativa do
Judiciário é apontada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar
Mendes, que também preside o CNJ, como um dos principais legados da sua gestão,
que se encerra no dia 23, quando ele transmite o comando ao ministro Cezar
Peluso.
Aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça em 15 de
dezembro de 2009, a Resolução 102 regulamenta a divulgação na internet de
informações referentes à administração e execução orçamentária e financeira de
todos os tribunais do país. A ideia é permitir que qualquer cidadão saiba como o
Judiciário está gastando o dinheiro público com pagamento de funcionários,
gratificações, aluguel, diárias e prestação de serviços. A norma também vale
para os demais tribunais, como os regionais, federais, eleitorais e do
Trabalho.
A resolução, publicada no dia 5 de janeiro, deu 30
dias para as cortes publicarem as despesas com recursos humanos e remuneração,
como a estrutura salarial do quadro efetivo e comissionado, bem como subsídios e
diárias pagos a membros do Judiciário.
Rebuliço
A divulgação desses dados causou rebuliço no Tribunal de Justiça do Paraná,
um dos poucos a cumprirem a norma na íntegra até o momento. Em fevereiro, o TJ
divulgou a lista dos servidores e dos magistrados com as respectivas
remunerações. Cerca de 200 funcionários apareceram com salários acima do teto
constitucional, que é de R$ 24,11 mil nos tribunais estaduais.
Um
escrivão de cartório cível, por exemplo, tinha recebido R$ 100 mil em dezembro,
e um oficial de Justiça, R$ 62 mil no mesmo mês, conforme revelou o jornal
Gazeta do Povo. O presidente do tribunal convocou coletiva no dia
seguinte para dizer que as remunerações mais elevadas eram resultado de
determinações judiciais. Resultado: o TJPR decidiu, então, informar apenas de
maneira genérica os vencimentos de seus integrantes.
Invasão de privacidade
“Tem uma questão de
segurança e de privacidade aí. Podem até querer assaltar uma pessoa”, disse
ontem (7) o diretor financeiro do TJ do Maranhão, Luiz Carlos Calvet de
Aquino. A divulgação do nome dos servidores enfrenta resistência nos tribunais
de Justiça, que ainda demonstram dúvida em relação às determinações do CNJ.
Apesar de manter desde 2006 um link com informações sobre os
gastos do tribunal, o TJMA não publicava a relação dos servidores não
concursados que ocupam cargos de confiança nem mesmo dos efetivos. “No nosso
entendimento, isso não é exigido pelo CNJ. Mas, se for, colocaremos no ar, não
tem problema”, afirma Aquino. O artigo 3º do capítulo II da norma é claro ao
determinar a divulgação da “relação completa de membros da magistratura e demais
agentes públicos, efetivos ou não”. O que a resolução não determina é a
divulgação dos nomes e os respectivos vencimentos, como fez inicialmente o
TJPR.
Aquino procurou o Congresso em Foco ao final desta
manhã para avisar que o TJMA havia decidido publicar a relação dos servidores,
fazendo a distinção entre concursados e não efetivos. “Botamos
no ar a relação de todo mundo, com matrícula e cargo, efetivos e comissionados”,
informou.
Desde o último dia 31, os tribunais estão obrigados
a informar na internet os demonstrativos orçamentários referentes aos anos de
2007, 2008 e 2009. A partir deste mês, as cortes terão de atualizar, até o 20º
dia, em seus sites as informações referentes aos gastos efetuados no mês
imediatamente anterior. A pedido dos tribunais, o Conselho estendeu o prazo para
envio desses dados até a última quarta-feira.
Siafi do
Judiciário
O Congresso em Foco procurou o
CNJ para comentar a morosidade dos tribunais de Justiça no cumprimento da
resolução da transparência. A assessoria de imprensa informou que o Conselho
ainda não avaliou os dados enviados pelas cortes nem as informações publicadas
na internet nos últimos dois meses.
“Este é um modelo complexo e
vamos depender das informações que serão passadas pelo Judiciário de cada
estado, mas isto envolve uma nova atitude”, afirmou Gilmar Mendes em outubro do
ano passado, ao anunciar o “Siafi do Judiciário”, em alusão ao sistema que
permite o acompanhamento dos gastos do governo e dos tribunais federais e
superiores. Segundo o ministro, a necessidade de dar maior transparência
administrativa ao Judiciário ganhou corpo após o CNJ constatar a má gestão de
recursos públicos em diversos tribunais, como a concentração de investimentos e
servidores em algumas cortes.
Em breve, no
ar
Único a não ter publicado nenhuma das informações
exigidas pela resolução, o Tribunal de Justiça do Piauí disse que está
trabalhando para publicar “em breve” dados sobre sua gestão orçamentária e seu
quadro de pessoal. “A gente está passando por uma transição, com mudança de
presidente. Estamos em transição também no setor de telecomunicações”,
justificou a assessoria, sem precisar uma data em que as informações estarão no
ar.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, outro que
não criou o link “Transparência na página inicial do site, divulga ao menos um
relatório de gestão orçamentária. Mas não publica o quadro de pessoal nem a
íntegra da resolução, tampouco os comparativos dos últimos três anos, conforme
exige o CNJ.
Outro tribunal que pediu mais tempo para se
adequar à resolução é o do Espírito Santo. Até ontem à noite, o TJ informava
apenas os repasses do Tesouro Nacional ou Estadual à corte para pagamento de
despesas. Por meio de sua assessoria, o TJES disse que até a próxima semana deve
concluir a publicação dos demais dados.
“O atraso na conclusão da
compilação dos dados é que o Judiciário Estadual possui dois setores de Recursos
Humanos, um do Tribunal de Justiça e outro da Corregedoria Geral. Também por
determinação do CNJ, o Tribunal agora trabalha para unificar os dois RH’s e essa
extração dos dados de ambos RH’s é que vem atrasando a finalização das
informações para o link”, justificou a assessoria.
Os tribunais de
Justiça de São Paulo e do Rio de Janeiro não retornaram o contato feito pela
reportagem até o fechamento da edição.
* O texto foi
atualizado com a decisão do TJMA de divulgar a relação dos servidores ao final
desta manhã, em virtude da publicação desta reportagem.
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