Por maior esforço que o governo faça para combater o crack, não colheremos bons resultados sem a participação da sociedade. O flagelo que interrompe o sonho de milhares de jovens e adoece famílias em 98% dos municípios brasileiros é um agudo problema de saúde e de segurança pública e deve ser encarado como um desafio social.
O crack é uma droga poderosa, com potencial para viciar o usuário em segundos. Causa lesões irreversíveis no cérebro dos dependentes, e a facilidade com que é produzido e distribuído pelos traficantes torna o produto barato, massificando o consumo e ampliando a tragédia, exposta nos dramáticos cenários das “cracolândias”.
Estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostra que o crack leva um terço de seus usuários à morte, ocasionada, em 85% dos casos, não pelo seu uso, mas por situações violentas associadas ao consumo. Além de gerar violência, a promiscuidade de usuários gera gravidez indesejada. Futuras mães, em grande parte adolescentes, sem condições mínimas para a maternidade e com risco de diversos problemas à saúde do recém nascido.
O anúncio do programa “Crack, é possível vencer”, lançado pelo governo federal no início de dezembro, é um passo importante no enfrentamento desse problema. A promessa é de investimentos de R$ 4 bilhões. Espero que não se repita o que aconteceu em 2010, quando o plano nacional de enfrentamento à droga previa R$ 400 milhões, mas somente R$ 90 milhões foram empenhados, e apenas R$ 5 milhões, efetivamente pagos.
Um dos anúncios refere-se à criação de 3.508 leitos em enfermarias especializadas no atendimento de dependentes químicos. A medida é importante e deveria integrar nessa ou nas próximas etapas as iniciativas municipais e estaduais que já deram bons resultados, especialmente no que se refere às instituições que cuidam da reintegração social.
Estimular as comunidades terapêuticas que realizam um trabalho qualificado a aumentarem o número de vagas para o atendimento é bom caminho, além de garantir internamento hospitalar pelo SUS em unidades públicas, privadas e comunitárias que dispõem de condições para esse acolhimento. Ou ainda fazer com que o SUS pague a internação e o tratamento para inclusão social em unidades particulares.
Cerca de 80% dos dependentes são assistidos por comunidades terapêuticas, cujo trabalho é essencial para evitar o retorno às drogas, especialmente de pessoas que se submeteram a internações apenas para desintoxicação.
PublicidadeO Brasil, infelizmente, acordou tarde para este problema. As estimativas apontam para mais de dois milhões de usuários de crack no País, ou seja, mais de 1% da população. Número alarmante que preocupa a sociedade, cada vez mais consciente da importância de ações imediatas na prevenção, tratamento e ressocialização, conforme demonstraram recomendações de especialistas ouvidos durante os trabalhos da Subcomissão Temporária de Políticas Sociais sobre Dependentes Químicos de Álcool, Crack e Outras Drogas (Casdep), da qual fui vice-presidente e relatora.
Pesquisa feita pelo Instituto Datafolha revelou que 90% dos brasileiros são favoráveis a que os adultos dependentes da droga sejam internados mesmo que não queiram. O tema é tratado no projeto de lei (PLS 111/2010) de autoria do senador Demóstenes Torres (Dem-GO). A iniciativa permite que juízes autorizem a internação obrigatória de viciados em drogas caso especialistas julguem necessário o tratamento devido ao estágio avançado do vício.
Como relatora da matéria, defendo a internação compulsória. O crack tira do dependente a sua condição de decidir. Faz com que ele perca a sua própria vontade e fique refém da droga. Torna-se risco para a sua própria integridade física e para as pessoas de seu convívio. É uma maneira de avançar nessa guerra e reduzir um mal que já pode ser considerado epidemia.
O crack é um problema gravíssimo. Não há solução sem o envolvimento de todos. Tanto dos entes públicos como da sociedade. A juventude precisa estar ocupada, preencher o seu tempo com esporte, cultura e lazer, evitando enveredar pelo caminho do falso prazer provocado pelo consumo da droga. São necessárias mais escolas de tempo integral. O diálogo com a família e as instituições de ensino, com a ênfase de valores éticos dentro de casa e em sociedade, é fundamental nesse processo.
Neste ano, uma das prioridades no começo das atividades no Congresso Nacional é a instalação de uma Comissão Parlamentar Mista para dar sequência ao debate, selecionar as melhores propostas e dar agilidade à sua tramitação. Será um ano decisivo para cobrarmos a efetiva liberação dos recursos prometidos pelo governo federal, definir ações preventivas e permanentes. É hora de começarmos a virar esse jogo. Políticos, gestores e toda a sociedade. Afinal, o enfrentamento ao crack é de todos.
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