O caso Demóstenes-Cachoeira ganhou mais um capítulo nesta quinta-feira (29), agora na esfera do Supremo Tribunal Federal (STF). Atendendo a encaminhamento feito na terça-feira (27) pela Procuradoria Geral da República (PGR), o ministro Ricardo Lewandowski determinou abertura de inquérito para apurar a relação do ex-líder do DEM Demóstenes Torres (GO) com o contraventor Carlinhos Cachoeira, preso desde fevereiro pela Polícia Federal sob a acusação de chefiar um quadrilha do jogo ilegal em Goiás e periferia de Brasília. Segundo as investigações da PF, o senador teria participação nos lucros do esquema criminoso.
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Além do inquérito, o ministro Lewandowski determinou a quebra parcial de sigilo bancário do senador, “no período explicitado pela PGR”. Como a assessoria do STF explicou ao Congresso em Foco, o ministro negou “acesso automático a dados financeiros complementares junto ao Banco Central”, uma vez que, sem a restrição, o acesso violaria o caráter cautelar do sigilo. Assim, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, terá acesso às movimentações financeiras de Demóstenes no período pré-estipulado de dois anos, sem que informações possam ser requisitadas a qualquer instante. A decisão impede que o acesso ao sigilo se dê de forma generalizada, sem precisar de autorização judicial.
De acordo com o STF, o procurador-geral poderá formalizar a expedição de ofícios ao Banco Central solicitando dados sobre a movimentação financeira de Demóstenes, desde que dentro do período estipulado na representação da PGR. Lewandowski, no entanto, não informou em seu despacho as datas de início e fim da abertura de sigilo.
Em sua decisão, o magistrado também determinou encaminhamento de ofício ao Congresso para que o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), liste e envie ao Supremo as emendas apresentados por Demóstenes ao orçamento da União. Além disso, o despacho ordena à Polícia Federal a degravação de 19 escutas telefônicas envolvendo a organização criminosa chefiada por Cachoeira, bem como órgãos públicos devem esclarecer termos de contratos firmados com empresas investigadas no âmbito da Operação Monte Carlo, que levou o contraventor à prisão.
Também foi negado no despacho o pedido da PGR para que Demóstenes prestasse esclarecimentos formais – Lewandowski considerou que as investigações não avançaram suficientemente a ponto de o depoimento ser determinado. O ministro também não permitiu o acesso aos autos do processo a pessoas físicas como senadores, jornalistas e o partido de Demóstenes, o DEM.
Nesse ponto da decisão, o magistrado argumentou que, se viesse a liberar o acesso aos requerentes, violaria o segredo de Justiça expresso na Lei 9.296/96, uma vez que os autos contém escutas autorizadas que envolvem não só os investigados, mas terceiros que em tese não cometeram crime. Já a defesa de Demóstenes teve acesso às informações garantido por Lewandowski.
Complicações a conta-gota
Demóstenes já tem um processo por quebra de decoro parlamentar solicitado ao Conselho de Ética do Senado. Ontem (quarta, 28), quando o requerimento foi protocolado, a TV Globo divulgou trechos de relatório da PF mostrando diálogos entre Cachoeira e dois de seus sócios no esquema clandestino. Neles, o nome do senador aparece seis vezes em cinco minutos, e em discussão sobre a partilha de um montante de R$ 5 milhões oriundos do jogo ilegal.
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Hoje (quinta, 29) foi a vez de a TV Bandeirantes exibir, no Jornal da Band, o primeiro diálogo entre Demóstenes e Cachoeira em que a voz de ambos é ouvida na televisão. Na ligação telefônica, Demóstenes adverte Cachoeira sobre matéria legislativa referente à atividade operada criminosamente pelo amigo – grau de relação que o próprio senador admitiu em na tribuna do Plenário do Senado, no único discurso de defesa por ele feito até agora. O bicheiro pede então que o senador “vote isso aí”, em sinal de preocupação com o que viria pela frente em termos de eventual investigação.
Diante da situação considerada irreversível pelos colegas de Senado, o DEM vai decidir na próxima terça-feira (3) o destino de seu ex-líder e então potencial candidato ao governo de Goiás, nas eleições de outubro. O presidente nacional do partido, José Agripino (RN), que voltou ao posto de líder no Senado, admite o incômodo da situação, e não descarta a expulsão. A pessoas próximas, segundo reportagem veiculada hoje pelo jornal Folha de S.Paulo, Demóstenes tem admitido que está “acabado” politicamente. Nos bastidores, comenta-se que o senador, promotor público em Goiás, deve renunciar ao mandato.