Eduardo Militão
Cassação apertada, ou absolvição por estreita margem de votos. Eis os dois cenários mais prováveis para esta quarta-feira (12), que marcará o futuro do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), acusado de quebrar o decoro parlamentar. Cientistas políticos ouvidos pelo Congresso em Foco consideram praticamente nulas as chances de o presidente do Senado sair ileso do atual processo, com uma ampla margem favorável de votos na sessão secreta que começa às 11h.
O professor da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Kramer acredita que o tempo corre contra o senador. Segundo ele, há dez dias, Renan tinha uma margem folgada de votos. De lá pra cá, observa, a pressão da opinião pública e da imprensa mudou a opinião dos senadores que decidirão o destino do presidente da Casa. “Acho que ele será absolvido, mas já foi mais fácil isso”, avalia Kramer.
Murillo de Aragão, da consultoria Arko Advice, não arrisca um palpite. “O cenário é absolutamente instável, diferentemente do Luiz Estevão [senador pelo PMDB-DF cassado em 2000]”, avalia ele, que também acredita que Renan perdeu força ao longo do processo, iniciado em maio com uma reportagem da revista Veja.
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Para o cientista político, a atuação da imprensa foi crucial no caso tanto para mantê-lo em evidência quanto para investigar fatos novos sobre as relações político-empresariais do presidente da Casa.
Fantasma
Aragão entende que, em caso de absolvição apertada, Renan terá dificuldade para reconstruir seu espaço político, fragilizado desde o início do escândalo. Facilidade para se reerguer, segundo o cientista político, Renan teria apenas no cenário mais improvável: o da absolvição com ampla vantagem.
Essa perspectiva se tornou mais remota ontem, com a decisão das bancadas do DEM, do PSDB e do PSB de fecharem questão a favor da cassação. O PMDB, partido de Renan, e o PT, do presidente Lula, decidiram liberar seus senadores para votar “de acordo com a consciência”. A perda do mandato, no entanto, só será confirmada se tiver o apoio de 41 dos 81 senadores.
Para Paulo Kramer, caso seja inocentado, o presidente do Senado irá “perambular como um fantasma” no Congresso, sem força para tomar grandes iniciativas políticas tanto a favor do governo como contra ele.
Ainda que se salve hoje da cassação, o presidente do Senado corre perigo, na opinião de Kramer. Com o prestígio em declínio, avalia o professor, há uma “possibilidade factível” de não haver votos suficientes para livrá-lo nos outros dois processos no Conselho de Ética – que tratam de suas relações com a cervejaria Schinchariol e com rádios em Alagoas. “Com o passar do tempo, isso só se agrava”, assevera o cientista político.
Erros
Murillo de Aragão considera que Renan está pagando por erros que cometeu durante todo o processo. Entre eles, o cientista político cita, por exemplo, a demora na votação do parecer do senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA), que pedia o arquivamento do caso. A análise do parecer acabou adiada em meio a manobras da tropa de choque de Renan. Isso permitiu, destaca o cientista político, que uma reportagem da TV Globo desmascarasse documentos do senador para comprovar seus rendimentos agropecuários. Papéis que, segundo o peemedebista, comprovariam que ele tinha dinheiro suficiente para bancar o pagamento de uma pensão à jornalista Mônica Veloso, com quem tem uma filha.
Na avaliação dele, todos os senadores já têm um juízo formado sobre o caso em si, mas cerca de dez deles ainda não decidiram qual a melhor atitude a tomar hoje. “Uma parte grande do Senado acredita que ele cometeu um delito fiscal, foi vítima de uma chantagem e que, se a mídia não tivesse trazido tantas informações, tudo estaria resolvido”, afirma Aragão.
O cientista avalia que a posição do Palácio do Planalto não pode ser considerada de abandono total de Renan, mas apenas a de quem não quer se contaminar com a crise. E cita como exemplo a declaração feita esta semana pelo presidente Lula, na Finlândia, de que o Parlamento finlandês deveria procurar o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT), como representante do Congresso brasileiro. Por lei, essa prerrogativa cabe a Renan, que é o presidente do Senado.
