Depois de quase três anos de trabalho, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o texto do projeto de reforma do Código de Processo Civil, que é um dos projetos mais importantes das últimas décadas apreciado pelo Parlamento brasileiro.
Para o encerramento completo do trabalho da Câmara, resta apenas a deliberação de alguns poucos destaques sobre pontos específicos do projeto.
Isso significa que já estão garantidas as seguintes novidades:
– efetiva constitucionalização do sistema processual, assegurando um processo cooperativo (comparticipativo) e a interpretação das técnicas processuais em consonância com suas normas fundamentais, o que permitirá melhor participação dos cidadãos durante o processo;
– criação de mecanismos para efetiva resolução dos conflitos, com o auxílio, inclusive, de conciliadores e mediadores profissionalizados, criando um sistema processual multiportas;
– introdução de regras que estabelecem a ordem cronológica do julgamento dos processos pelos juízes e efetivação das decisões judiciais pelos servidores da Justiça;
– previsão de utilização de tecnologia para simplificar e dar agilidade aos processos;
Publicidade– detalhamento do dever de fundamentação das decisões judiciais, de modo a mostrar maior clareza das razões utilizadas pelos magistrados ao julgar e impedir decisões de surpresa;
– introdução de mecanismo para enfrentar a crescente multiplicação de processos iguais: o incidente de resolução de demandas repetitivas. Nele, se admitirá a fixação de tese a ser aplicada a processos que tratem da mesma questão jurídica, por exemplo, que envolvam tributos, FGTS, planos econômicos;
– Aprimoramento da garantia de isonomia aos jurisdicionados. O projeto estrutura o uso dos precedentes, assegurando respostas judiciárias estáveis para casos idênticos independentemente de quem pede e contra quem se pede; da sorte ou azar na distribuição do feito;
– proibição da aplicação de empecilhos formais ao julgamento do mérito das causas e recursos;
– agilização da tramitação dos processos pelo conjunto de alterações do projeto, dentre elas, a redução de recursos.
Especificamente em relação à execução, o texto aprovado contempla novidades que ampliam a efetividade para prestigiar o interesse do credor. Exemplo disso é:
– a possibilidade de protesto da sentença, como meio de coerção para que o devedor cumpra a sua obrigação, depois de decorrido o prazo para pagamento voluntário (art. 531);
– a previsão para que a determinação de bloqueio de ativos financeiros seja realizada após o decurso do prazo para pagamento (3 dias; art. 845 ou 15 dias; art. 537), mas sem prévia ciência do devedor, para reduzir a chance de saque ou transferência do dinheiro que frustre o ato (art. 870, caput);
O projeto, de outro lado, assegura o respeito ao devido processo legal para impedir que o devedor sofra agressões indevidas ao seu patrimônio, tanto mantendo conquistas históricas, quanto introduzindo novas proteções. São exemplos disso:
– a proteção do salário, como verba absolutamente impenhorável (art. 849, IV);
– a proteção do saldo de poupança, até o limite de 40 salários mínimos (art. 849, X);
– a criação de incidente simplificado para a alegação de impenhorabilidade do dinheiro pelo devedor bloqueado, com a previsão do prazo de 24 horas para o desbloqueio quando isso for determinado pelo Juiz (art. 870, §3º);
– a fixação do prazo de 24 horas para que o juiz determine o cancelamento de bloqueios múltiplos, limitando a indisponibilidade, de forma rápida, ao valor suficiente para futuro pagamento da dívida, sendo que o descumprimento deste prazo poderá resultar em consequências administrativas, sem prejuízo de responder, em ação regressiva, pelos danos causados ao devedor (art. 870, §1º e art. 143, II);
– a fixação do prazo de 24 horas para que a instituição financeira cumpra a determinação judicial de cancelar os bloqueios múltiplos. Os bancos que descumprirem tal prazo responderão pelos danos causados ao devedor (art. 870, §§4º e 6º);
– a positivação de que a penhora de percentual de faturamento de empresa somente poderá ocorrer se não existirem outros bens ou se, tendo-os, estes forem de difícil alienação ou insuficientes para saldar o crédito (art. 882);
– a criação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, de modo a impedir que os sócios sejam atingidos pela penhora antes de reconhecido, pelo Juiz, após contraditório prévio, os requisitos legais para o redirecionamento da execução (art. 133);
– a vedação para que juízes de plantão determinem o levantamento de dinheiro (art. 921, parágrafo único);
– no cumprimento provisório de sentença, a vedação para que a penhora em dinheiro seja realizada antes da confirmação da condenação em 2º grau (art. 870, §9º);
A despeito de tudo isso, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou, por 279 votos a 102 e três abstenções, destaque ao texto do projeto de novo Código de Processo para vedar, aos juízes, o bloqueio de dinheiro em duas hipóteses: em tutela antecipada quando existir risco de dilapidação, pelo devedor, de seu patrimônio; no cumprimento provisório de decisão que deferir tutela antecipada (art. 279, parágrafo único).
Esse destaque contempla exagerada proteção ao devedor e, por isso, lutarei para que seja excluído do projeto pelo Senado Federal, na próxima etapa do processo legislativo, ou, se isso não for possível, que seja excluído do texto, por meio de veto da Presidência da República.
Contudo, este específico revés – que poderá ser corrigido – não desnatura a grandiosidade do restante do projeto, tampouco apaga todos os avanços que ele irá implementar na prestação jurisdicional brasileira.
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