A Comissão da Reforma Política do Senado encerrou recentemente seus trabalhos e, de forma célere, aprovou importantes mudanças nessa agenda. O passo seguinte será a avaliação das propostas pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e, posteriormente, pelo plenário da Casa. Foram definidos, entre outros temas, o fim da reeleição para cargos do Executivo e a ampliação do mandato para cinco anos, o financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, o fim das coligações partidárias nas eleições proporcionais e o estabelecimento de cotas para mulheres nas listas partidárias.
O sistema político-eleitoral e o modelo de financiamento das campanhas são o nó górdio da discussão. Hoje, o eleitor pode escolher entre votar nominalmente ou na legenda partidária. Essa dupla opção não se mostrou, contudo, suficiente para diminuir o fosso entre eleitor e eleito, fato a dificultar o controle social mais ativo da representação parlamentar. É fato notório que os cidadãos também não reconhecem os partidos como plataformas de caráter programático e doutrinário. Isso mina as bases da nossa democracia.
Os principais partidos defendem propostas divergentes para resolver a questão. O modelo aprovado na Comissão do Senado é o voto em lista fechada que coloca o foco na escolha do partido e não dos candidatos. Nesse sistema, os candidatos são definidos hierarquicamente em lista, e, após a apuração dos votos, cada agremiação conhece o número de vagas a que tem direito. Os eleitos saem das listas partidárias, obedecendo a uma ordem previamente estabelecida.
Para muitos, esse modelo aumenta a influência das oligarquias, mas o poder maior dos dirigentes não ajuda a fortalecer o sistema partidário. Julgam, que somente, no futuro, com o amadurecimento do processo político e da nossa democracia é que a lista fechada deve prosperar. O formato deverá ser o ápice de um processo de credibilidade contínua dos partidos junto ao eleitor, até o momento em que seja indiferente um nome ou uma sigla na decisão do voto. Fechar a lista seria na ótica de seus opositores cassar o direito da escolha.
Outros defendem o voto distrital, em que cada estado ou município é dividido em distritos. Num distrito, cada partido apresenta um candidato e é eleito apenas um representante local, tal como em eleição direta para o Executivo. Esse é o formato uninominal. Já o chamado distritão preconiza que cada estado ou município seja um único e grande distrito e, nesse caso, são eleitos os mais votados, independentemente do partido a que pertencem. Isso equivale a uma eleição majoritária para deputados e vereadores.
Julgo ser ideal a adoção do sistema distrital misto, com lista fechada para as eleições dos deputados e vereadores. Uma proporção das vagas é definida por meio de uma disputa majoritária nos distritos, imprimindo caráter de maior representação e proximidade com o eleitor. O restante das cadeiras sai dos votos nos partidos, que determinam os seus candidatos na lista fechada. O processo fortalece as siglas, na medida em que os cidadãos serão disciplinados a optar por um ideário, abandonando o personalismo, que marca nossa história republicana.
O financiamento de campanha eleitoral é outro tema espinhoso. Não acredito no financiamento público exclusivo, porque essa modalidade não é garantia de eliminação de ilegalidades, tais como o caixa dois, compra de votos ou enriquecimento ilícito dos maus políticos.
As empresas podem e devem continuar a fazer doações, mas é preciso que seja um processo totalmente transparente e democrático. Avalio até que a pessoa física poderá vir a ter peso maior no financiamento. Mas isso é algo que se dará em horizonte de tempo mais largo. O que precisamos agora é oferecer condições para que não se perpetue o atual processo eleitoral, uma competição de quem tem e quem não dispõe de fontes próprias de financiamento. Devemos ter patamar mínimo de isonomia nessa competição.
Nesse sentido, o modelo distrital misto, em relação ao atual sistema, tem a vantagem de tornar as eleições menos dispendiosas, porque os candidatos dos distritos disputam os votos em uma área geográfica mais restrita e não há campanhas individuais nas eleições proporcionais, pois o eleitor vota é no partido. Assim, estaremos dando menos peso ao poder econômico na definição das eleições.
A boa governança das sociedades depende da qualidade do sistema político e do grau de representatividade alcançado pelos partidos. Nosso sistema deu claros sinais de esgotamento. Creio que o importante é não perder a oportunidade de por na mesa todas essas questões incômodas, que carecem de solução. Nosso dever é avançar.
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