Kramer acredita que as crises no Legislativo são boas para o Executivo. “Isso consegue a façanha de mostrar que existem pessoas mais sujas que as do Executivo”, dispara.
Círio de Nazaré
O painel do Senado marcava 14h46 ontem quando exatos 41 parlamentares haviam registrado presença numa homenagem aos 246 anos do Círio de Nazaré. Com aquela quantidade de senadores, exatamente a mesma necessária para absolver ou cassar Renan, e com uma imagem da Virgem de Nazaré à mesa, o presidente do Senado deixou a presidência.
Ele entregou a tarefa de continuar a condução dos trabalhos ao senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA). Cumprimentou alguns colegas e seguiu para a presidência. Aos repórteres, falou de sua expectativa para hoje: “Cada um votará de acordo com sua consciência”. Um jornalista queria saber se a votação da CPMF estaria comprometida. “CPMF, só em novembro”, disse Renan ao entrar na presidência.
Ao deixar o plenário e entregar a presidência da sessão a Flexa Ribeiro, Renan pode ter tomado seu último ato à frente da Mesa do Senado. Hoje, quem vai dirigir a sessão secreta é o vice-presidente, Tião Viana (PT). Ontem, poucos senadores asseguravam qual lado venceria a votação.
Um deles era Almeida Lima (PMDB-AL), fiel escudeiro de Renan. “A justiça vai prevalecer. Espero que os ânimos não estejam tão exaltados”, afirmou ele, que crê em até espantosos 60 votos pró-absolvição. Já um dos relatores do caso, Renato Casagrande (PSB-ES), nota um movimento crescente em favor da cassação do presidente do Senado.
Viabilidade
A eventual saída de Renan motivará uma disputa pela presidência. Governistas desejam José Sarney (PMDB-AP), ex-presidente da República e da Casa. Mas os tucanos rechaçam o nome do ex-presidente e defendem Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE). Arthur Virgílio (PSDB-AM), defensor da candidatura de Jarbas, diz que o nome do ex-governador pernambucano seria viável com uma composição entre tucanos, DEM, Psol e parte do PDT e dos peemedebistas.
Mas o virtual candidato foge de qualquer especulação. Ao Congresso em Foco, ele disse que sequer pensa nessa possibilidade. Pelo menos até o desfecho da votação de hoje. “Discutir isso agora é atropelo”, desconversou Jarbas.
Para Paulo Kramer, qualquer nome para uma eventual sucessão de Renan vai nascer de consenso entre os principais líderes partidários. “Pode ser José Agripino [DEM-RN], Sarney, Virgílio. Jarbas é um grande nome também, mas talvez seja atrapalhado por ter um perfil extremamente oposicionista”, comenta.
Ontem, a bancada do PT reafirmou seu desejo de liberar os parlamentares para votarem como queiram, assim como os tucanos mantiveram a posição de condenar Renan. Entretanto, Murillo de Aragão alerta que, como a votação é secreta, orientar os senadores tem pouco efeito prático. Para ele, o PSDB, por exemplo, está em busca de uma bandeira. “A bandeira era a CPI do Apagão no Senado. O Renan teve que virar um escândalo para o PSDB se posicionar”, observa.
Cenários
Cassação. Possível. Renan perde os direitos políticos e não poderá se candidatar até 2018. Tião Viana (PT-AC) assume interinamente o comando da Casa, que melhora sua imagem perante a opinião pública. Um processo de sucessão começa, já com os nomes de José Sarney (PMDB-AP), Gerson Camata (PMDB-ES) e Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) na disputa.
Absolvição apertada. Igualmente possível. Renan escapa, mas continua fragilizado, tentando se reerguer politicamente, assim como o próprio Senado. O processo deve ser lento. Renan ainda tem pela frente duas representações no Conselho de Ética. A renúncia do peemedebista à presidência da Casa, que resistiu a deixar a cadeira durante todo o caso, é considerada improvável.
Absolvição folgada. Hipótese menos provável. Renan escapa, continua frágil, devido aos outros dois processos que responde no Conselho de Ética, mas tem mais força para reconstruir sua influência política. Cogita-se que as duas representações no Conselho também percam força e beneficiem o presidente caso a margem de votos seja folgada.
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