Agassiz Almeida*
Ao assistir incrédulo e, ao mesmo tempo, indignado aos acontecimentos que irromperam nas altas esferas do Poder Judiciário, fatos me chegam à mente e despertam para a elaboração desta mensagem dirigida a Vossa Excelência, ministro Cezar Peluso.
Remonto aos trabalhos na Assembléia Nacional Constituinte (1986-1988), dos quais participei na condição de membro da Comissão de Organização dos Poderes, através da qual pude alcançar o acendrado corporativismo das instituições judiciárias do país.
Àquela época, a proposta da criação de um conselho de justiça foi derrotada. Décadas se passaram; e hoje, no descortinar de 2012, não podemos compreender as reações desenfreadas de um grupo de associações judicantes em contestar o trabalho, altamente dignificante, da corregedora do Conselho Nacional de Justiça, Eliana Calmon.
A este respeito, salta à minha memória o livro A rebelião das elites, de Christopher Lasch, no qual o autor analisa como certas elites corporativistas reagem quando ameaçadas nos seus privilégios.
Até poucos anos atrás, mergulhadas numa redoma sob couraça de barreiras intransponíveis, as instituições judiciárias inadmitiam qualquer controle externo. Atualmente, em face do processo de democratização e fiscalização de suas ações, através dos seus dirigentes classistas, rebelam-se quando alguns dos seus integrantes são chamados à responsabilidade funcional, como agentes do Estado.
Sob uma visão histórica da nossa formação, desde o império, fomos encontrar as raízes desta desencontrada rebelião das associações judicantes.
O que testemunhamos? Poucos anos atrás, uma cortina ameaçadora e silenciosa encobria qualquer procedimento investigatório acerca dos agentes judicantes. Hoje, dirigentes de associações classistas procuram inverter o pólo das acusações apontando a ministra corregedora como passível de ação administrativa e até penal.
Desloca-se o foco acusatório. Neste cenário, os indigitados poderão receber o passaporte da impunidade.
Neste momento, a consciência da nação procura encontrar a razão pela qual as entidades associativas do Judiciário tentam revestir certos agentes indigitados na prática de ilícitos sob a aura da intocabilidade, vedando uma análise investigativa.
Tudo parece imergir para decisões comprometedoras. Pressente-se algo incompatível com as aspirações do país. Forças encasteladas nos altos poderes ameaçam enfraquecer as funções do Conselho Nacional de Justiça.
O corporativismo no Brasil sempre se colocou bem diante das mais diversas conjunturas e delas soube extrair imediatas vantagens.
Por lei, todo agente do Estado, como parlamentar, magistrado, promotor de Justiça etc., deve entregar cópia da sua declaração de Imposto de Renda aos órgãos onde exercem as suas funções.
Há algo maior por trás deste joguetear.
Qual o escopo principal de tudo isso? Golpear os poderes do Conselho Nacional de Justiça, já tão limitados.
Cria-se o clima do sobressalto. Bradam: “Quebraram sigilos fiscais e bancários”. Mera encenação. E quem violentou os princípios da moralidade e se apropriou dos recursos públicos, o que deve responder?
Sr. ministro, a Nação assiste impactada à rebelião dos intocáveis.
Reduzir o Conselho Nacional de Justiça a um mero órgão recursal é fazê-lo caricato.
*Agassiz Almeida, escritor, promotor de Justiça aposentado, ex-deputado constituinte de 1988. Membro da Comissão da Organização dos Poderes na Assembléia Nacional Constituinte. Autor dos livros A República das elites e A Ditadura dos generais. Participou de congressos internacionais em defesa dos direitos humanos.
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