Lúcio Lambranho
Apenas cinco dos nove acusados de terem comandado a chacina de Unaí (MG) estão presos aguardando julgamento da Justiça, passados cinco anos do assassinato dos auditores fiscais do Trabalho Eratóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e do motorista Ailton Pereira de Oliveira.
Os quatro servidores foram mortos numa emboscada quando realizavam, no dia 28 de janeiro de 2004, uma fiscalização rural de rotina no município de Unaí, localizado na região Noroeste de Minas e a 168 quilômetros de Brasília.
Nesta quarta-feira (28), dia em que o caso completa cinco anos de impunidade, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e a Associação dos Auditores Fiscais do Trabalho de Minas Gerais (AAFIT/MG) promovem um protesto e um culto ecumênico, a partir das 10 horas, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF). Outro ato lembrará o caso, no mesmo dia, em Belém, a partir das 16h30, na Capela Universitária da Universidade do Pará, dentro da programação do Fórum Social Mundial (FSM).
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“Cinco anos é tempo demais para as famílias, para os colegas auditores e para o Estado, que foi duramente atingido com o crime”, afirma José Augusto de Paula Freitas, presidente da Associação dos Auditores Fiscais do Trabalho de Minas Gerais. “O que os advogados dos réus tentam com essa série de recursos é fazer com que a opinião pública esqueça dessa chacina”, completa Freitas.
Acusados de executar e intermediar os quatro homicídios (leia o perfil dos nove acusados), Erinaldo de Vasconcelos Silva, Francisco Elder Pinheiro, Humberto Ribeiro dos Santos, Rogério Alan Rocha Rios e William Gomes de Miranda estão presos aguardando julgamento na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem (MG) (confira a cronologia dos fatos).
Em liberdade
Já os apontados pelo Ministério Público Federal de serem os mandantes da chacina, os irmãos Antério e Norberto Mânica, estão em liberdade, assim com os empresários Hugo Alves Pimenta e José Alberto Costa, que, segundo a denúncia, também teriam interesse na morte dos fiscais. “Curiosamente, aqueles que têm melhor situação econômica estão em liberdade, pois conseguem meios para insistir nos recursos”, ressalta o presidente da AAFIT/MG.
Antério Mânica foi reeleito prefeito de Unaí pelo PSDB em 2008 e, por isso, tem foro privilegiado. A acusação contra ele tramita no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. Os demais acusados respondem a processo pelos quatro homicídios qualificados na Justiça Federal de 1ª instância em Minas Gerais. Segundo os advogados do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, a ação contra Antério só terá seguimento depois de concluídos os processos dos demais réus. Em novembro do ano passado, Antério foi condecorado na Assembléia Legislativa de Minas com a Medalha do Mértio Legislativo.
O irmão do prefeito, Norberto Mânica está em liberdade desde 28 de novembro de 2006, graças a um habeas corpus concedido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele chegou a ser preso no dia 17 de julho de 2006, acusado de obstruir as investigações por meio da compra de testemunhas. Os irmãos Mânica são considerados os maiores produtores de feijão do Brasil e, segundo a acusação, estavam contrariados com as multas aplicadas pelos fiscais do Trabalho.
Norberto e seus irmãos Celso e Luiz Antônio foram condenados pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais a pagar R$ 300 mil por submeter trabalhadores a condições degradantes em suas fazendas em Unaí.
Segundo a denúncia, da procuradora do Trabalho Adriana Augusta de Moura Sousa, os produtores “contrataram 2 mil pessoas e as colocaram alojadas em um espaço em que só cabiam 200”.
Além disso, diz a procuradora na ação, os donos da fazenda se negavam a servir jantar aos trabalhadores após um dia cheio na colheita de feijão. “As pessoas ficavam mais de 17 horas sem comer”, diz Adriana Augusta. De acordo com o Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais, os acusados já pagaram R$ 138 mil, parte do valor da indenização exigida pela decisão da Justiça do Trabalho.
“Nenhuma prova”
Os advogados dos irmãos Mânica disseram ao site que é o Ministério Público Federal que atrasa o julgamento do caso no TRF da 1ª Região com seguidos adiamentos. Os defensores alegam que não há provas contra os seus clientes e que, por isso, os procuradores da República ainda tentam encontrar alguma vinculação com os demais acusados da chacina de Unaí.
“O Ministério Público Federal não encontrou nenhuma prova contra o atual prefeito de Unaí. Por isso, estão usando a estratégia de adiar o julgamento do meu cliente para tentar encontrar alguma coisa que possa sustentar a acusação”, disse ao Congresso em Foco o advogado de Antério Mânica, Marcelo Leonardo, que também defende o empresário Marcos Valério, acusado de ser o operador do mensalão.
Segundo o defensor do prefeito de Unaí, integrantes do MPF estão oferecendo o benefício da delegação premiada para os acusados de serem os executores do crime em troca de declarações que incriminem seu cliente.
“Já fiz nos últimos dois anos três pedidos para que o julgamento fosse feito, mas a última decisão do desembargador foi de adiamento do julgamento. O Ministério Público vende uma versão de morosidade para a imprensa, mas eles é que não deixam o julgamento acontecer”, afirma Marcelo Leonardo.
“Estranhamente, o Ministério Público tenta adiar esse julgamento por várias vezes. Não há nenhuma prova contra o meu cliente e isso ficará provado quando ele for a júri popular”, diz o advogado de Norberto, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. O defensor de Norberto é conhecido em Brasília por sua influência política e já defendeu o banqueiro Salvatore Cacciola e a ex-ministra da Fazenda Zélia Cardoso de Mello.
O advogado de José Alberto de Castro, acusado de intermediar a contratação dos matadores, também negou as acusações em entrevista ao site. Segundo o defensor do empresário, Cléber Lopes de Oliveira, seu cliente era apenas um comprador de feijão dos produtores da região e não teve nenhuma relação com os demais acusados pelo crime.
“Meu cliente não era produtor rural e não sofria com as fiscalizações. Ele era um mero atravessador e comprava feijão de produtores que tinham ou não ações dos fiscais”, diz Cléber Lopes.
Ministério Público
O Congresso em Foco tentou contato com os procuradores da República em Minas Gerais que acompanham o caso, Miriam Lima e Edmundo Antônio Dias Netto Júnior. Segundo a assessoria de comunicação do órgão, ambos estão de férias e não poderiam falar com a imprensa.
Em entrevista concedida logo após a publicação desta reportagem, o procurador Carlos Alberto Vilhena, que atua no caso junto à Procuradoria Regional da República da 1ª Região (PRR1), em Brasília, atribuiu a morosidade no julgamento dos acusados a recursos judiciais (leia mais).
Matéria publicada em 27.01.2009 e atualizada em 17.02.2009.
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