Osvaldo Martins Rizzo* |
Imobilizada pela própria burocracia e pelas rígidas restrições do ajuste fiscal, além de indispor dos ingressos do precocemente desativado programa de privatizações e concessões, a União – e alguns Estados brasileiros – começa a aplicar a recentemente promulgada Lei nº 11.079 das Parcerias Público-Privadas (PPPs) para altear a capacidade de investimento em infra-estrutura, anunciando para breve a publicação dos primeiros editais de licitação. Os defensores da novidade alegam que o modelo de privatização e concessões de serviços públicos, implantado na década passada, é incapaz de atrair os investimentos privados necessários, e como aumentar impostos diretos reduz a renda que derruba a popularidade do governo, a parceria é o indolor remédio para sanar a falta de infra-estrutura, apesar dos fracassos verificados em países europeus. Em 2004, por exemplo, o governo português foi obrigado a revisar contratos de PPPs em rodovias deficitárias que estouraram o orçamento do país. Tentando entusiasmar os potenciais parceiros privados – que desconfiam de um problemático modelo de negócios onde o governo é o regulador, o demandante e o sócio –, recorre-se a modernos e dispendiosos métodos de convencimento onde as parcerias são ofertadas como ótimas oportunidades, no bem engendrado plano de vendas dos intermediários ávidos pelo lucro sem risco das suas montagens e posteriores renegociações. O desinformado cidadão – três entre quatro brasileiros não sabe o que é imposto, segundo pesquisa da Associação Comercial de São Paulo – é vitimado pela farsa de que o setor privado, sem criar mais gastos ao contribuinte, substituirá o governo como supridor de recursos dirigidos para zerar o déficit de infra-estrutura. Deveras, a PPP é mero artifício contábil que dribla a Lei de Responsabilidade Fiscal ao disfarçar o real endividamento público escondendo a futura cobrança de imposto indireto. Malandramente, também se omite que as parcerias têm potencial para apenas suplementar os insubstituíveis investimentos públicos diretos que, aliás, deveriam estar sendo realizados com parte do dinheiro da sideral arrecadação dos impostos. É sabido que menos de 6% da malha rodoviária nacional tem condições de ser pedagiada. Nos ditames da lei em comento, a PPP não passa de outra modalidade de concessão além da prevista na Lei de Concessões e Permissões (nº 8.987) vigente há um decênio, podendo ser do tipo administrada ou patrocinada dependendo da maior ou menor contribuição do erário. O sistema permitirá conceder serviços públicos sabidamente deficitários, através da modalidade patrocinada pelo governo que se compromete a repassar à concessionária a contraprestação pecuniária para zerar o déficit criado pela insuficiente tarifa paga pelo usuário. Em outras palavras, quem usufruir diretamente do serviço público prestado bancará apenas uma parte do preço cabendo aos cofres públicos, indiretamente, subsidiar a operação patrocinando o valor faltante. Para ilustrar, se o projeto for uma rodovia, a tarifa do pedágio será paga diretamente pelo usuário e todo contribuinte – trafegue ou não pelo local – arcará indiretamente com a diferença de arrecadação (a “mesada” bancada pelos cofres públicos), além de ambos continuarem pagando os atuais tributos destinados à construção e conservação das estradas, como a Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide), cujos recursos vêm sendo desviados para a obtenção do superávit primário. Completando a adaptação do fatigado modelo importado das PPPs às condições locais de insegurança – fruto do freqüente descumprimento de compromissos pelo governo – que assusta o investidor privado, o conceito original pode vir a ser ainda mais falseado para permitir que mais dinheiro público seja consumido na composição da parceria. Se forem investidos os bilionários estoques da poupança compulsória semipública – os cobiçados saldos dos ativos financeiros dos fundos de pensão das empresas e bancos estatais, tidos como dinheiro privado apesar de, em sua maioria, ainda serem patrocinados pelo Tesouro Nacional – crescerá o risco de crédito desses fundos, pois financiarão projetos com taxa interna de retorno insuficiente para honrar os seus futuros compromissos atuariais. Para que, no futuro, os aposentados e pensionistas das estatais recebam o que lhes é devido, o contribuinte terá de cobrir a diferença através de outro subsídio do Tesouro Nacional. * Osvaldo Martins Rizzo é engenheiro e ex–conselheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Os textos para esta seção devem ser enviados, com no máximo 4.000 caracteres e a identificação do autor (profissão e formação acadêmica), para congressoemfoco@congressoemfoco.com.br |
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