Carlos Frederico Nalepinski Widholzer *
Falar dos mensaleiros ou da corrupção, de uma forma geral, tornou-se algo como uma guerra entre militantes de partidos, onde uns justificam os erros dos seus com os erros dos outros. De outra parte, parece que a corrupção é ou deveria ser algo intrínseco nas nossas vidas, algo absolutamente natural e banal; e, de certa forma, o é. A corrupção no Brasil tornou-se algo visceral, como um câncer em fase metastásica que vai se infiltrando em todos os setores de nossas vidas.
Há poucos dias, fiquei estarrecido com a afirmação de pessoas de meu convívio de que se pudessem fariam exatamente tudo aquilo que condenam no comportamento dos outros, especialmente dos políticos. Restou-me uma sensação de que somos uma geração absolutamente perdida, materialista, descrente e desprovida de valores. Mas será que é isso que queremos para os nossos filhos e netos?
Neste particular, me parece absolutamente oportuno falar a respeito da fuga do Sr. Henrique Pizzolatto, ex-diretor do Banco do Brasil, para a Itália. Além de, na minha humilde opinião, uma clara confissão de culpa, fez escarnecer do Supremo Tribunal Federal, da Polícia Federal, de todas as instituições republicanas e, escancaradamente, do povo brasileiro, incluindo sua família aqui. Não faltou, no entanto, um ministro do mesmo Supremo Tribunal que justificasse a sua atitude como a de um cidadão qualquer que tivesse na iminência de ser preso.
Mas, felizmente, o Brasil, hoje, é vitrine e enganam-se aqueles que pensam que a Interpol e tantas outras instituições estrangeiras não estão atentas ao que aqui acontece.
Quis o destino que este senhor, cidadão italiano, fosse preso naquele país por utilizar o passaporte de seu irmão falecido há 35 anos. Ora, como cidadão italiano, não bastaria um BO e a solicitação de um novo passaporte caso se tratasse mesmo de “um assalto”?
Por que alguém de boa-fé fugiria do Brasil levando o passaporte do irmão falecido caso não premeditasse ocultar sua real identidade. Não é demais lembrar que há denúncias de que o falecido teria comparecido às urnas anos após sua morte, evidenciando, aí, crimes anteriores. Parece-me que aí há indícios claros de que a sua fuga foi algo urdido por uma organização criminosa que planejou criteriosamente sua fuga. Pessoas que não gostariam que toda a verdade viesse à tona. Tudo isso sugere que este senhor sabe muito mais do que foi relatado ao judiciário. Se a mentira tem pernas curtas, no caso de Pizzolatto, não passam de cotocos.
PublicidadeAo contrário do que aconteceu no caso Cacciola, as autoridades italianas estão dispostas a colaborar com a Justiça brasileira compartilhando as informações colhidas durante a prisão de Pizzolatto, quem sabe até extraditando-o. Mas, para isso, é necessário que haja vontade política do governo brasileiro, ou para que ele seja extraditado ou para que ele cumpra suas penas naquele país (custo para eles). Entretanto, o que se vê são personalidades importantes da base governistas (suspeitos de corrupção!) promoverem e participarem de “vaquinhas” (ações entre amigos, quiçá cúmplices!) para pagar multas instituídas pelo Supremo Tribunal Federal, retirando-lhe a competência de punir os criminosos ou a atitude pedagógica de fazê-lo (senão for dinheiro público distribuído por laranjas!), mensaleiros cumprindo suas penas em prisão domiciliar, enquanto milhares de cidadãos brasileiros, justa ou injustamente, verdadeiramente apodrecem em penitenciárias sem assistência médica, judiciária ou simplesmente água mineral; a ação de mercenários cibernéticos que tentam impedir a livre manifestação da população em redes sociais, e por aí vai.
O povo brasileiro precisa de justiça real. Não precisamos sediar Copas ou Jogos Olímpicos; pelos maus exemplos, já somos vitrine. Não queremos mais portos no exterior, mas eficiência dos portos nacionais e menos impostos; tampouco precisamos de bolsas disso ou daquilo, mas salários dignos e uma política real de distribuição de renda. Não queremos “democracia” na educação, mas simplesmente uma educação pública de qualidade e valorização dos educadores. Não necessitamos de cotas, mas de igualdade real. Não queremos “mais médicos”, mas uma real atenção à saúde da população. Não queremos reparação de erros do passado, mas o fim da escravidão real em pleno século XXI (os médicos cubanos ou, pior, as crianças brasileiras que trabalham em carvoarias entre tantos outros exemplos). Queremos o fim de uma polícia truculenta a serviço do estado, mas sim uma polícia desmilitarizada e cidadã, a serviço do povo.
Por fim, precisamos, sim, que a justiça seja feita sem regalias, que as leis sejam cumpridas, que esse senhor Pizzolato, não o morto, mas o vivo, seja repatriado e, finalmente, conte tudo o que sabe à Justiça, afinal seu destino parece mesmo ficar preso. Se não for por nós, por uma geração que já naturalizou a corrupção, a falta de ética, de caráter que seja por nossos filhos e netos para que um dia orgulhem-se de ser brasileiros.
* Carlos Frederico Nalepinski Widholzer é doutor em Ciências e professor da Universidade Federal de Pelotas (RS). E-mail: carlosfredericowidholzer@yahoo.com.br
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