*Osiris Lopes Filho
O presidente Lula, o ministro Guido Mantega e seus auxiliares têm dito que a PEC 233/08, que trata da reforma constitucional tributária, é simplificadora e moderna. Em verdade, essa proposta de reforma representa a consagração do atraso.
Constitui notável afirmação da involução do nosso universo tributário, tentativa de consolidação do imperialismo financeiro da União no plano interno do país. Esmaga a autonomia financeira dos estados e do Distrito Federal e possibilitará brutal elevação da carga tributária que vitima as classes menos favorecidas de nossa sociedade.
O fato é deplorável. Governo popular, eleito majoritariamente pelos setores mais pobres do país, apresenta reforma caracterizada pela enganação e espoliação. Leão com pele de cordeiro.
A proposta prevê a criação, em favor da União, de imposto incidente “sobre operações com bens e prestação de serviços”.
Trata-se da mais ampla base para incidência de imposto sobre a produção e consumo de bens que se pode prever para a atribuição de competência e definição da sua área de abrangência.
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Essa materialidade tributária abrangerá as mercadorias e os serviços de transporte e comunicações, objeto da incidência do ICMS, dos estados e do Distrito Federal, e dos serviços de qualquer natureza, submetidos à imposição dos Municípios e do Distrito Federal. Tremenda carga tributária sobreposta, a exaurir os contribuintes desses impostos. A um só tempo, vai induzir o setor empresarial a evadir e sonegar tais tributos, tal o peso da carga tributária e vai extorquir o infeliz consumidor brasileiro, pois o peso desses tributos comporá o preço dos bens, mercadorias e serviços, adquiridos no mercado, pelos consumidores, eis que são incorporados como custo à sua composição, sendo absorvidos pelo comprador final.
Estima-se que, após a implantação dessa reforma, mais de 80% da arrecadação tributária do país serão compostos por impostos e contribuições indiretos. Embora pagos inicialmente pelo setor empresarial, estarão incluídos nos preços finais das mercadorias e serviços, transferido o seu ônus efetivo, para o povo consumidor. É a predominância da tributação indireta, que apena o consumidor mediante a absorção da carga tributária, que termina sendo-lhe transmitida. Quando se deveria atenuar a regressividade dessa tributação indireta que pune os de menor renda disponível mais intensamente, ao passo que é leve para os de maior renda, agrava-a.
Estão evidentes a deslealdade e o primarismo da concepção desse tributo. É que se coloca na Constituição, como se fosse matéria adequada a essa qualificação, técnica de cálculo de imposto, enganadora do povo, eis que o montante do tributo é calculado “por dentro”. Está, entre as suas regras específicas, que “o imposto integrará a sua própria base de cálculo”. Trata-se de artifício que esconde o valor do tributo e exponencia a sua incidência, de tal forma que uma alíquota nominal de 25%, em realidade corresponde à de 33%.
Esconde-se a alíquota efetiva do tributo, que seria evidente se estabelecida “por fora”. A regra proposta é enganadora e desleal. Visa a iludir o consumidor, escondendo o valor do tributo e, pior, a sua intensidade. Atenta-se contra a transparência tributária. Logra o povo, padecente tributário, artifício de governo espoliador.
Artigo publicado em 26/05/2008. Última atualização em 12/08/2008.
*Osiris de Azevedo Lopes Filho, advogado e professor de Direito na Universidade de Brasília (UnB), foi secretário da Receita Federal.
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